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Responsabilidade internacional dos Estados por dano ambiental:

o Brasil e a devastação amazônica

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16/09/2006 às 00:00
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O artigo investiga a possibilidade de responsabilização do Estado brasileiro por danos ambientais sobre a Amazônia, quanto a três aspectos: diversidade biológica, mudança de clima e recursos hídricos.

SUMÁRIO: 1. Introdução - 2. Direito Ambiental Internacional: 2.1. Princípios do Direito Ambiental Internacional; 2.2. Fontes do Direito Internacional: 2.2.1. Tratados; 2.2.2. Costume internacional; 2.2.3. Princípios gerais do Direito das nações civilizadas; 2.2.4. Decisões judiciais; 2.2.5. Ensinamentos dos mais altamente qualificados publicistas; 2.2.6. Resoluções da ONU; 2.2.7. Soft-laws. 2.3 Solução pacífica de conflitos no âmbito internacional; 2.4. Conclusão - 3. Responsabilidade Internacional dos Estados: 3.1. Responsabilidade dos Estados por atos internacionais ilícitos - 4. Responsabilidade por danos à biodiversidade - 5. Responsabilidade por danos ao clima - Responsabilidade por danos aos recursos hídricos: 6.1 Teorias sobre o uso dos cursos d´água internacionais; 6.2 Instrumentos internacionais sobre recursos hídricos - 7. Conclusão - 8. Referências


RESUMO

Este artigo tem o objetivo de investigar a possibilidade de responsabilização do Estado brasileiro por danos ambientais sobre a Amazônia. Para tanto, faz-se uma abordagem sobre as especificidades do Direito Internacional, posteriormente analisa-se o instituto da responsabilidade internacional dos Estados e, por fim, empreende-se uma investigação sobre a possibilidade de sua aplicação em face da conduta do Estado brasileiro em três temas relacionados à Amazônia: diversidade biológica, mudança de clima e recursos hídricos. Conclui-se pela ausência de instrumentos internacionais e normas internacionais costumeiras que ensejem, propriamente, a responsabilidade brasileira pela devastação amazônica, havendo somente exceções em que esta é possível.

Palavras-chave: Responsabilidade - Estados - Meio Ambiente - Amazônia - Dano


1. INTRODUÇÃO

A devastação ambiental de ecossistemas tropicais, realizada nos países subdesenvolvidos, é notória e freqüentemente retratada pela imprensa, tanto local como internacional. Na Amazônia, um sistema que representa "40% das florestas tropicais do mundo" [01] o cenário não é diferente.

A região conhecida como Amazônia abrange porções de terra de nove países: Brasil, França (Guiana Francesa), Suriname, Guiana, Venezuela, Colômbia, Peru, Equador e Bolívia. Entretanto, cerca de 60% deste ecossistema localiza-se em território brasileiro, o que faz com que boa parte, se não a maior parte, da agressão ambiental ocorra em área brasileira.

A devastação da Amazônia, no Brasil, insere-se dentro da estrutura econômica do país, o que torna a aplicação da legislação ambiental interna difícil. Essa dificuldade é potencializada pela ausência de uma estrutura adequada de aplicação dessas normas ambientais, as quais, ainda que modernas, não logram acabar com a agressão ao ecossistema amazônico. Um exemplo pode ser dado pelo desmatamento de 16 mil quilômetros quadrados registrado entre 2004 e 2005 [02].

Por outro lado, o perigo que se abate sobre o meio ambiente mundial tem despertado a preocupação da comunidade internacional, a qual vem contribuindo para o estabelecimento de um Direito Ambiental Internacional. Deste modo, conceitos de Direito Ambiental típicos dos sistemas internos, como o dever de precaução e o dever de utilizar o meio ambiente de forma sustentável, passaram a adquirir um caráter global. Ainda, conceitos clássicos de Direito Internacional costumeiro, como a responsabilidade internacional dos Estados por atos ilícitos, passaram a sofrer um enfoque ambiental.

Tendo sua gênese num caso envolvendo Canadá e Estados Unidos, e submetido a um tribunal arbitral, o conceito de responsabilidade internacional dos Estados por danos ambientais transfronteiriços já parece consolidado no âmbito do Direito Internacional. Não obstante, tendo em vista a tendência de se tratar o meio ambiente como uma parte inteira, como um sistema único global, a noção do que vem a ser dano ambiental transfronteiriço torna-se alvo de questionamentos. Seria, por exemplo, considerado transfronteiriço somente o dano causado a um Estado vizinho, ou poderiam ocorrer danos que fossem considerados transfronteiriços por afetar toda a comunidade internacional, mesmo que, aparentemente, o dano tenha sido causado, exclusivamente, em território de um Estado?

Nesse contexto, torna-se lógico levantar questionamentos que levem em conta a questão Amazônica. Por exemplo, um dano ambiental, praticado com a conivência do governo brasileiro em seu território, poderia ser tido como de conseqüências transfronteiriças caso contribuísse para a redução da biodiversidade e, deste modo, afetasse o estoque mundial de recursos genéticos? As queimadas efetuadas na Floresta Amazônica, muitas vezes com a ajuda de lideranças locais no Brasil, poderiam ensejar a responsabilidade internacional do Estado brasileiro por danos ambientais resultantes de alterações climáticas ocorridas no Oceano Pacífico, em virtude do lançamento, na Amazônia, de gases de efeito estufa na atmosfera? A poluição de rios amazônicos por mercúrio oriundo de garimpos ilegais poderia produzir algum tipo de dano tido como transfronteiriço?

