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Competência tributária

Competência tributária

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Sumário: 1. introdução; 2. competência tributária; 2.1 conceito; 2.2 distribuição da competência tributária; 2.3 espécies de competência tributária; 3. limites constitucionais à competência tributária; 3.1 da legalidade; 3.2 da isonomia; 3.3 da irretroatividade e da anterioridade ; 3.4 da vedação ao efeito confiscatório, da imunidade e isenção tributária; 4. características da competência tributária; 4.1 inalterabilidade; 4.2 indelegabilidade e irrenunciabilidade; 4.3 incaducabilidade; 4.4 facultatividade; 4.5 privatividade; 5. conflitos de competência; 5.1 bis in idem e bitributação; 6. competência residual; 7. conclusão; 8. notas; 9. referências bibliográficas.


1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho, por certo, não pretende investigar à exaustão o tema ora proposto, senão, com um mínimo de diligência, suscitar algumas anotações pontuais relevantes. Assim, uma percuciente investigação do tema será deixada aos experts, cujo cabedal de conhecimento jurídico transcende o desse neófito estudante.

Nessa perspectiva, mister esclarecer que o estudo da competência tributária encontra-se jungido ao princípio da Federação, cujos entes políticos, detentores de autonomia, que não se confunde com soberania (afeta apenas à União), detêm uma série de competências, dentre as quais a competência tributária, que se subordina "às normas constitucionais, que, como é pacífico, são de grau superior às de nível legal, que prevêem as concretas obrigações tributárias"(1).

Com efeito, pode-se asseverar que a Constituição Federal é a "lei tributária fundamental, por conter as diretrizes básicas aplicáveis a todos os tributos"(2). E, certamente, por essa razão, muito se fala em sistema constitucional tributário, pelo qual se entende "o conjunto de princípios constitucionais que informam o quadro orgânico de normas fundamentais e gerais do direito tributário, vigentes em determinado País. Se ‘sistema é um conjunto ordenado de elementos segundo uma perspectiva unitária’, o sistema constitucional tributário é o conjunto ordenado das normas constitucionais que tratam da matéria tributária, matéria esta tomada como princípio de relação que as unifica"(3).

Do acima articulado decorre que o estudo da competência tributária é um tema exclusivamente constitucional, na medida em que o assunto foi esgotado pelo constituinte.


2. COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA

2.1 Conceito

Cumpre, inicialmente, consignar que a acepção do termo competência tributária não se confunde com poder tributário, ainda que haja conexidade entre ambos. Primeiro, porque competência tributária é "a manifestação da autonomia da pessoa política que a detém"(4), com suporte no princípio da Federação, consubstanciado no art. 1º da Carta Política de 1988, em que cada uma das pessoas políticas internas possui autonomia. Segundo, porque o poder tributário "se opera tão-somente no âmbito dos Estados unitários, nos quais existe uma única pessoa política central, imbuída do poder absoluto de tributar, sem quaisquer restrições"(5).

Não obstante o acima expendido, a doutrina mais abalizada rechaça essa diferenciação acadêmica baseada no autoritarismo do Estado, haja vista entenderem que "o poder de tributar nada mais é que um aspecto da soberania estatal, ou uma parcela desta", de modo que "a idéia mais generalizada parece ser a de que os indivíduos, por seus representantes, consentem na instituição do tributo, como de resto na elaboração de todas as regras jurídicas que regem a nação"(6).

A expressão competência tributária pode ser definida como sendo o poder, atribuído pela Constituição Federal, observadas as normas gerais de Direito Tributário, de instituir, cobrar e fiscalizar o tributo, compreendendo a competência legislativa, administrativa e judicante. Noutras palavras, pode-se definir competência tributária como sendo "a parcela do poder de tributar conferida pela Constituição a cada ente político para criar tributos"(7), ou, ainda, "a aptidão para criar, in abstracto, tributos" (8). Não destoa o entendimento segundo o qual se conceitua competência tributária "como o limite do poder fiscal para legislar e cobrar tributos"(9).

2.2 Distribuição da competência tributária

Não se pode olvidar que em razão do princípio Federativo adotado pelo Brasil, o que denota uma carga de autonomia aos entes políticos, exige uma distribuição, repartição ou mesmo discriminação de competências tributárias. Isso, a propósito, vem explícito no art. 145 da Constituição Federal, quando estatui que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir tributos.

