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A união homoafetiva sob o enfoque dos direitos humanos

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1.0 - Introdução

O presente trabalho visa – como o próprio nome indica – analisar a questão das uniões homoafetivas (neologismo criado por Maria Berenice Dias, em seu livro União homossexual: o preconceito e a justiça, para designar as uniões entre pessoas de mesmo sexo) sob a ótica dos Direitos Humanos.

Assim é que se pretende verificar como é vista a questão de tais uniões sob o ponto de vista dos Direitos Humanos, na tentativa de se descobrir se, perante a legislação vigente no Brasil – notadamente a Constituição Federal de 1988 –, seria possível considerar-se tais relacionamentos como juridicamente protegidos, ou se, face as declarações internacionais de Direitos Humanos – notadamente a Declaração da ONU de 1948 – seria juridicamente possível negar-se o "direito à união homossexual".


2.0 - Direitos Humanos

2.1 - Origem

Os autores, de um modo geral, concordam em traçar um paralelo entre o surgimento do constitucionalismo e o surgimento dos Direitos Humanos, uma vez que o objetivo de toda Constituição é, além de "dar forma" ao Estado, criando os órgãos estatais e descrevendo sua forma de atuação; limitar o Poder estatal, garantindo uma parcela "intocável" de direitos individuais e/ou sociais, a qual não poderia ser, arbitrariamente, suprimida pelos agentes estatais.

Esta parcela de direitos, a priori insuprimíveis é, justamente, o conteúdo do que hoje é conhecido por Direitos Humanos, assim como afirma Hewerstton Humenhuk: "é notório que os direitos fundamentais constituem a base e a essencialidade para qualquer noção de Constituição"

João Baptista Herkenhoff defende a idéia de que o processo de "criação" dos Direitos Humanos seria fruto da História da Humanidade, iniciando-se nos tempos mais remotos, e ainda hoje em permanente evolução (Conforme defende nos livros "Direitos Humanos: a construção universal de uma utopia" e "Direitos Humanos: uma idéia muitas vozes"), afirmando em determinado momento que "o que hoje se entende por Direitos Humanos não foi obra exclusiva de um grupo restrito de povos e culturas, especialmente, como se propala com vigor, fruto do pensamento norte-americano e europeu. A maioria dos artigos da declaração Universal dos Direitos Humanos foi verdadeira construção da Humanidade, de uma imensa multiplicidade de culturas, inclusive aquelas que não integram o bloco hegemônico do mundo." (Gênese dos Direitos Humanos, pág. 182)

2.2 - Conceito

A maioria dos autores (Paulo Gustavo Gonet Branco, op. cit.; Alexandre de Morais, op. cit.; e João Baptista Herkenhoff, Gênese dos Direitos Humanos) concordam em dizer que a idéia de Direitos Humanos está intimamente ligada à idéia de dignidade da pessoa humana.

Para João Baptista Herkenhoff: "por direitos humanos ou direitos do homem são, modernamente, entendidos aqueles direitos fundamentais que o homem possui pelo fato de ser homem, por sua própria natureza humana, pela dignidade que a ela é inerente. São direitos que não resultam de uma concessão da sociedade política. Pelo contrário, são direitos que a sociedade política tem o dever de consagrar e garantir. Este conceito não é absolutamente unânime nas diversas culturas. Contudo, no seu núcleo central, a idéia alcança uma real universalidade no mundo contemporâneo..." (Gênese dos Direitos Humanos, págs. 30 e 31)

Cumpre assinalar que Fábio Konder Comparato lembra que, segundo doutrina Alemã, os Direitos Fundamentais seriam uma espécie do gênero Direitos Humanos, que consistiriam nos Direitos Humanos positivamente reconhecidos.

Assim, apesar de que grande parte da doutrina considerar como sendo sinônimos os termos "Direitos Humanos" e "Direitos Fundamentais", chegando uns (Alexandre de Morais e Manoel Gonçalves Ferreira Filho, por exemplo) a considerar adequada a terminologia de "Direitos Humanos Fundamentais", estes termos não são, nos moldes apresentados, termos equivalentes. Concorda com esta idéia, Hewerstton Humenhuk.

2.3 - Valores da Declaração Universal dos Direitos Humanos

A Declaração de Direitos Humanos da ONU abriga e apresenta certos "valores", os quais deveriam ser buscados e respeitados por todos os povos.

Segundo concepção de João Baptista Herkenhoff, estes valores seriam em número de oito (Gênese dos Direitos Humanos, págs. 111 et seq.) e permeariam toda Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU.