O objetivo deste artigo é contribuir para o esclarecimento destas questões, ou seja, é verificar a possibilidade de o Estado brasileiro ser responsabilizado, na esfera internacional, por danos ambientais sobre a Amazônia. Para atingir este objetivo, faz-se uma breve análise de instrumentos normativos internacionais, bem como de regras costumeiras de Direito Internacional, sobre temas que, possivelmente, digam respeito à realidade amazônica e possam, talvez, ensejar a responsabilização do Estado brasileiro.

Para que não se engaje num levantamento infinito de temas, o que poderia desviar a pesquisa de seu objetivo, é feita uma restrição a três áreas específicas: biodiversidade, mudança de clima e recursos hídricos.

Inicia-se, assim, com uma exposição de algumas características específicas do Direito Internacional, com vistas a expor o contexto em que se insere este trabalho e familiarizar o leitor com os conteúdos aqui discutidos. Posteriormente, faz-se uma avaliação das normas genéricas existentes sobre a responsabilidade internacional dos Estados, as quais podem ser tidas como normas secundárias, isto é, aplicáveis somente em caso de infração de outras normas. Em seguida, analisam-se as normas ambientais internacionais sobre biodiversidade, mudanças climáticas e bacias hidrográficas. Por fim, após as análises, conclui-se sobre a possibilidade (ou impossibilidade) de responsabilização internacional do Estado brasileiro por danos ambientais sobre a Amazônia.

Tendo em vista o objetivo deste trabalho, não é feita nenhuma comparação com o estado das agressões ambientais em outros países. Tampouco se busca verificar, profundamente, qual seria a forma mais provável de exigência do cumprimento de uma obrigação internacional do Estado brasileiro; ou seja, analisa-se somente a questão da possibilidade de aplicação do instituto da responsabilidade internacional sobre a conduta do Estado brasileiro com relação à devastação amazônica, e somente se menciona, sem uma análise profunda, como poderia ser feita essa aplicação. Vale ressaltar, ainda, que o presente artigo não tem o objetivo de estabelecer um posicionamento contrário ou favorável à responsabilização internacional do Estado brasileiro, e tampouco defender a aplicação deste instituto legal como a única alternativa viável para a preservação da Amazônia.


2. DIREITO AMBIENTAL INTERNACIONAL

O Direito Ambiental Internacional surgiu ao longo do século XX em virtude do agravamento dos problemas ambientais e do estabelecimento de uma consciência ecológica na opinião pública internacional, a qual passou a clamar por uma tutela internacional do meio ambiente. Não se trata de uma disciplina autônoma do Direito, mas de um ramo do Direito Internacional focado na instituição de regras ambientais internacionais com fins de conservação e uso racional do meio ambiente.

O Direito Ambiental Internacional, desta forma, é a resposta ao interesse público transnacional que se despertou à proporção que os problemas ambientais tornaram-se mais sérios. O que, inicialmente, era tutelado pelo Direito Internacional geral passou a demandar uma tutela específica, pois o foco mudou. Antes, os meios de tutela centravam-se na reparação do dano ambiental já consumado. Com o passar do tempo, e o conseqüente agravamento dos problemas ambientais, a comunidade internacional despertou-se para a necessidade de "prevenção" e "precaução" [03].

Com o surgimento das noções de "prevenção" e "precaução", passou a ser necessário estabelecer maneiras de cooperação entre os Estados, ou mesmo de coerção de alguns Estados, para se evitar danos ainda maiores ao meio ambiente e, deste modo, à sobrevivência do homem. Desta forma, o ordenamento que compõe o Direito Ambiental Internacional é focado, principalmente, na prevenção dos danos ambientais. Não obstante, ainda que o objetivo maior seja a prevenção de danos ao meio ambiente, há também a preocupação, dentro da evolução do Direito Ambiental Internacional, em se estabelecer mecanismos objetivos de reparação de danos já consumados.

Para melhor se compreender o papel do Direito Ambiental Internacional na proteção do meio ambiente, BIRNIE e BOYLE [04],expoentes ingleses sobre o tema, apontam cinco funções principais desse ramo do direito:

- Prover mecanismos e procedimentos para negociar as regras e padrões necessários, resolver disputas e supervisionar a implementação e adequação aos tratados e regras costumeiras. Ajudar, pois, a promover a cooperação entre Estados, organizações internacionais, e ONGs (organizações não-governamentais).

- Regulamentar problemas ambientais, estabelecer padrões e objetivos internacionais comuns para a prevenção ou redução do dano, e prover um processo e elaboração de regras flexível que permite a adaptação rápida a novos desenvolvimentos tecnológicos e avanços científicos.

- Estabelecer reparação ou compensação por dano ambiental sofrido por um Estado ou indivíduo em virtude de dano transfronteiriço.

