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Os limites do dano moral:

justa causa não comprovada pelo empregador

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RESUMO

No presente texto, após serem observadas as divergências ocorridas nos julgamentos dos alegados Danos Morais decorrentes de Justa Causa não comprovada, propõe-se um estudo da real configuração do dano extrapatrimonial, a partir de uma abordagem do tema, examinando, a priori, em que circunstâncias a falta praticada configura justa causa, ou seja, requisitos de que deve se revestir, a fim de transformar-se em motivo autorizador da rescisão e, posteriormente, os critérios norteadores desta indenização, a fim de que o leitor possa se posicionar quanto ao tema. O objetivo deste trabalho é apenas tentar despertar a consciência dos operadores do Direito, e também dos jurisdicionados, para o fato de que todas essas demandas carregam e discutem uma moral subjetiva. O julgador, quando sentencia, coloca ali, para a solução do conflito, não só os elementos da ciência jurídica e da técnica processual, mas também toda uma carga de valores, que é variável de juiz para juiz. Em cada julgamento, particularmente nos da área trabalhista, a singularidade e a subjetividade estão fortemente presentes e foi a partir desta observação que deu-se início a este trabalho, com vistas a buscar os limites para a indenização por danos morais em virtude de justa causa descaracterizada pelo judiciário, apontando o perigo de não se estar fazendo justiça em muitos casos. O primeiro aspecto a ser analisado é a potestividade do direito de despedir por justa causa, ou seja, a liberdade dada pela lei ao detentor do poder diretivo para demitir seu funcionário, conforme preceitua o art. 482 da CLT. Posteriormente, este estudo fará menção ao direito constitucional de ação, porquanto tal prerrogativa possibilita ao empregador recorrer ao judiciário para tentar provar o fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do laborista e, sendo assim, tem ampla liberdade para contestar a reclamação que visa afastar a justa causa, sem temer uma posterior ação de danos morais. Conseqüentemente, este trabalho buscará concluir que o mero fato da demissão por justa causa ter sido afastada judicialmente não constitui, por si só, dano moral, exige-se a prova indiscutível do dano sofrido pelo trabalhador.

Palavras-chave: Justa Causa. Não comprovação. Limitações. Dano Moral.


1.1. Fim da Estabilidade

Dispõe a CLT, em seu art. 492, in verbis:

"Art.492. O empregado que contar mais de 10 (dez) anos de serviço na mesma empresa não poderá ser despedido senão por motivo de falta grave ou circunstância de força maior, devidamente comprovadas."

Por este dispositivo, ao completar dez anos de serviços contínuos numa determinada empresa, o obreiro tornava-se estável, não mais podendo ser abusivamente despedido pela livre vontade do empregador, nem mesmo mediante pagamento de indenização, mas apenas após comprovação de justa causa perante a Justiça do Trabalho, através de inquérito para apuração de falta grave. O Princípio da Continuidade da Relação de Emprego era aplicado, exceto por algumas burlas à lei, em sua plenitude.

Ocorria que, quando o empregador resolvia demitir um funcionário estável, tinha que ingressar com o inquérito judicial para apuração de falta grave, pois apenas por justa causa poderia rescindir o contrato de trabalho. Por muito tempo perdurou essa realidade, mais precisamente até 1966 quando surgiu o FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), através da Lei 5.107, de 13 de setembro de 1966.

A Constituição de 24 de janeiro de 1967 estabeleceu um sistema alternativo entre a estabilidade e o fundo de garantia, ou seja, os sistemas passaram a vigorar paralelamente, tendo o obreiro duas opções:

1ª) regime do FGTS: recolhimento mensal na conta vinculada no percentual de 8% sobre a remuneração percebida, fazendo jus o obreiro quando da dispensa imotivada, afora o pagamento de indenização compensatória de 10% (40% após a CF/88) dos valores depositados;

2ª) sistema da CLT: para o não estável, no caso de dispensa imotivada, tendo direito a 01 (um) mês de salário para cada ano trabalhado ou fração igual ou superior a 06 (seis) meses. Quanto ao estável somente poderia ser dispensado se cometesse falta grave constatada em inquérito perante a Justiça do Trabalho.