Um destes valores é o valor "igualdade e fraternidade" que estaria presente nos dois primeiros artigos da Declaração.

Sobre o valor "igualdade" escreveu o ilustre jurista: "o valor ‘igualdade’ constituiu-se através da História por meio de dois movimentos interdependentes: a) o da afirmação da igualdade intrínseca de todos os seres humanos; b) o da rejeição de desigualdades específicas, particulares." (Gênese dos Direitos Humanos, pág. 124).

Nesse sentido, o autor lembra, mais adiante, que "Jefferson, nos Estados Unidos, afirmou, como democrático, que a vontade da maioria fosse a base do poder. Mas completou que essa vontade da maioria, para ser legítima, deveria ser razoável. A minoria possui direitos iguais, também protegidos pela lei, sentenciou Jefferson. Violar esses direitos é agir como opressor." (Gênese dos Direitos Humanos, pág. 127).

Outro o valor seria o da "liberdade" seria o suporte dos artigos III, IV, XIII, XVIII, XIX e XX, onde o autor afirma que "...a liberdade deve conduzir à solidariedade entre os seres humanos. Não deve conduzir ao isolamento, à solidão, à competição, ao esmagamento do fraco pelo forte, ao homem-lobo-do-homem, à ruptura dos elos. Essa ruptura leva tanto à esquisofrenia individual quanto à esquisofrenia social. Garantir a liberdade dentro de uma sociedade solidária é o desafio que se coloca. Liberdade para todos e não apenas para alguns. Liberdade que sirva aos anseios mais profundos da pessoa humana. De modo algum a liberdade que seja instrumento para qualquer espécie de opressão." (Gênese dos Direitos Humanos, pág. 136).

Um terceiro valor a ser apontado seria o valor "dignidade da pessoa humana" – que segundo nossa visão implica na concretização de todos os outros valores – seria a chama que alimenta os artigos III, V, VI, XIV, XV, XVI, XVII, XXII, XXVI e XXVII;

Assim seriam estes, e os outros cinco (os outros valores seriam: "paz e solidariedade universal", "proteção legal dos direitos", "Justiça", "Democracia" e "dignificação do trabalho") valores, os grandes objetivos a serem alcançados pela Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, em seus trinta artigos.

2.4 - Características dos Direitos Humanos

Na visão de Alexandre de Morais (op. cit., pág. 41), os Direitos Humanos seriam: imprescritíveis, inalienáveis, irrenunciáveis, invioláveis, universais, interdependentes, complementares e que buscam uma efetividade máxima dentro do ordenamento jurídico.

2.5 - A não-estabilização dos Direitos Humanos pela Carta da ONU

João Baptista Herkenhoff, no seu livro Direitos Humanos: a construção universal de uma utopia, demonstra de forma irrefutável a noção de que o processo de reconhecimento e declaração dos Direitos Humanos não se estabilizou após a Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU. Muito pelo contrário, a noção de Direitos Humanos continua se desenvolvendo, apresentando-se, na prática, a necessidade de declaração de mais direitos como sendo inerentes aos seres humanos.

Assim, ele apresenta vários documentos jurídicos que foram assinados após a promulgação da referida Declaração da ONU, e que trazem, em relação a esta mesma Declaração, uma ou outra ampliação da noção de Direitos Humanos. Seriam os principais documentos: A Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, A Declaração Islâmica Universal dos Direitos do Homem, a Declaração Universal dos Direitos dos Povos, a Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem, e a Declaração Solene dos Povos Indígenas do Mundo.

Assim, este autor afirma que "a idéia de ‘Direitos Humanos’ não se estabilizou no texto aprovado em 1948. Esta estabilização contraria o sentido dialético da História." (Direitos Humanos: a construção universal de uma utopia, pág. 15) uma vez que "a História não caminha dentro de parâmetros fixos..." (Ibid., pág. 17).

A noção de "gerações" ou "dimensões" de Direitos Humanos comprova o alegado: em um primeiro momento, cuidou-se dos direitos civis e políticos, depois vieram os direitos sociais, para depois chegar a vez dos direitos supra-individuais, tais como os relativos ao meio-ambiente, à saúde, à paz, etc...