Por evidente, tal competência há de ser distribuída e delimitada, sob pena de instaurar-se o caos tributário, administrativo e jurídico no país. Nesse sentido, a Constituição Federal em seus arts. 153, 155 e 156, sob as epígrafes "Dos impostos da União", "Dos impostos dos Estados e do Distrito Federal" e "Dos impostos dos Municípios", estabeleceu a competência desses entes políticos. Há de se atentar ainda para a competência residual da União, em observância ao art. 154 da Carta Constitucional.

Diante do exposto, infere-se que a repartição de competências tributária decorre "da própria estrutura do Estado Federado e, para que tenha condições de plena eficácia, deve ser rígida e exaustiva, objetivando prevenir os conflitos e invasões de uma pessoa política por outra"(10). Em outras palavras, "a distribuição de competência tributária, ou seja, a divisão das áreas dentro das quais a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios podem criar e cobrar tributos, é taxativa, isto é, não admite qualquer invasão de uns pelos outros"(11).

2.3 Espécies de competência tributária

A doutrina não é harmônica quanto ao número de espécies de competência tributária. De qualquer sorte, no âmbito da repartição de competências, corolário do princípio Federativo, menciona-se as seguintes:

Competência cumulativa ou comum, inserta no art. 145, II e III, da Constituição da República, é aquela atribuída a uma ou mais entidades políticas, como por exemplo a que "possibilita a cobrança das ‘taxas’ e ‘contribuição de melhorias’ pela União, Estados Distrito Federal e Municípios, evidentemente dentro das respectivas competências de atuação"(12).

A competência privativa ou exclusiva é a atribuída específica e exclusivamente a um ente político, ou seja, "ocorre quando apenas uma pessoa política pode tributar determinado fato, excluindo-se a competência dos demais entes (ex.: IPI)"(13). Isso equivale dizer que "também é excludente, uma vez que constitui uma obrigação negativa para as outras entidades, que não podem invadir aquela área própria e privativa do ente político beneficiado"(14).

Competência residual é o poder de instituir outros tributos não previstos na Constituição Federal, em seus artigos 153, 154 e 155. No Brasil, somente a União detém a competência residual, nos termos do art. 154.

Competência legislativa plena é o poder de legislar sobre todos os aspectos do tributo, tais como fato gerador, base de cálculo, alíquota, contribuintes etc., consoante disposto no art. 6º do Código Tributário Nacional – CTN, observando-se as normas gerais de direito tributário. Isso quer dizer que "no que se refere à competência federal, o legislador federal sofre as restrições previstas na Constituição Federal e na Lei Complementar (CTN); o legislador estadual, além das normas referidas para a União, sofre as restrições da Constituição Estadual; e o legislador municipal, além das normas referidas para a União e os Estados-membros, sofre restrições previstas na Lei Orgânica dos Municípios"(15).

Competência legislativa supletiva ou suplementar é a atribuída aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios para, nas suas respectivas esferas, editarem normas complementares, nos termos do art. 24, § 2º, da Constituição Federal.

Competência concorrente é a competência atribuída pela Constituição Federal aos três níveis de governo para legislar sobre direito tributário, consoante a dicção do art. 24.

Como se pôde observar, é a Constituição Federal quem atribui competência em matéria tributária, que, sintetizando o pacto federativo, traça os contornos gerais do Estado nas suas três esferas de poder. Como expressão pura desse pacto ela distribui as competências tributárias entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, formando, juntamente com os princípios e as normas de direito tributário, o Sistema Tributário Nacional.


3. LIMITES CONSTITUCIONAIS À COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA

As limitações à competência tributária, previstas nos artigos 9º a 11 do CTN, consistem-se em princípios e normas jurídicas, consubstanciadas em vedações constitucionais, que têm por objetivo a garantia do cidadão contra o abuso do poder de tributar do Estado.

Nesse diapasão, cumpre registrar que princípios constitucionais são "aqueles que guardam os valores fundamentais da ordem jurídica. Isto só é possível na medida em que estes não objetivam regular situações específicas, mas sim desejam lançar a sua força sobre todo o mundo jurídico"(16).

São exemplos de princípios albergados pelo ordenamento jurídico pátrio, a saber: o republicano, o federativo, da legalidade, da anterioridade, da ampla defesa, dentre outros. Para efeitos do presente estudo, consentâneo tecer algumas considerações acerca de princípios tributários expressos que constituem limites de índole constitucional à competência tributária.