Após a promulgação da Constituição Federal de 1988 restou prejudicada a estabilidade decenal, bem como a forma de indenização prevista para os não estáveis constantes da legislação consolidada (arts. 477 e 478), já que todos os trabalhadores urbanos e rurais passaram a ser regidos pelo sistema do FGTS (art. 7º, III da CF). Quanto à estabilidade, apenas aos obreiros que já tinham direito adquirido antes de 05 de outubro de 1988 foi assegurada.

Mitigou-se, destarte, o Princípio da Continuidade da Relação de Emprego, já que hoje é permitido ao empregador romper o vínculo empregatício, sem que haja necessidade de apresentar qualquer justificativa, obrigando-se, apenas, ao pagamento das indenizações compensatórias.

Amador Paes de Almeida, sobre o contrato de trabalho após a CF/88, alega que:

"é um contrato sob condição potestativa de qualquer das partes, do que resulta que, nos contratos por prazo indeterminado, a qualquer tempo (salvo situações excepcionais), tanto o empregador quanto o empregado podem dar por rescindida a relação de emprego, obviamente cumpridas as exigências legais". [1]

Imaginava-se que com a criação do FGTS, reduzir-se-iam as demandas judiciais que buscavam provar justa causa para a resolução contratual, já que, doravante, mesmo sem a comprovação desta o empregador poderia demitir potestativamente seu empregado. Entretanto, são cada vez mais freqüentes as ações ajuizadas em nossos Tribunais com esse intuito e o que se busca hoje é o não pagamento das verbas rescisórias, posto que configurada a justificante, o obreiro fará jus apenas ao saldo de salário e à indenização das férias não gozadas, simples ou em dobro, acrescidas do terço constitucional.


1.2. Dispensa por Justa Causa: Direito Potestativo

O professor Sergio Torres Teixeira, chama-nos atenção para um tema polêmico da órbita trabalhista, o qual será usado como base para a defesa deste texto: a dispensa do empregado trata-se ou não de um direito potestativo do empregador?

"A dispensa constitui ato unilateral, praticado exclusivamente pelo empregador. Representa uma declaração de uma só vontade, a da entidade patronal, que o sistema legislativo reconhece como suficiente para se dar fim a um contrato individual de trabalho. Cessa o vínculo de emprego segundo a vontade negocial de quem despede (...) A natureza unilateral do ato de despedir, por sua vez, faz surgir uma das questões mais polêmicas acerca da sua natureza: a sua definição como direito potestativo ou direito relativo." [2]

Hodiernamente, a possibilidade de rescindir um contrato de trabalho por ato unilateral de vontade decorre da ênfase que se dá à liberdade. Neste sentido, Wagner D. Giglio [3] salienta que:

"No mundo ocidental, alicerçado no direito à propriedade privada, o empregador permite aos trabalhadores a utilização dos meios de produção que possui ou dirige, enquanto lhe convier; se desejar, tem liberdade econômica de despedir os inconvenientes. (...) Considera a doutrina assente que o ato unilateral de vontade que rescinde o contrato de trabalho pertence à categoria dos direitos potestativos, aos quais se reconhecem efeitos jurídicos autônomos, no sentido de que prescindem de qualquer outra fonte normativa".

Assim, a esmagadora maioria da doutrina defende que a rescisão do contrato de trabalho é mesmo direito potestativo do empregador, portanto, independente da vontade da parte em relação ao qual é praticado o respectivo ato (empregado). Contudo, há

doutrinadores que defendem a relatividade do direito de despedir, ou seja, também deve haver a submissão da vontade do obreiro. Data vênia, defende-se aqui que a dispensa é realmente um direito potestativo do empregador e que corresponde apenas a um direito relativo no que tange ao dever de seguir as diretrizes legislativas.