Concorda com esta tese o jurista Paulo Gustavo Gonet Branco, que, em determinado momento, chega a afirmar que: "De fato, o catálogo dos direitos fundamentais vem-se avolumando, conforme as exigências específicas de cada momento histórico..." (Op. cit., pág. 115)

Apenas com o intuito de clarear esta idéia de não-estabilização dos Direitos Humanos, cumpre assinalar que Manoel Gonçalves Ferreira Filho afirma que "o reconhecimento dos direitos sociais não pôs termo à ampliação do campo dos direitos fundamentais. Na verdade, a consciência de novos desafios, não mais à vida e à liberdade, mas especialmente à qualidade de vida e à solidariedade entre os seres humanos de todas as raças ou nações redundou no surgimento de uma nova geração – a terceira –, a dos direitos fundamentais. [...] Na verdade, não se cristalizou ainda a doutrina a seu respeito. Muita controvérsia existe quanto a sua natureza e a seu rol. Há mesmo quem os conteste como falsos direitos do Homem. Tal hesitação é natural, pois foi somente a partir de 1979 que se passou a falar desses novos direitos cabendo a primazia a Karel Vasak." (Op. cit., págs. 57 e 58).

Ora, se os direitos de terceira geração somente foram assimilados pela consciência dos juristas mundiais a partir de 1979, é sinal que a tese apresentada por João Baptista Herkenhoff da não-estabilização dos Direitos Humanos com a simples Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU é correta, pois esta foi promulgada trinta e um anos antes, em 1948.

Existe quem defenda até mesmo uma quarta geração de direitos, a qual estaria apenas em estágio embrionário.

A não-estabilização dos Direitos Humanos é tão nítida que, Manuel Gonçalves Ferreira Filho aponta para a necessidade de não-vulgarização dos Direitos Fundamentais que surgiria da multiplicação destes direitos (Op. cit., pág. 67).

2.6 - As "gerações" ou "dimensões" dos Direitos Humanos

Deve-se ter em mente que com a idéia de "gerações" de Direitos Humanos, uma nova "geração" não exclui a anterior, muito pelo contrário, esta nova "geração" – por força da interdependência que existe entre os Direitos Humanos – vem reforçar a anterior.

O que acontece é que, em momentos históricos distintos, o povo percebe que o atual estágio de Direitos Humanos é insuficiente para garantir-lhes a dignidade condizente com sua condição de pessoa humana.

Assim, muda-se o enfoque da busca de Direitos, saindo-se da primeira para a segunda geração, e desta para a terceira, ou, em termos históricos: na época das Revoluções Francesa e de Independência da Treze Colônias, o que se buscou foi a garantia dos Direitos Civis e Políticos; depois, à época da Revolução Russa e pós-Primeira Guerra Mundial, buscou-se a garantia dos Direitos Sociais, Econômicos e Culturais; e, presentemente, busca-se a consagração dos Direitos de Fraternidade – o que, como dito anteriormente, reforça a idéia de não-estabilização dos Direitos Humanos pela simples Declaração da ONU em 1948.

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Os Direitos de primeira geração seriam as liberdades públicas; os de segunda geração, seriam os direitos econômicos e sociais, enquanto que os de terceira geração seriam os ligados à solidariedade entre os seres humanos: direito à paz, ao meio ambiente, à propriedade sobre o patrimônio comum da humanidade...

Há, ainda – como dito anteriormente –, quem pregue o surgimento de uma quarta geração de Direitos Humanos que, conforme Paulo Bonavides apud Hewerstton Humenhuk, seriam "o direito à democracia, o direito à informação, e o direito ao pluralismo"

2.7 - Novos e velhos direitos

Ao contrário do que pode parecer, não existe qualquer contradição entre a luta por novos direitos e a luta pela efetivação dos direitos já proclamados. É o que se verifica com a teoria das gerações dos Direitos Humanos: uma nova geração não substitui, nem exclui a anterior, pelo contrário, soma-se a ela.

Segundo, novamente o grande jurista João Baptista Herkenhoff, (Direitos Humanos: a construção universal de uma utopia., págs. 15 a 18) não existe contradição entre a luta pelos direitos já consagrados, mas ainda não efetivados, e a luta por novos direitos, pois todas estas lutas seriam lutas pela dignidade da pessoa humana.

É justamente a tese da não-estabilização dos Direitos Humanos com a Declaração da ONU de que tratamos acima, e sobre a qual o referido autor comprovou a veracidade, onde se pode comprovar que os Direitos Humanos ainda estão em fase de expansão, existindo quem propugne por uma quarta gestação de direitos.

Idéias estas que se somam no sentido de comprovar a tese de que ainda existem Direitos Humanos a serem universalmente proclamados, e dos quais um deles é, justamente ,o reconhecimento jurídico das uniões homoafetivas.