3.1 Da Legalidade

Também denominado de princípio da reserva legal (arts. 5º, II e 150, I, da Constituição Federal, e o art. 97, do CTN), preceitua que não há tributo sem lei que o institua ou o majore. Esse princípio tem raízes na história da humanidade, encontrando sua expressão máxima na soberania popular, na medida em que limitou o poder real, impedindo-o de instituir tributo de forma arbitrária, sem o consentimento dos cidadãos (parágrafo único do art. 1º da Constituição Federal).

A magnitude de sua importância é tamanha que se encontra sob a égide do título "Dos direitos e garantias fundamentais", firmando-se, assim, como cláusula pétrea (art. 60, § 4º, da Constituição Federal).

Com efeito, "está implícita como princípio de direito tributário a exigência da lei como fundamento da tributação"(17), de sorte que não há falar em criar, majorar ou extinguir tributo senão por intermédio de lei.

Não é demais lembrar que Medida Provisória não é lei em sentido estrito-formal, entendendo-se por esta a regularmente aprovada pelo Poder Legislativo e sancionada pelo Executivo, o que afasta, em tese, a sua utilização no âmbito tributário.

3.2 Da isonomia

Inserto no art. 150, inciso II, da Constituição da República, veda o tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situações equivalentes. Esse princípio é corolário do princípio geral de que todos são iguais perante a lei, sem qualquer distinção, conforme disposto no art. 5º da Carta Política.

Não por acaso o aludido princípio é também denominado de princípio da igualdade tributária, uma vez que "em matéria tributária, mais do que em qualquer outra, tem relevo a idéia de igualdade no sentido de proporcionalidade. Seria verdadeiro absurdo pretender-se que todos pagassem o mesmo tributo. Assim, no campo da tributação, o princípio da isonomia às vezes parece confundir-se com o princípio da capacidade contributiva"(18).

3.3 Da irretroatividade e da anterioridade

Os princípios da irretroatividade e da anterioridade encontram-se sob o abrigo do art. 150, III, alíneas ‘a’ e ‘b’, da Constituição Federal, respectivamente.

O primeiro, como cediço, é basilar no sistema jurídico, e decorre dos princípios gerais que estatuem que "a lei não retroage, exceto para beneficiar" e que "a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada" (art. 5º, XXXVI, CF).

Notadamente na seara do Direito Tributário o aludido princípio veda a cobrança de tributos relativos a fatos geradores ocorridos antes da vigência da lei. Em conseqüência, a legislação tributária aplica-se, imediatamente, aos fatos geradores futuros e aos pendentes, "com o fim de garantir a estabilidade jurídica e a segurança nos negócios e fatos jurídicos"(19), nos termos do art. 105 do CTN.

Já o princípio da anterioridade, previsto no art. 150, III, ‘b’, da CF, e no o art. 9º, II, do CTN, tem o escopo de assegurar a previsibilidade das normas tributárias, evitando-se surpresas ao contribuinte, de sorte que "para ser validamente incidente sobre os fatos jurídicos ocorridos num determinado período (geralmente no período fiscal, que coincide com o ano civil) deve ser publicada no exercício financeiro anterior"(20).

Constituem, todavia, exceção a esse princípio os impostos de importação, de exportação, sobre produtos industrializados, sobre operações financeiras, extraordinário por motivo de guerra, contribuições para o financiamento da seguridade social etc., conforme os artigos 148, 149 150 e 195, todos da Constituição Federal.

3.4 Da vedação do efeito confiscatório, da imunidade e isenção tributária

O primeiro, previsto no art. 150, IV, da Constituição da República, expurga do ordenamento jurídico a possibilidade de ocorrer uma tributação extorsiva correspondente à absorção, total ou parcial, da propriedade pelo Estado, sem que haja a devida indenização ao contribuinte. Todavia, não se trata de confisco a cobrança do ITR a razão de 20% ao ano incidente sobre o valor da terra nua em área rural, ainda que matematicamente conclua-se que ao final de 5 anos o contribuinte terá pagado o equivalente a 100% do valor da terra. Em verdade, o que se pretende com esse imposto é atender ao preceito constitucional do fim social da propriedade (art. 5º, XXIII, CF), de modo a compelir o proprietário de terras rurais improdutivas torná-las produtivas socialmente.