Sergio Torres [4], citando o posicionamento assumido em peso pelos doutrinadores brasileiros relata:

"Evaristo de Moaraes Filho, a classifica "...entre os atos jurídicos potestativos, isto é, dependem unicamente da vontade da parte denunciante, independente da aceitação, ou não, da vontade da parte denunciada". Antônio Lamarca afirma categoricamente que "o direito de denúncia do contrato individual de trabalho é de natureza potestativa". Segundo Orlando Gomes, por seu turno, constitui a dispensa "o exercício de um direito potestativo". Martins Catharino, segue idêntico raciocínio, ao afirmar que "temo-lo como direito potestativo". Para Délio Maranhão, de igual forma, representa um "direito potestativo."

Assim como a despedida pura, a despedida por justa causa é também direito potestativo do empregador, podendo ele a qualquer momento desfazer o vínculo empregatício, eis que a lei coloca à disposição dos empregadores a possibilidade de considerarem rescindido o contrato de trabalho quando o laborista tiver procedimento enquadrável nas alíneas do art. 482 da CLT. A perda da confiança é um dos fatores que tornam inviável a continuação da relação de emprego e, destarte, suspeitando que o obreiro tenha cometido uma falta grave, o empregador tem a liberdade para demiti-lo por justa causa.

Impende mencionar, ainda, que a ação, e por via de conseqüência a contestação, é um direito subjetivo e autônomo, posto que embora vise a proteger um direito material que o autor entende lesado, o direito de ação não se confunde com o direito material que se pretende defender e não depende da efetiva existência desse direito para que possa ser exercido. Em outras palavras, o direito de ação existe por si só e pode ser exercido mesmo que não exista nenhum direito material a ele subjacente. Isso fica bastante claro se pensarmos que o autor pode ver julgada improcedente sua pretensão ao término da ação.

O direito de ação é um direito público subjetivo do cidadão, expresso na Constituição da República em seu artigo 5º, inciso XXXV, o qual dispõe, in verbis:

"Art. 5º (...)

XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;"

O que se pretende esclarecer com essa observação é que o cidadão está livre para ingressar com uma ação, mesmo que tenha dúvidas quanto ao direito material que se quer proteger e, da mesma forma, em uma lide trabalhista o empregador tem direito de contestar com ampla liberdade, podendo alegar e tentar provar o que acredita ser a verdade, pois direito de contestar a ação está para o réu, assim como o direito de ação está para o autor.

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Sendo assim, o empregador tem o direito de contestar a Reclamação trabalhista para tentar provar a falta grave cometida, da forma que lhe for mais conveniente, pois, do contrário, estar-se-ia mitigando princípios constitucionalmente defendidos, tais como o Princípio do Contraditório e o da Ampla Defesa. A conclusão que se chega é a de que ambas as partes estão exercendo seus direitos potestativos: ao ingressar com uma reclamação, o autor; ao contestar, o réu.

Por fim, assim como não restam dúvidas quanto à natureza jurídica do direito de despedir, sendo certo que se trata de um direito potestativo do empregador, também fica eviente que a tentativa de provar a justa causa judicialmente trata-se do exercício de uma garantia constitucional. Destarte, seguiremos para a análise das diferenças entre dispensa abusiva e dispensa por justa causa, a fim de que possamos concluir nosso objetivo.


1.3. Dispensa Abusiva X Dispensa Por Justa Causa

Muito se confunde as dispensas abusiva e por justa causa quando da demanda trabalhista, em que o empregador não conseguiu comprovar a justa causa.

Conforme fora visto anteriormente, a dispensa por justa causa, assim como a demissão sem justificante, é também direito potestativo do empregador e, sendo assim, não se pode dizer que a dispensa é abusiva pelo simples fato de o empregador não ter conseguido comprovar a falta grave perante a Justiça do Trabalho.