- Desenvolver direitos individuais ambientais e a responsabilização por crimes ambientais definidos no Direito Internacional.

- Harmonizar leis nacionais, tanto em âmbito global como em âmbito regional (União Européia, por exemplo), posto que os tratados e outros instrumentos internacionais acabam inspirando a elaboração de leis internas em diversos países.

Deste modo, seguindo-se o raciocínio dos dois autores, pode-se afirmar que o Direito Internacional Ambiental procura tanto prover a tutela do meio ambiente diretamente, por meio de tratados internacionais, como procura provê-la indiretamente, ou seja, pela inspiração de leis internas, padrões ambientais e de princípios do Direito Ambiental (em especial os da precaução e da prevenção) em diversos países.

2.1. Princípios do Direito Ambiental Internacional

Para melhor se compreender o âmbito do Direito Ambiental Internacional, é necessário, assim como em outros ramos do conhecimento, analisar-se, brevemente, seus princípios. Neste artigo, adota-se a classificação exposta pelo professor RUIZ [05], da Universidade de Valência, tendo em vista ela ser sintética mas, ao mesmo tempo, abrangente.

RUIZ elenca sete princípios do Direito Ambiental Internacional:

- princípio da cooperação internacional para a proteção do meio ambiente;

- princípio da prevenção do dano ambiental transfronteiriço;

- princípio da responsabilidade e reparação de danos ambientais;

- princípio da avaliação do impacto ambiental;

- princípio da precaução;

- princípio do poluidor-pagador;

- princípio da participação cidadã.

Segundo RUIZ (2000: 243), o princípio da cooperação internacional para a proteção do meio ambiente é o mais geral dos princípios vigentes no âmbito do Direito Ambiental Internacional. Ele estabelece o dever de se proteger o meio ambiente e propõe a cooperação internacional para tanto e encontra-se em vários instrumentos, como a Declaração de Estocolmo (de 1972), a Convenção da ONU sobre o Direito do Mar (1982) e na Declaração do Rio (de 1992).

Nesse princípio, incluem-se, sempre com o objetivo de proteger o meio ambiente, o dever de promover a conclusão de tratados e outros instrumentos internacionais, o dever de trocar informações relevantes, o dever de desenvolver ações como pesquisa científica e tecnológica, o dever de fornecer assistência técnica e financeira aos países necessitados, o dever de estabelecer programas de vigilância e avaliação ambiental, o dever de notificar prontamente e prestar assistência a outros Estados em situações de emergência que podem produzir conseqüências ambientais danosas, entre outros.

O princípio da prevenção do dano ambiental transfronteiriço, de acordo com RUIZ [06], constitui uma obrigação juridicamente exigível, suscetível de gerar responsabilidade em caso de violação. Entretanto, como reconhece o próprio autor, a sua generalidade torna difícil sua exigência em casos concretos, pois falta clareza sobre "a definição de dano ambiental, a determinação de padrão de diligência aplicável, a delimitação das conseqüências da violação cometida e a extensão de sua eventual reparação".

O princípio da responsabilidade e reparação de danos ambientais encontra-se largamente difundido na prática do Direito Ambiental Internacional. Entretanto, tendo em vista as discordâncias relativas à natureza e ao alcance desta responsabilidade, a maior parte dos instrumentos jurídicos internacionais somente cita esta responsabilidade, segundo RUIZ [07], "em um tom essencialmente exortatório". Um exemplo é o princípio 22 da Declaração de Estocolmo:

Os Estados devem cooperar para continuar desenvolvendo o Direito Internacional no que se refere à responsabilidade e à indenização às vítimas da poluição e de outros danos ambientais que as atividades realizadas dentro da jurisdição, ou sob o controle de tais Estados, causem a zonas situadas fora de sua jurisdição. [08]

O princípio da avaliação do impacto ambiental constante em grande parte dos ordenamentos ambientais internos, e ganha importância no âmbito internacional. Embora não conste na Declaração de Estocolmo, acha-se listado na Carta Mundial da Natureza, de 1982, a qual estabelece que as atividades que possam constituir graves perigos para a natureza "serão precedidas de um exame a fundo" (apud RUIZ [09]). A Declaração do Rio [10] também traz este princípio em seu texto.

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O princípio da precaução estabelece que não se deve utilizar a falta de certeza científica sobre a possível ocorrência de um dano como permissão para executar determinadas ações. Assim, somente havendo certeza científica de que certa atividade não acarretará danos "sérios ou irreversíveis" é que se pode agir (ou deixar de agir, no caso de ações que visassem a não permitir a ocorrência do dano). Este princípio também se encontra expresso na Declaração do Rio, em seu Princípio 15:

Com a finalidade de proteger o meio ambiente, os Estados deverão aplicar amplamente o critério de precaução conforme suas capacidades. Quando houver perigo de dano grave ou irreversível, a falta de certeza científica absoluta não deverá ser utilizada como razão para que seja adiada a adoção de medidas eficazes em função dos custos para impedir a degradação ambiental. [11]

O princípio do poluidor-pagador, de acordo com RUIZ [12], é o princípio que mais se aproxima da economia. Consiste em tornar o causador da poluição responsável pelos custos das medidas de prevenção e luta contra a poluição sem receber nenhum tipo de ajuda financeira compensatória. É uma busca pela internalização de custos, ou seja, o objetivo é fazer com que o poluidor arque com todos os custos de sua atividade e não os transfira à sociedade sob a forma de poluição (atmosférica, hídrica, térmica etc.), pois "o poluidor que usa gratuitamente o meio ambiente para nele lançar os poluentes invade a propriedade pessoal de todos os outros que não poluem, confiscando o direito de propriedade alheia" [13].