No que tange aos princípios da imunidade e da isenção tributária, faz-se necessário uma distinção entre ambos, ainda que perfunctória, no sentido de que as primeiras "vêm expressas no texto constitucional e por isso denominam-se imunidades; se, por outro lado, forem objeto de disposição legal, tratar-se-á de isenção"(21).

São exemplos de imunidade tributária "instituir impostos sobre: a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros; b) templos de qualquer culto; c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais...; d) livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão" (art. 150, VI, CF).

De acordo com o art. 175 do CTN a isenção é modalidade de exclusão do crédito tributário e pode ser concedida a qualquer tributo (imposto, taxa, contribuição de melhoria etc.), ao contrário da imunidade que está adstrita aos impostos. Ainda nesse passo, o art. 184, § 5º, da Constituição Federal esclarece que "são isentas de impostos federais, estaduais e municipais as operações de transferência de imóveis desapropriados para fins de reforma agrária". Em sendo "exclusão, fácil é concluir que o crédito tributário existiu e o fato gerador ocorreu efetivamente, fazendo nascer a obrigação tributária. A isenção, podemos dizer, é a dispensa do pagamento do tributo a partir do nascimento da obrigação respectiva. Essa a posição doutrinária dominante"(22).

De outra parte, certo é que somente quem pode tributar poderá isentar, não prescindindo a isenção tributária de previsão legal (art. 150, § 6º, da CF).


4. CARACTERÍSTICAS DA COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA

4.1 Inalterabilidade

A Constituição Federal atribuiu competência tributária, por exemplo, aos Estados-membros para instituir impostos sobre "causa mortis" (art. 153, I, CF), e, à União para instituir impostos sobre importação de produtos. É fato inconteste que a alteração de competência só será admissível por meio de Emenda Constitucional, não se permitindo assim que o princípio da Federação seja abalado por modificações advindas da vontade do legislador infraconstitucional.

4.2 Indelegabilidade e Irrenunciabilidade

Com efeito, o art. 7º do CTN dispõe que a competência tributária é indelegável, o que, não obstante, inviabiliza a delegação de uma pessoa jurídica de direito público a outra, mediante convênio, as funções de arrecadar, fiscalizar, executar leis, serviços. A referida delegação compreende as garantias e os privilégios processuais (art. 7º, § 1º, do CTN), podendo ser revogada, a qualquer tempo, por ato unilateral de quem a delegou, porquanto é sempre em caráter precário.

A irrenunciabilidade, ao contrário, estabelece que "a pessoa política detentora da competência tributária não poderá renunciar a ela, no todo ou em parte"(23).

4.3 Incaducabilidade

Com efeito, a distribuição de competências insculpida na Constituição da República em momento algum fez menção, ainda que implicitamente, a um lapso temporal para o exercício da competência tributária conferida a um ente político. In casu, a doutrina de forma sucinta e clara tem reverberado o entendimento segundo o qual "o art. 8º do CTN diz que o eventual não-exercício da competência tributária não a defere a qualquer outra pessoa jurídica de Direito Público diversa daquela a quem a Constituição haja entregue referida competência"(24).

4.4 Facultatividade

A facultatividade do exercício da competência é um dos pressupostos da competência tributária, "em razão do que a falta de seu exercício não lhes afasta o direito assegurado pela Constituição, que não estabeleceu qualquer espécie de perda em razão de mera inércia legislativa"(25). Assim, o fato de a União não ter instituído o Imposto sobre Grandes Fortunas não lhe retira a faculdade de exercer a sua competência para tal, em qualquer oportunidade.

4.5 Privatividade

Em razão da titularidade de competência tributária que os entes políticos detêm por expressa determinação constitucional, por óbvio que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios gozam de privatividade para instituir, cobrar e fiscalizar o tributo de sua competência. Essa assertiva, por conseguinte, "implica a exclusividade e conseqüente proibição de seu exercício por quem não tenha sido consagrado com esse direito"(26).


5. CONFLITOS DE COMPETÊNCIA

Como já observado no item 2.2 deste trabalho, a competência tributária é matéria eminentemente constitucional, taxativa e exaustivamente prevista, de sorte que haverá conflito de competência na medida em que um ente político arvorar-se de competência alheia.

Nesse sentido, reiterando a assertiva de que todas as competências tributárias são previstas na Constituição Federal, conclui-se que "a pessoa política não pode usurpar competência tributária alheia, nem aquiescer que sua própria competência tributária venha a ser utilizada por outra pessoa política"(27). Noutros termos, pode-se "enxergar o conflito de competência como uma situação de efetivo esbulho de um direito outorgado privativamente a terceiros"(28).