O professor Sergio Torres [5] define a dispensa abusiva:

"Corresponde tal subespécie de despedida arbitrária, incluída na seara da dispensa sem justa causa, à despedida efetivada mediante o exercício abusivo do direito de despedir, ou seja, a dispensa cuja prática constitui verdadeiro abuso de direito. Ocorre quando concretizada por motivo ilegítimo, cuja relevância transcende a relação individual de emprego, constituindo violação expressa a princípios de fundamental interesse público e/ou social, a ponto de ser considerado um abuso do direito pelo empregador. Tal dispensa, em decorrência da causa ensejadora da vontade patronal, ultrapassa a seara do Direito do Trabalho e atinge postulados maiores, levando o exercício do direito de despedir a ser considerado como abusivo."

Entende-se que a dispensa abusiva é a praticada por motivos discriminadores, bem como a efetuada pelo administrador público em violação aos princípios norteadores da Administração Pública, ou seja, são totalmente "contrárias aos princípios universais do juslaboralismo" [6] e, portanto, ferem a imagem do empregado.

Sendo assim, não há como confundir as demissões abusiva e por justa causa não comprovada, visto que enquanto nesta o empregador age no exercício de um direito potestaivo, naquela extrapola os limites do Poder Disciplinar ferindo a imagem do obreiro. Destarte, o fato de a justa causa não ter sido comprovada pelo empregador perante a justiça especializada não configura dispensa abusiva e, por conseguinte, não acarreta dano à honra do obreiro.


1.4. Dano Moral na Justa Causa não comprovada pelo Empregador

Por cautela, presume-se que o instituto do Dano Moral não pode ser vulgarizado nesta Justiça Especializada, sob pena de inviabilizar as relações laborais e, por via de conseqüência, as relações econômicas do país. Deve-se observar, primeiramente, se não há má-fé no pedido de Danos Morais, pois muitas vezes esta alegação do obreiro tem o único intuito de locupletamento indevido.

Sobre o tema terminação do contrato de trabalho, com enfoque no despedimento, é notório que todo empregado que é demitido, por justa causa ou não, pode ficar sujeito a processo depressivo, uma vez que o bom senso revela que não há quem fique contente diante do desemprego, que em nosso país, é cediço, trata-se de problema estrutural. Não fosse assim, os milhões de desempregados existentes no Brasil deveriam ser agraciados com a benesse, já que todo trabalhador demitido sofre prejuízo de ordem sentimental.

Portanto, a justiça não está autorizada a condenar o empregador por danos morais a cada despedida por justa causa não comprovada. Não sendo possível, no curso do processo, a constatação do grave dano, bem como do nexo de causalidade entre o dano e a conduta do ofensor para se fazer presente o dever de indenizar, a conclusão lógica não pode ser outra senão a improcedência do pedido.

O acolhimento do pedido de indenização por danos morais é acusação grave demais para ser aceita sem a justa medida que ela requer. Ademais, como pressupõe reparação, o ato ilícito que tenha gerado o dano deve ser inequivocamente provado.

Destarte, não basta apenas a mera procedência da lide que visa afastar a justa causa para que se condene o empregador ao pagamento de Danos Morais, pois o simples fato de não ter conseguido demonstrar a falta grave imputada, não traz ao obreiro dano à sua imagem, mas apenas o direito às verbas rescisórias não recebidas.

O ato ilícito praticado pelo empregador com conseqüente dano à honra do obreiro apenas vai ocorrer, no nosso entender, quando aquele não tomar a cautela de limitar a publicidade dos fatos geradores da despedida por justa causa e/ou quando ficar provado que agiu de má-fé apenas para não pagar as verbas rescisórias. É o que veremos a seguir.

1.4.1. Má-Fé

"A litigância de má-fé se consubstancia através de ato doloso com o objetivo inescusável de enganar, de prejudicar. Não têm tal intensidade afirmações feitas em defesa e não prestigiadas por documentos juntados no mesmo ato pela ré. Quando muito teriam sido simplórias suas alegações". [7]

Veja-se que, pelo que foi dito, as afirmações feitas pelo empregador perante a Justiça do Trabalho sem a devida comprovação documental não enseja litigância de má-fé. Deve-se provar a vontade de enganar, ou seja, o dolo de uma das partes.