3.0 - Da homossexualidade

A homossexualidade não é, de forma alguma, uma característica exclusiva da espécie humana, estando presente também entre os animais. Segundo o cientista inglês George V. Hamilton, a homossexualidade está presente não só entre os primatas, mas também em inúmeros animais mamíferos. (Fernanda de Almeida Brito, União afetiva entre homossexuais e seus aspectos jurídicos, pág. 48).

Conforme reportagem da revista Superinteressante de agosto de 1999, o biólogo americano Bruce Bagemihl, em seu livro Exuberância Biológica - Homossexualidade Animal e Diversidade Natural, lançado naquele mesmo ano, apresentou provas mais do que convincentes e irrefutáveis de que existe homossexualidade e vasta diversidade de comportamentos sexuais entre os animais de diversas espécies.

As leis da Grécia, severas, condenavam a pederastia, que somente era tolerada para os gregos adultos que tutelavam meninos para fins educacionais e de sua inserção no convívio social. A pederastia era apresentada através do mito de Orfeu que após a morte de Eurídice vem a se apaixonar por meninos. Às esposas era somente permitido o papel de procriadoras, sendo aceito o prazer na prática sexual apenas para as prostitutas.

Conforme Luiz Alberto David Araújo (Op cit., pás 36 à 45), com o surgimento do cristianismo, com o surgimento do ideal da virgindade, inspirado na vida de Maria, que teria concebido seu filho sem ter mantido relações sexuais com José, tornando-se um modelo a ser seguido por todas as mulheres do mundo; o casamento, a sociedade e a sexualidade passam a ter uma interpretação cristã. A Igreja Católica pregou o sexo como algo mau, o prazer seria obra do Diabo; o sexo seria admitido unicamente com a finalidade de procriação, sendo ainda hoje condenado pela Igreja o uso de preservativos, mesmo durante relações sexuais entre marido e mulher. O pecado original seria fruto de uma relação sexual. Por isso ele é mau. O celibato é o modo pelo qual os homens se redimem do pecado original.

Pouco mais adiante na história, durante o período Renascentista, vários intelectuais da época, cultivaram paixões homossexuais, como é, por exemplo, os casos de Miguel Ângelo e Francis Bacon (Fernanda de Almeida Brito, Obra citada, pág. 47).

Mais tarde, Freud postula a existência da sexualidade desde o nascimento; inicialmente assimiladas às funções fisiológicas de nutrição, as relações com a mãe, o pai, a família e o meio social vão-se integrando como um todo, transformando-se num longo processo, que culminaria na fase adulta. Os instintos sexuais, com base orgânica ligada às zonas erógenas do corpo, que constituem uma fonte ininterrupta de estímulos, que não podem ser eliminados pela fuga. A noção de perversão perde seu sentido original para englobar características preliminares ao ato sexual, sendo que todo adulto lança mão das perversidades para alcançar o ato sexual em si, que desta forma se desvincula da necessidade de procriação, o fundamental é a realização do desejo, a busca do prazer. Segundo Freud, os homossexuais, os voyers, os fetichistas, etc... são considerados perversos no sentido que buscam o prazer dentro dá ótica infantil e não adulta.

Desta forma, a homossexualidade existe, não só entre os homens, como em inúmeras espécies animais, desde os tempos mais remotos da história da humanidade, sendo desta forma, uma característica inerente ao ser humano, havendo até mesmo quem sustente que todas as pessoas têm desejos homossexuais reprimidos, e que só não os deixam aflorar por puro preconceito pessoal.

O certo é que, "desde que o mundo é mundo", a homossexualidade existe, e não será proibindo-a que se acabará com ela. Quem defende que a homossexualidade é algo errado, contra a natureza, deve ter em mente que durante séculos e séculos esta atitude foi, e ainda é, combatida pela igreja, como será apresentado a seguir, mas ela continua resistindo e existindo. Não será "varrendo" a homossexualidade para "debaixo do tapete" que se acabará com esta prática. Mesmo porque, se até os animais têm relações homossexuais, como pode alguém dizer que esta é uma prática contra a natureza? Ou será que foram os homens quem ensinaram os animais à ter relações homossexuais? Claro que não, isto faz parte do instinto animal, e o ser humano, sendo igualmente animal, deve, igualmente, possuir instintos semelhantes aos da maioria dos animais.

A religião sempre combateu o sexo apartado da idéia de procriação, sendo contra, portanto, não só a homossexualidade, como também o adultério, a prostituição, e mesmo contra o sexo durante o casamento sem ter em mente a ampliação da família.