Desse quadro duas situações merecem destaque, embora não se confundam com o conflito de competência, a saber: a hipótese do bis in idem e da bitributação.

5.1 Bis in idem e bitributação

A clássica diferença entre a hipótese do bis in idem e a bitributação está na particularidade de que o primeiro ocorre quando uma única pessoa política institui tributos diversos sobre o mesmo fato gerador e o mesmo contribuinte, mas pela incidência de duas normas legais distintas.

A bitributação, por seu turno, ocorre quando a dupla tributação tem origem em pessoas políticas distintas, de modo que "são duas normas, cada qual emanada de um legislativo, incidindo sobre o mesmo fato jurídico e onerando o mesmo contribuinte"(29).


6. COMPETÊNCIA RESIDUAL

É pacífico o entendimento segundo o qual a competência tributária encontra-se exaustivamente delineada na Constituição Federal. Nessa esteira de raciocínio, com fulcro nos arts. 153, 155 e 156 da Carta Política de 1988, que atribui competência tributária à União, aos Estados e ao Distrito Federal, e, por fim, aos Municípios, respectivamente, eventual "sobra, se existir algum fato econômico passível de tributação, será da competência da União"(30) (art. 154, CF).

A União, no exercício de sua competência residual, não poderá instituir impostos que figuram entre aqueles constantes no art. 153 da Constituição Federal, exigindo-se, ademais, expressa previsão em lei complementar(31) para sua instituição e cobrança, devendo ser ainda não-cumulativo e não ter base de cálculo e fato gerador próprio dos impostos já discriminados na Constituição.

Do acima articulado infere-se que a União, no exercício da competência residual, "não poderá valer-se de materialidades que tenham sido indicadas e autorizadas pelo texto constitucional para impostos de competência das demais pessoas políticas de direito público interno, sob pena de violação ao princípio federativo"(32).

De qualquer sorte, as limitações impostas ao exercício da competência residual pela União configuram-se "requisitos de técnica jurídica, e não interferem no tamanho da competência residual, mas sim no modo de utilizá-la"(33).

Por derradeiro, oportuno registrar que não somente quanto aos impostos a União poderá exercer a sua competência residual, mas, também, quanto a "contribuições sociais não incidentes sobre a folha de salários, o faturamento e o lucro (art. 195, § 4º, CF)"(34).


7. CONCLUSÃO

De todo o exposto, considerando que a tributação visa à consecução de "recursos para que o Estado possa pagar as despesas necessárias à realização das suas finalidades"(35), pode-se asseverar que a competência tributária só é atribuída às pessoas jurídicas de direito público como a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, uma vez que os tributos devem ser destinados, exclusivamente, para fins públicos e nunca particulares.

De outra parte, há de se considerar o fato de que "na tributação, o princípio da segurança jurídica como diretriz, aponta para uma direção; em seus desdobramentos aparecem os princípios da competência, da submissão da ação estatal à lei, da supremacia da Constituição, do respeito aos direitos e garantias individuais, entre outros"(36).

Impende consignar que a Constituição Federal fixa a competência em matéria tributária, deixando, não obstante, a União exercê-la de forma privativa (art. 153, CF) ou residual (art. 154, CF), que, em verdade, também é privativa quanto à titularidade do exercício, sendo residual quanto à materialidade da hipótese de incidência.

Como se pôde observar, ante a possibilidade do exercício da competência residual, "a lista de situações materiais que ensejam a incidência de impostos da União (art. 153) não é exaustiva, dado que outras situações podem ser oneradas por impostos federais"(37).

Não é demais registrar que aos impostos oriundos do exercício da competência residual da União aplicam-se as mesmas "regras relacionadas com as limitações ao poder de tributar, notadamente o princípio da estrita legalidade"(38).


8. NOTAS

1.CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 287.

2.CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 287.

3.ATALIBA, Geraldo. Sistema constitucional tributário brasileiro. São Paulo: RT, 1968, p. 8.

4.SABBAG, Maristela Miglioli. In RT. Competência tributária. São Paulo, jun. 1996, v. 728, p. 682.

5.SABBAG, Maristela Miglioli. In RT. Competência tributária. São Paulo, jun. 1996, v. 728, p. 682.

6.MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 25.

7.ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio Franco da. Manual de direito financeiro & direito tributário. 14. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 255.