O legislador pátrio não procurou dar um conceito preciso à litigância de má-fé, no entanto, oferece-nos elementos robustos que indicam satisfatoriamente como se caracteriza essa espécie de litigância.

É bastante que se analise o art. 17 do Código de Processo Civil, in verbis:

"Art. 17 – Reputa-se litigante de má-fé aquele que:

I-deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso;

II-alterar a verdade dos fatos;

III-usar do processo para conseguir objetivo ilegal;

IV-opuser resistência injustificada ao andamento do processo;

V-proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo;

VI-provocar incidentes manifestamente infundados;

VII-interpuser recurso com o intuito manifestamente protelatório.

A litigância de má-fé, no caso em epígrafe, fica comprovada quando o empregador alega falsamente que o obreiro cometeu uma justificante com exclusivo propósito de não pagar as verbas rescisórias. É demonstrada, por exemplo, quando se constata que o laborista não praticou nenhum ato enquadrável no art. 482, ou seja, o empregador age com dolo demitindo seu empregado por justa causa apenas para não arcar com o ônus da despedida sem justa causa. Contudo, não é litigante de má-fé o empregador que, diante das atitudes do obreiro, age pensando encontra-se amparado no art. 482 da CLT.

Impende ressaltar que o art. 18 do CPC nos traz os critérios para o cálculo da indenização que o litigante deve pagar à parte contrária. Segue o artigo, in verbis:

"Art. 18 – O juiz ou tribunal, de ofício ou a requerimento, condenará o litigante de má-fé a pagar multa não excedente a um por cento sobre o valor da causa e a indenizar a parte contrária dos prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e todas as despesas que efetuou.

(...)

§2º O valor da indenização será desde logo fixado pelo juiz, em quantia não superior a vinte por cento sobre o valor da causa, ou liquidado por arbitramento."

Resta demonstrado, portanto, que a condenação em litigância de má-fé gera o dever de indenizar e, portanto, ao reparar o prejuízo causado, o empregador está exonerado de qualquer obrigação patrimonial advinda deste fato. Entretanto, posteriormente, poderá o obreiro ingressar com ação de Danos Morais para pleitear outra indenização, já que pelo mesmo fato também pode ter sido ofendido moralmente.

Segue transcrita, abaixo, uma decisão acerca do assunto:

DANOS MORAIS.JUSTA CAUSA. JUSTIÇA DO TRABALHO. COMPETÊNCIA. DANO MORAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. DISPENSA POR JUSTA CAUSA. ALEGAÇÃO DE IMPROBIDADE. OFENSA MORAL. (...) A simples afirmativa, na contestação, de cometimento, pelo empregado, de falta grave não é capaz de ensejar o abalo psicológico e, portanto, o dano extracontratual autorizador da obrigação de indenizar. Somente a conduta dolosa, de má-fé, emulativa ou absolutamente infundada, leviana e irresponsável (sérgio cavaliere filho) do empregador é capaz de fazer com que simples exercício do direito de petição se transforme em ato ilícito e, portanto, abra espaço para a indenização por dano moral." (grifos nossos) (TRT 1ª R. – 8ª Turma – RO 08131/1998 – Rel. Juiz Marcelo Augusto Souto de Oliveira - DORJ 31/03/2000)

Em suma, a má-fé que transgride o art. 5º, V e X da Lex Mater, em virtude das repercussões que pode acarretar, deve ser cabalmente provada em juízo, não devendo o julgador apegar-se a duvidosas presunções, notadamente de caráter íntimo e pessoal, quando o senso comum médio da sociedade não vislumbrar tal atitude.

1.4.2. Publicidade

A publicidade deve ser observada no caso concreto, pois pode ser feita através de jornal de grande circulação, com informações a respeito do inquérito interno promovido ou, apenas, internamente na empresa, o que mais comumente ocorre.