O princípio da participação cidadã encontra-se inserido tanto no Direito Ambiental Internacional como nos sistemas de direito interno. Na verdade, esta participação depende sempre dos ordenamentos internos. É possível fazer-se um paralelo com os direitos humanos, que, internacionalmente reconhecidos, ainda sofrem variações e restrições entre os Estados. Encontra-se uma exposição clara deste princípio na Declaração do Rio:

O melhor modo de tratar as questões ambientais é com a participação de todos os cidadãos interessados, em vários níveis. No plano nacional, toda pessoa deverá ter acesso adequado à informação sobre o ambiente de que dispõem as autoridades públicas, incluída a informação sobre os materiais e as atividades que oferecem perigo a suas comunidades, assim como a oportunidade de participar dos processos de adoção de decisões. Os Estados deverão facilitar e fomentar a sensibilização e a participação do público, colocando a informação à disposição de todos. Deverá ser proporcionado acesso efetivo aos procedimentos judiciais e administrativos, entre os quais o ressarcimento de danos e recursos pertinentes. [14].

Analisando-se os princípios do Direito Ambiental Internacional, vê-se que a responsabilidade e reparação de danos ambientais encontram-se dentre as bases desse ramo do Direito. É com base neste princípio que se desenvolve este artigo e faz-se, mais adiante, uma análise das normas concernentes à responsabilidade internacional dos Estados por dano ambiental.

2.2.. Fontes do Direito Internacional

O Direito Internacional, assim como o direito interno dos países, possui suas fontes. A classificação tradicional das fontes do direito internacional encontra-se no artigo 38 (1) do Estatuto da Corte Internacional de Justiça [15], o qual enumera as seguintes:

- convenções internacionais (tratados);

- costume internacional;

- princípios gerais do direito reconhecidos pelas nações civilizadas;

- decisões judiciais

- os ensinamentos dos mais altamente qualificados publicistas.

Além das fontes citadas, também há discussão sobre se as Resoluções da ONU seriam ou não consideradas fontes de Direito Internacional. Ainda, especialmente no campo do Direito Ambiental Internacional, tem-se observado a proliferação de instrumentos jurídicos aos quais se costuma denominar soft-laws, que serão abordados mais adiante.

2.2.1. Tratados

SEITENFUS e VENTURA [16] definem tratados como acordos concluídos entre dois ou mais sujeitos de direito internacional que se destinam a produzir efeitos jurídicos e são regidos pelo Direito Internacional. BIRNIE e BOYLE, por seu turno, os definem como "um acordo escrito ou oral entre Estados, ou entre Estados e organizações internacionais, regido pelo Direito Internacional" [17].

Os tratados são, no Direito Ambiental Internacional, uma fonte fundamental, tendo em vista que neles se encontram claramente expostos os direitos e obrigações de todas as partes signatárias e o fato de não existirem muitas regras costumeiras de Direito Internacional relacionadas ao meio ambiente.

Os tratados, via de regra, não obrigam países não-signatários dos mesmos. Entretanto, podem servir como espécie de obrigação moral ou mesmo, no longo prazo, estabelecerem-se como direito costumeiro e, desse modo, obrigar, no longo prazo, Estados que não os firmaram originariamente.

2.2.2. Costume internacional

SEITENFUS e VENTURA [18] definem o costume como "prática de aceitação geral que se converte em direito". Para esses autores, o costume possui dois elementos: o material e o subjetivo. O elemento material seria "a repetição de atos, comportamentos e opiniões, na administração de suas relações externas ou da organização interna, pelos sujeitos de direito internacional". O elemento subjetivo, por sua vez, seria a "existência, livremente consentida, de uma convicção por parte dos sujeitos, no sentido de que sua [do costume] aplicação é obrigatória".

O costume internacional, durante muito tempo, foi a fonte principal do Direito Internacional. Segundo SILVA [19], "a supremacia do costume na formação do Direito Internacional cessou depois da Segunda Guerra Mundial, em decorrência do aumento de membros da comunidade internacional e, também, em virtude do surgimento de novos e complexos problemas, dentre os quais os ambientais". Ainda, segundo o autor, o costume passou a ser considerado um critério insatisfatório e lento para acompanhar a evolução do Direito Ambiental Internacional. A realidade é que se torna difícil, num mundo repartido entre mais de 190 Estados, o estabelecimento de um costume internacional uniforme, diferente do que ocorria quando a maior parte do mundo era repartida entre algumas potências coloniais.