É claro que na Bíblia Sagrada não existe a palavra homossexual, ou qualquer outra do gênero, quer seja para criticar, quer seja para apoiar, pois este termo é moderno, e o seu texto, antigo, não poderia conter uma palavra que ainda não existia na época em que foi escrito.

Mas pode-se encontrar, por exemplo, em Corintios 6:9 "Não sabeis que os injustos não herdarão o reino de Deus? Não vos enganeis: nem os devassos, nem os idólatras, nem os adúlteros, nem os efeminados, nem os sodomitas". Devendo os termos "efeminados" e "sodomitas" ser entendidos e identificados com o que hoje se entende por homossexuais. Desta forma, está claro que os homossexuais não "herdarão o reino de Deus", e por isso, serem, todas as igrejas, quer sejam a Católica ou outras igrejas Evangélicas, radicalmente contra a homossexualidade.

Outro exemplo pode ser colhido em Levítico 18:22, onde lê-se: "Com o homem não te deitarás, como se fosse mulher: É abominação". Este versículo, mais ainda que o anterior, deixa claro, que a homossexualidade é contrário à vontade divina.

A igreja, portanto, combate abertamente a homossexualidade, baseando-se em escritos bíblicos. Porém, o que os mesmos cristãos se esquecem é que na mesma bíblia de onde tiram os motivos para condenar os homossexuais, existe uma passagem que diz "Não julgueis, para que não sejais julgados." Mateus 7:1

Mesmo que a homossexualidade seja combatida pela bíblia, e, consequentemente contra a vontade de Deus, quem será suficientemente bom e sem pecados para ser digno de julgar alguém? Se, nem mesmo Jesus teve a ousadia de julgar as pessoas, quem seremos nós, míseros mortais e pecadores para fazermos o julgamento de alguém? Ademais, "...aquele dentre vós que está sem pecado que lhe atire uma pedra" (João 8:7).

Só a Deus cabe julgar, à nós, seres humanos, cabe amar ao próximo como a nós mesmos, fazendo o bem, sem olhar a quem, conforme a parábola do Bom Samaritano, narrado em Lucas 10:1-42.

Ademais, não se deve misturar Direito e Religião, pois são coisas diferentes. Bem andou o legislador ao contrariar alguns escritos bíblicos, como por exemplo este trecho que manda à mulher obedecer ao marido: "Vós, mulheres, submetei-vos a vossos maridos, como ao Senhor; porque o marido é a cabeça da mulher, como também Cristo é a cabeça da igreja, sendo ele próprio o Salvador do corpo. Mas, assim como a igreja está sujeita a Cristo, assim também as mulheres o sejam em tudo a seus maridos." (Efésios 5:22-24).

Quem, em pleno século XXI, seria capaz de afirmar que o homem é superior à mulher, e que portanto esta deve submeter-se àquele? Hoje em dia já está consagrado no mundo jurídico o princípio de igualdade entre os sexos.

Deve-se lembrar ainda, que o Direito não está submisso à Religião, tanto é verdade que o Direito, mais uma vez, contraria os ensinamentos da Bíblia ao autorizar o divórcio, pois, conforme Marcos 10:7-9: "Por isso deixará o homem a seu pai e a sua mãe, e unir-se-á a sua mulher. E serão os dois uma só carne: e assim já não serão dois, mas uma só carne. Portanto o que Deus ajuntou não separe o homem."

Assim sendo, o Direito não está, de forma alguma, ligado à Religião, contrariando-a às vezes, e, portanto, já que o Direito não obedece aos mandamentos bíblicos que ordenam a mulher a submeter-se ao seu marido, e que impedem o divórcio, porque os juristas se preocupam com o fato de ser a homossexualidade contra a vontade de Deus? Se o ordenamento jurídico já contrariou a Bíblia em nome da igualdade entre os sexos, porque não pode, mais uma vez, contrariá-la, afirmando a igualdade entre hetero e homossexuais?

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Sobre o autor
Enéas Castilho Chiarini Júnior

advogado e árbitro em Pouso Alegre (MG), especialista em Direito Constitucional pelo Instituto Brasileiro de Direito Constitucional (IBDC) em parceria com a Faculdade de Direito do Sul de Minas Gerais (FDSM)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CHIARINI JÚNIOR, Enéas Castilho. A união homoafetiva sob o enfoque dos direitos humanos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 235, 28 fev. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4902. Acesso em: 29 mar. 2024.

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