O art. 818 da CLT c/c o art. 333 do CPC prevê que a prova das alegações incumbe à parte que as faz. Assim, cabe ao Reclamante (empregado) a prova do fato constitutivo do seu direito e, ao Reclamado (réu), a prova do fato impeditivo, extintivo ou modificativo desse fato. Destarte, não conseguindo o reclamado (empregador) através de contra-prova demonstrar que houve, de fato, a falta grave elencada no art. 482 da CLT, caberá ao obreiro evidenciar que houve a publicidade desonrosa, o dano moral, através de documentos ou de testemunhas que tomaram conhecimento dos motivos da dispensa.

Pois bem, se o empregador despediu o obreiro por justa causa imaginando estar amparado pelo art. 482 da CLT e, em contrapartida, entendeu o obreiro não ser o caso, tanto que intentou ação hábil para anular a penalidade imposta pela empresa, o magistrado percebendo que realmente não há uma causa justificante, retifica em juízo a demissão, a fim de torná-la sem justa causa, concedendo ao empregado o ressarcimento que lhe é devido pela empregadora, por meio do pagamento das verbas rescisórias e apenas isso, pois não houve aí um abuso de direito ensejador de dano moral.

Por outro lado, restando demonstrada a existência de grave abalo sobre a reputação do empregado, mormente quando o empregador não tomou a devida cautela em limitar a publicidade dos fatos geradores da despedida por justa causa, configurado está o Dano Moral. Impende ressaltar, ainda, que o empregador deve ter agido com culpa ou dolo na divulgação das informações, pois se a disseminação fora feita pelo próprio obreiro ou sem culpa do empregador, não há que se falar em ano moral.

Octavio Bueno Magano, no referente ao tema, assim se manifesta:

"para a boa compreensão do assunto, é preciso ter presente que as justas causas estão referidas a padrões de conduta ou standards, pois, como as figuras penais, sempre tipificadas. Segue-se que se alguém chamar a outrem de ladrão, sem o provar, incide no crime de calúnia. Ao contrário, se atribuir a outrem a condição de ímprobo, posto que sem a prova da improbidade, o aludido crime não se configura. A conclusão final é no sentido de que a mera invocação de dispositivos configuradores da justa causa, mesmo quando esta não fique provada, não acarreta a obrigação de ressarcir danos morais. Só ficará por estes responsável o empregador que fizer a invocação de falta grave de modo abusivo, com o desígnio de ferir o código de ética do empregado." [8]

Pinho Pedreira segue a mesma linha de raciocínio ao mencionar que:

"a comunicação dos motivos, mesmo infundados, não deveria constituir injúria quando feita com as devidas cautelas por meio de envelope fechado, tanto mais se considerar a necessidade de contestar a falta, que deve ser colocada como determinante do processo disciplinar." [9]

Observe-se, neste tocante, o seguinte precedente:

"DANO MORAL. DIVULGAÇÃO DE SUSPEITA DE FURTO. Restando comprovado nos autos que a empresa permitiu a divulgação na notícia que o reclamante teria sido dispensado em razão da suspeita de furto, o que gerou possíveis boatos de cunho vexatório, mas o dispensou sem justa causa, resta configurado o direito à reparação pelo dano moral sofrido, acarretando mácula na vida profissional e pessoal do empregado, ao submetê-lo à situação constrangedora." (TRT 3ª R. – 5ª Turma – RO 00532-2003-113-03-00-6 – Rel. Juíza Maria Cristina Diniz Caixeta DJMG 04/10/2003 – p. 22)

Resta claro, a partir do exposto, que a indenização por danos morais, em sede de justa causa, apenas será devida pelo empregador quando este, ao demitir seu empregado por justa causa, extrapolar os limites do poder disciplinar, agindo de má-fé nas alegações que fizer ou, ainda, dando exagerada publicidade aos fatos que ensejaram a demissão, porquanto estará dirigindo ofensa direta à reputação, honra, decoro ou dignidade pessoal do funcionário.