Entretanto, a importância do costume permanece. No Direito Ambiental Internacional, por exemplo, a questão da responsabilidade dos Estados é, em sua maior parte, regulamentada pelo costume internacional, tendo em vista que a comunidade internacional reluta em adotar regras escritas mais claras sobre o tema.

2.2.3. Princípios gerais do direito reconhecidos pelas nações civilizadas

Esta é uma fonte considerada controversa por alguns. SILVA [20], expõe que "dentre as fontes do direito internacional enumeradas pelo Estatuto [...], os princípios gerais de direito são os mais vagos, tanto assim que alguns autores negam o seu valor como fonte, ao passo que outros julgam que, em última análise, trata-se de um aspecto do direito costumeiro". Outra questão que suscita polêmica, embora de menor importância, é o emprego da antiquada expressão "reconhecidos pelas nações civilizadas".

Uma questão a ser analisada, em relação a esses princípios, é a que tipos de princípios eles se referem. Seriam estes os princípios do Direito Internacional, como o "não-uso da força", os "direitos humanos"? Seriam os princípios comuns em vários sistemas internos, tais como "devido processo legal" e "coisa julgada"? Segundo BIRNIE e BOYLE [21], um dos grupos do comitê preparatório do Estatuto enxergava a expressão como os princípios "identificados por todos os seres humanos racionais", o que se aproximaria mais do "direito natural". Por sua vez, outro grupo desse mesmo comitê, com abordagem mais positivista, acreditava que a corte deveria somente aplicar os princípios derivados da vontade dos Estados.

Mas há também quem veja a expressão como uma permissão para que a Corte Internacional de Justiça se socorra de uma fonte secundária, de modo a nunca deixar de solucionar uma demanda no caso de uma lacuna da lei (seja convencional ou costumeira). De acordo com BIRNIE e BOYLE [22], "a Corte não, nos poucos casos em que baseou em princípios gerais, considerou detalhadamente a prática das cortes domésticas, mas procurou extrair conceitos delas por dedução legal ou jurisprudência geral, e usou esses princípios gerais mais para apoiar conclusões tiradas de outras bases do que como base em si mesmos das decisões".

2.2.4. Decisões judiciais

As decisões judiciais ocupam um lugar de destaque no campo do Direito Ambiental Internacional. SILVA [23] aponta três decisões que exerceram influência na formação desse direito e que consistem no "direito costumeiro geral em matéria ambiental", as quais foram o "Caso da Fundição Trail (Trail Smelter Case)", o "Caso do Canal de Corfu" e o "Caso do Lago Lanoux".

O "Caso da Fundição Trail" resultou de um acordo de arbitragem entre os Estados Unidos e o Canadá em abril de 1935, com vistas a solucionar a questão da poluição de dióxido de enxofre provocada por uma fundição de zinco e chumbo, localizada em território canadense, que poluía parte do Estado de Washington, nos Estados Unidos. Na decisão proferida pelo Tribunal Arbitral, em março de 1941, foi reconhecido o direito de que "o Estado tem sempre o dever de proteger outros Estados contra atos injuriosos praticados por indivíduos dentro de sua jurisdição" [24] e estabeleceu-se o princípio da prevenção do dano ambiental transfronteiriço.

O "Canal de Corfu" foi decidido pela Corte Internacional de Justiça em abril de 1949. Em outubro de 1946, alguns navios de guerra britânicos receberam instruções de cruzar o canal de Corfu, situado entre a ilha de Corfu e a costa da Albânia. Ocorre que o canal estava minado e, na passagem, dois navios britânicos foram perdidos e tripulantes foram mortos. A Corte Internacional de Justiça decidiu que a Albânia violou o direito internacional ao não informar a Grã-Bretanha sobre a presença de minas no canal. Assim, estabeleceu-se o princípio de que "nenhum Estado pode utilizar o seu território para cometer atos contrários aos direitos de outros Estados" [25], o qual foi acolhido pelo Direito Ambiental Internacional.

O "Caso do Lago Lanoux" também levantou a questão da poluição transfronteiriça, embora não se tratasse, em princípio, do assunto. Tratava-se de um acordo de arbitragem sobre a possibilidade de a França utilizar águas do lago em obras localizadas em território francês sem que com isso a qualidade e quantidade da água que passaria a ser recebida em território espanhol fossem afetadas. O Tribunal Arbitral levantou a questão ao afirmar que "se poderia alegar que os trabalhos poderiam provocar uma poluição definitiva nas águas do rio Carol, ou que as águas restituídas tivessem uma composição química ou uma temperatura ou outra característica que pudessem prejudicar os interesses espanhóis" [26] o que, no caso, caracterizaria violação dos direitos do Estado Espanhol; tendo em vista que não havia qualquer alegação nesse sentido, não havia violação alguma ao direito da Espanha com a utilização das águas da maneira proposta pelos franceses.

Desse modo, as decisões judiciais constituem fonte importante para a aplicação do Direito Ambiental Internacional.

2.2.5. Ensinamentos dos mais altamente qualificados publicistas

Segundo SILVA [27], a doutrina dos publicistas mais qualificados representava, quando se preparava o Estatuto da Corte Internacional de Justiça, uma fonte importante do Direito Internacional, especialmente para aqueles formados na escola do direito romano, os quais se opunham ao common law.

Entretanto, verificou-se uma tendência, com o passar do tempo, da Corte Internacional de Justiça em não recorrer mais à doutrina, pois a Corte passou a entender que um pronunciamento de si própria teria mais influência do que opiniões de autores, por mais qualificados que fossem. Deste modo, observa-se que esses ensinamentos são citados especialmente por funcionários ou conselhos preparando opiniões ou pareceres para casos judiciais. Nota-se, segundo BIRNIE e BOYLE [28], que árbitros e tribunais internos, menos familiarizados com o Direito Internacional, tendem a dar maior importância a esses ensinamentos do que a Corte Internacional de Justiça.

Atualmente, grande parte do trabalho doutrinário (ao menos daqueles considerados como mais importantes) é realizada por instituições como a Comissão de Direito Internacional da ONU, o Instituto de Direito Internacional, a Associação de Direito Internacional, a Comissão Mundial para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento e a IUCN (International Union for the Conservation of Nature, União Internacional para a Conservação da Natureza).

2.2.6. Resoluções da ONU

A utilização das Resoluções da Assembléia Geral das Nações Unidas como fontes de Direito Internacional é um tanto polêmica, pois o Estatuto da Corte Internacional de Justiça não as arrola como fontes. Segundo Silva [29], "na opinião de alguns, as resoluções têm caráter obrigatório e os Estados são obrigados a cumpri-las". Mas o autor segue afirmando que tal opinião tem pouca aceitação e que, na realidade, deve-se analisar caso a caso.

Paul Reuter afirma que é necessário diferenciar entre duas hipóteses:

ou a regra existia antes da intervenção das Nações Unidas e a Assembléia Geral equivale a um reconhecimento desta regra pela organização; ou então a regra ainda não existia e a resolução da Assembléia Geral como tal não obriga os Estados-membros; em compensação, ele exerce uma certa pressão política sobre os Estados; se estes se conformarem com esta pressão, uma prática estatal pode se desenvolver e resultar depois de algum tempo na consciência de existir uma obrigação jurídica e resultar no nascimento de um costume. [30]

Entretanto, ainda que as Resoluções da ONU não possam ser consideradas, formalmente, como fontes de Direito Internacional, tendo em vista que, quando muito, elas representam somente o reconhecimento de uma regra preexistente, elas servem como elementos de pressão política e podem servir como elementos de coerção moral.

Com relação ao Direito Internacional Ambiental, há muitas declarações e resoluções das Nações Unidas sobre a matéria. Dentre elas, pode-se destacar a Declaração sobre o Meio Ambiente Humano de Estocolmo, de 1972 e a Declaração do Rio de Janeiro sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento. Segundo BIRNIE e BOYLE [31], "a importância desses instrumentos ou enunciados de princípios é que eles autorizam, mesmo que não obriguem, os Estados a agirem sobre a base dos princípios em questão". Desta forma, exercem uma certa coerção moral na prática dos Estados e possuem um efeito significativo na inspiração de leis internas nos Estados.

2.2.7. Soft-laws

O termo soft-law traduz-se, literalmente, do inglês, como "lei suave" ou "lei mole". Na noção clássica de Direito, a lei diferencia-se das demais regras de convívio social por ser coercitiva, imperativa e de respeito obrigatório. Desta forma, a lei deve ser "dura" para ser imperativa, vinculante. Como poderia existir, pois, uma lei "suave"?

Apesar desta polêmica, as soft-laws fazem-se mais presentes a cada dia no Direito Ambiental Internacional. Ocorre que, no âmbito internacional, não existe uma fonte de autoridade suprema, que se imponha sobre todos os Estados e que tenha poderes para elaborar leis e fazê-las serem cumpridas em todas as partes do mundo. Por outro lado, obter consenso em tratados que tenham força normativa é muito difícil, tendo em vista o grande número de Estados e as distintas realidades culturais, políticas, religiosas e econômicas existentes em seus interiores. No âmbito do Direito Internacional Ambiental, este consenso é, geralmente, ainda mais difícil, devido ao fato de que normas ambientais freqüentemente produzem impactos econômicos com os quais certos Estados podem não estar dispostos a lidar.

Desta forma, tendo em vista o surgimento e agravamento de problemas ambientais a cada dia, e a dificuldade de se elaborar normas coercitivas internacionais para tratar dessas questões que se apresentam, tem-se optado por instrumentos que se encontram a meio caminho de serem coercitivos, os quais são denominados, genericamente, soft-laws. Tais instrumentos possuem forma, geralmente, de códigos de conduta, recomendações, diretrizes, resoluções e declarações de princípios.

Verifica-se uma tendência para se elaborarem instrumentos desse tipo sob a forma de Convenções-quadro (Framework Treaties), também chamados de Umbrella Conventions. Nesta forma de estruturação, geralmente se estabelece uma convenção do tipo soft-law em caráter geral, enunciando princípios ou maneiras de conduta com relação ao tema sobre o qual tratam. Após essa primeira convenção, pouco a pouco, às vezes ao longo de anos, os diversos sujeitos signatários passam a assinar Protocolos separados, os quais regulamentam determinadas partes da convenção, tornando-a, desse modo, naquele particular, coercitiva. Dessa maneira, um instrumento que, inicialmente, não tinha poder coercitivo, passa a tê-lo. Um exemplo é a Convenção Quadro sobre Mudança de Clima, a qual foi complementada pelo Protocolo de Quioto.