Veja-se, por fim, alguns entendimentos jurisprudenciais acerca dos aspectos discutidos neste capítulo, os quais serviram de base para a elaboração deste texto.

"INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL DISPENSA POR JUSTA CAUSA. ATO FALTOSO NÃO RECONHECIDO EM JUÍZO. O fato de não ter sido reconhecido em juízo ato faltoso do empregado durante o contrato de trabalho, alegado pelo ex-empregador em ação anterior em face deste movida, não é suficiente, por si só, para caracterizar o dano moral decorrente da dispensa. A responsabilidade, no caso, está assentada na existência de um dano. Este que, uma vez configurado, provoca o desequilíbrio na ordem jurídica, representado pela agressão moral ao patrimônio de determinada pessoa. A partir daí, o direito investiga o fato danoso, bem como a presença de um possível agente causador e fixa a razão pela qual este responsável pelo evento e, por conseguinte, pela reparação. Ao se cuidar da responsabilidade, portanto, imprescindível que se tenha presente a existência daquele dano, que se caracteriza, em termos amplos, como a ofensa perpetrada por uma ação ou omissão que invade de modo negativo a esfera de direitos de alguém, causando-lhe lesão. Ausente o dano, não devida qualquer indenização." (TRT 3ª R. – 4T – RO 3727/01 – Rel. Juiz Márcio Flávio Salem Vidigal – DJMG 12/05/2001 – p.16)

"DISPENSA POR JUSTA CAUSA - AFASTADA EM JUÍZO -INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - O exercício pelo empregador, do seu direito potestativo de dispensar o empregado, ainda que arrimado em justa causa, afastada ulteriormente pelo Poder Judiciário, não acarreta uma lesão à honra, à imagem ou à moral do laborista. Ora, se a reclamada agiu pensando encontrar-se amparada no art. 482 da CLT, e, entendendo o obreiro não ser o caso, tanto que intentou ação hábil a anular a penalidade imposta pela empresa, o que restou ratificado em Juízo, já obteve, assim, o autor, o ressarcimento do que lhe era devido pela empregadora, por meio do pagamento das verbas rescisórias. Quanto ao alegado dano moral, nada lhe é devido, uma vez que não ficou cabalmente demonstrada nestes autos a sua ocorrência. Não fez prova de que a sua vida pregressa, a sua moral perante a sociedade, o seu passado profissional tenham sido atingidos de um modo grave o suficiente a ponto de o impedir de conseguir obter uma nova colocação profissional em outra empresa. Não há igualmente nenhuma prova de que o seu pedido de admissão em determinada empresa tenha sido recusado com arrimo na alegada justa causa afastada judicialmente. Assim, transtornos e descontentamentos, por não se enquadrarem nas hipóteses retratadas no inc. X, do art. 5º, da Carta Constitucional, não ensejam o pagamento da indenização guerreada. Deve-se evitar, ademais, a banalização da "indústria do dano." (TRT 3ª R. – 4T – RO 5801/01 – Rel. Juiz Júlio Bernardo do Carmo – DJMG 30/06/2001 – p.11)

Face às razões acima declinadas, bem como às decisões acima transcritas, conclui-se que a justa causa aplicada pelo empregador e afastada judicialmente não provoca, por si só, um dano à imagem do obreiro, tendo em vista que o empregador está autorizado por lei a despedir quando entender presentes as causas enumeradas nas alíneas do art. 482. Em busca dos danos morais, o laborista terá que provar que o empregador dolosamente aplicou a penalidade de demissão por justa causa visando apenas o não pagamento das verbas rescisórias ou que divulgou desnecessariamente e exageradamente o fato causador da demissão.

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Sobre a autora
Mariana Wolfenson Coutinho Brandão

Procuradora Federal e pós-graduada em Direito Civil, Empresarial e Processual Civil

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BRANDÃO, Mariana Wolfenson Coutinho. Os limites do dano moral:: justa causa não comprovada pelo empregador. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 650, 19 abr. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6594. Acesso em: 18 abr. 2024.

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