As chamadas regras de soft-law contribuem, para o Direito Ambiental Internacional, ao fazer com que países passem a respeitá-las, embora não sejam imperativas, de forma que se estabeleça, no longo prazo, um costume internacional naquele sentido. Além disto, esses instrumentos também contribuem para a inspiração das legislações domésticas de cada país e mesmo para o estabelecimento de padrões de comportamento de organizações e indivíduos, levando à criação de uma consciência ecológica nas relações internacionais e, no longo prazo, ao estabelecimento de um costume internacional ou mesmo a tratados mais objetivos.

Deste modo, pode-se afirmar que as soft-laws, embora não sejam coercitivas, contribuem para o desenvolvimento do Direito Ambiental Internacional e para o estabelecimento de uma consciência ambiental que influencia as práticas dos Estados e organizações internacionais de forma a levar, no médio e longo prazo, ao estabelecimento de costumes internacionais ou mesmo de normas imperativas internacionais.

2.2.7.1 Soft Law é direito?

Há quem argumente que as soft-laws não constituem, propriamente, Direito, pois não possuem coercitividade imediata, seja por não serem suficientemente claras, seja por não possuírem um respaldo de uma estrutura capaz de se fazer imperar perante os Estados signatários. Entretanto, este não é o entendimento seguido neste trabalho.

Entende-se, nesta obra, que as soft-laws são Direito, posto que nem toda norma jurídica deve ser, necessariamente, objetiva a ponto de possuir aplicação imediata. Ainda, grande é a confusão existente entre os estudiosos do Direito Internacional sobre o que se poderia classificar como soft-law. Como expõe BROWNLIE:

[...] muitos dos exemplos tidos como de soft law não são nem exemplos de lei, nem de não-lei, nem de lex lata, nem de lex ferenda; são, simplesmente, evidência do que o direito é ou pode ser sobre uma determinada matéria. [...] mesmo quando você tem algo que é obrigatório em princípio (um tratado, um tratado bilateral, ou mesmo uma regra de direito costumeiro), alguns aspectos podem ainda precisar de explicitação. Mesmo quando você toma o tipo mais claro de obrigação, por exemplo, tratados bilaterais ou os tipos de tratados que você acha listado na série de tratados da ONU, você pode perceber que alguns desses tratados não possuem conteúdo normativo algum. Alguns tratados são tratados em forma, mas são simplesmente peças de conduta dos Estados envolvendo expressões de amizade [...]. Não estou desmerecendo tratados em geral, mas estou simplesmente apontando para a variedade de tipos de transação que são classificados sob a categoria formal de "tratados" e registrados como tal perante as Nações Unidas.

[...]

Creio que uma forma mais interessante de olhar as chamadas soft-laws é olhar para a sua real importância; o fato de que certas disposições informais, coisas que não são lei propriamente dita, obviamente possuem significância em termos de comportamento político entre Estados, e são, geralmente, reconhecidas por tomadores de decisão como detentores de um importante efeito catalítico. Por disposições informais, eu estou-me referindo a qualquer coisa que possa provocar a adoção dos elementos normativos como regras legais por tomadores de decisão com autoridade. [32]

Deste modo, o que há, no Direito Internacional, é a convivência de instrumentos vinculantes e instrumentos programáticos, sendo, muitas vezes, difícil a distinção entre ambos. Mesmo em sistemas de direito interno, há a convivência, no ordenamento jurídico, de normas vinculantes e normas programáticas, como nos casos das constituições, em que muitos dispositivos genéricos somente passam a ter validade depois de sua regulamentação por leis específicas.

2.3. Solução pacífica de conflitos no âmbito internacional

Com a evolução do Direito Internacional, surgiram maneiras de resolução de conflitos entre Estados de forma pacífica, sem o uso de força bélica. SEITENFUS e VENTURA [33] listam quatro formas de solução de conflitos de modo pacífico:

- negociação diplomática;

- negociações através das organizações internacionais;

- arbitragem;

- a Corte Internacional de Justiça.

É relevante ressaltar, no entanto, que nenhuma dessas formas é mais importante que a outra, nenhuma é mais perfeita que a outra. Na realidade, o que ocorre é que todas elas são formas paralelas, isto é, meios de igual valor que se apresentam para a solução dos litígios. A escolha de um meio ou outro depende, sobretudo, das condições que revestem o litígio, tais como condições políticas (tanto internacional como interna dos Estados envolvidos), condições econômicas, repercussão do conflito na opinião pública internacional entre outras.

A negociação diplomática é uma das formas mais tradicionais de resolução de litígios. Segundo SEITENFUS e VENTURA [34], "a obrigação de negociar deve ser imposta aos Estados envolvidos no litígio. Não se trata unicamente de iniciar uma negociação, mas de prossegui-la, na medida do possível, com vista a chegar a acordos". Trata-se de uma obrigação de conduta, não de resultado, tendo em vista que nenhuma negociação, por melhor que seja, tem como garantir que se logrará êxito. Nas negociações diplomáticas, tanto nas bilaterais (entre dois Estados) como nas multilaterais (mais de dois Estados), pode haver a participação de terceiros Estados os quais, não sendo parte do conflito, podem servir de "fiadores" do acordo que porventura vier a ser celebrado.

As organizações internacionais, criadas inicialmente com objetivos diversos, como manter a paz ou regulamentar o comércio internacional, foram além de seus objetivos iniciais e construíram um arcabouço legal para solucionar, de forma negociada, os litígios. A Carta da ONU [35], por exemplo, estabelece que tanto o Conselho de Segurança como a Assembléia Geral podem resolver litígios. Outro exemplo de resolução de conflitos por meio de organizações internacionais é o mecanismo de solução de controvérsias da OMC, por meio do qual Estados resolvem disputas comerciais.

A arbitragem é "uma técnica de solução pacífica dos litígios, onde um terceiro (Estado, organização internacional ou personalidade) intervém, impondo uma solução" [36]. Este método somente pode ser utilizado com o consentimento dos litigantes, pois os mesmos devem comprometer-se a aceitar a sentença arbitral. Pode a arbitragem ser facultativa ou obrigatória. É facultativa quando, posteriormente ao surgimento de um conflito, as partes litigantes assinam um "compromisso arbitral", o qual contém a definição do objeto do litígio, as condições e nomeação dos árbitros, os poderes dos árbitros, o regulamento procedimental e, às vezes, o direito aplicável aos árbitros. É obrigatória quando resulta de um tratado previamente assinado, no qual consta cláusula versando sobre a resolução arbitral de conflitos (podendo ser qualquer conflito ou somente alguns tipos de conflito) que porventura venham a existir entre esses Estados.

A Corte Internacional de Justiça (CIJ) é o órgão judiciário da ONU. Não se trata, contudo, de uma corte que pode impor suas sentenças a todos os Estados, tendo em vista que não existe, no Direito Internacional, uma autoridade coatora supra-estatal que tenha o poder de fazer valer uma sentença proferida por esta corte. Ela somente é acessível por Estados. Organizações internacionais podem solicitar consultas, mas não podem demandar. Segundo o Estatuto da Corte Internacional de Justiça [37], ela possui competência para interpretar tratados e pontos do Direito Internacional, para julgar qualquer fato que constituiria violação de um compromisso internacional, para julgar a natureza ou extensão da reparação devida pela ruptura de um compromisso internacional e mesmo para julgar qualquer questão que as partes lhe submetam. A Corte é alvo de críticas em virtude da sua lentidão em julgar os litígios a ela apresentados, em virtude da tentativa de agradar a todas as partes litigantes em suas sentenças e em virtude das posições parciais assumidas, muitas vezes, por seus juízes (os quais tendem a refletir as posições políticas de seus países de origem). Deste modo, os grandes conflitos internacionais têm passado à margem da Corte.

2.4. Conclusão

O Direito Ambiental Internacional, assim como o Direito Internacional de uma forma geral, segue em construção. O fato de se ter elaborado um termo para definir um conjunto de normas e regulamentos sobre matéria ambiental no âmbito internacional já demonstra que a preocupação em se tutelar, na esfera internacional, o meio ambiente, começa a se estabelecer no âmago das relações internacionais.

Baseando-se ainda em instrumentos muitas vezes sem real força coercitiva, o Direito Ambiental Internacional, ainda que, para alguns estudiosos e operadores do direito, de forma falha, tem passado a tutelar cada vez mais o meio ambiente. Em alguns casos, verifica-se uma tendência para a adoção de normas mais objetivas e coercitivas, como na questão da Camada de Ozônio. Em outros, ainda há caminhos por percorrer. Apesar disso, observa-se que, embora muitas normas não sejam coercitivas, o arcabouço jurídico gerado, internacionalmente, na questão ambiental, já se mostrou capaz de criar uma maior consciência ambiental nas relações internacionais, de influir nas legislações domésticas, de estabelecer padrões e de, no médio e longo prazos, preparar as condições para a adoção de mais normas internacionais coercitivas.

Desse modo, embora alvo de críticas, tanto com relação às normas internacionais estabelecidas, quanto com relação aos meio se de dar cumprimento a elas (ao menos àquelas que são coercitivas), o fato é que o Direito Ambiental Internacional tem contribuído para um gerenciamento ambiental mais eficiente por parte dos Estados.

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Sobre o autor
Ernesto Roessing Neto

bacharel em Direito pela Universidade Federal do Amazonas, bacharel em Economia pelo Centro Integrado de Ensino Superior do Amazonas, pós-graduando em Gestão de Comércio Exterior pela Universidade Federal do Amazonas

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROESSING NETO, Ernesto. Responsabilidade internacional dos Estados por dano ambiental:: o Brasil e a devastação amazônica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1172, 16 set. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8915. Acesso em: 19 abr. 2024.

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