8.CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 288.

9.ICHIHARA, Yoshiaki. Direito tributário. 6. ed. São Paulo: Atlas, 1994, p. 89.

10.SABBAG, Maristela Miglioli. In RT. Competência tributária.São Paulo, jun. 1996, v. 728, p. 684.

11.DECOMAIN, Pedro Roberto. Anotações ao código tributário nacional. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 44.

12.ICHIHARA, Yoshiaki. Direito tributário. 6. ed. São Paulo: Atlas, 1994, p. 32.

13.SABBAG, Maristela Miglioli. In RT. Competência tributária. São Paulo, jun. 1996, v. 728, p. 683.

14.ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio Franco da. Manual de direito financeiro & direito tributário. 14. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 259.

15.ICHIHARA, Yoshiaki. Direito tributário. 6. ed. São Paulo: Atlas, 1994, p. 90.

16.BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito constitucional. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 1990, p. 143.

17.ICHIHARA, Yoshiaki. Princípio da legalidade tributária na Constituição de 1988. São Paulo: Atlas, 1994, p. 72.

18.MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 1993, p. 185.

19.PIRES, Adilson Rodrigues. Manual de direito tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 11.

20.SABBAG, Maristela Miglioli. In RT. Competência tributária. São Paulo, jun. 1996, v. 728, p. 688.

21.SABBAG, Maristela Miglioli. In RT. Competência tributária. São Paulo, jun. 1996, v. 728, p. 688.

22.PIRES, Adilson Rodrigues. Manual de direito tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 16.

23.SABBAG, Maristela Miglioli. In RT. Competência tributária. São Paulo, jun. 1996, v. 728, p. 690.

24.DECOMAIN, Pedro Roberto. Anotações ao código tributário nacional. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 47.

25.MELO, José Eduardo Soares de. Curso de direito tributário. São Paulo: Dialética, 1997, 85.

26.MELO, José Eduardo Soares de. Curso de direito tributário. São Paulo: Dialética, 1997, 84.

27.CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 301.

28.SABBAG, Maristela Miglioli. In RT. Competência tributária. São Paulo, jun. 1996, v. 728, p. 690.

29.SABBAG, Maristela Miglioli. In RT. Competência tributária. São Paulo, jun. 1996, v. 728, p. 695.

30.ICHIHARA, Yoshiaki. Direito tributário. 6. ed. São Paulo: Atlas, 1994, p. 54.

31."Também neste particular, o constituinte quis pôr freios à multiplicação de impostos federais. A fórmula que encontrou foi justamente esta: exigir que os novos impostos só pudessem ser validamente instituídos por meio de lei complementar, ato normativo que exige quorum qualificado de aprovação" (CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 591).

32.MARQUES, Márcio Severo. Classificação constitucional dos tributos. São Paulo: Max Limonad, 2000, p. 214.

33.SILVA MARTINS, Ives Gandra da (Coord.). Curso de direito tributário. 2. ed. Belém: CEJUP, 1993, 138.

34.ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio Franco da. Manual de direito financeiro & direito tributário. 14. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 261.

35.DECOMAIN, Pedro Roberto. Anotações ao código tributário nacional. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 18.

36.ICHIHARA, Yoshiaki. Princípio da legalidade tributária na Constituição de 1988. São Paulo: Atlas, 1994, p. 69.

37.AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 95.

38.BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito financeiro e de direito tributário. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 253.


9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2000.

ATALIBA, Geraldo. Sistema constitucional tributário brasileiro. São Paulo: RT, 1968.

BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito constitucional. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 1990.

___________. Curso de direito financeiro e de direito tributário. São Paulo: Saraiva, 1991.

CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 1997.

___________. Curso de direito constitucional tributário. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 1999.

DECOMAIN, Pedro Roberto. Anotações ao código tributário nacional. São Paulo: Saraiva, 2000.

ICHIHARA, Yoshiaki. Direito tributário. 6. ed. São Paulo: Atlas, 1994.

___________. Princípio da legalidade tributária. São Paulo: Atlas, 1994.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 1993.

___________. Curso de direito tributário. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 1997.

MARQUES, Márcio Severo. Classificação constitucional dos tributos. São Paulo: Max Limonad, 2000.

MELO, José Eduardo Soares de. Curso de direito tributário. São Paulo: Dialética, 1997.

PIRES, Adilson Rodrigues. Manual de direito tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2000.

ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio Franco da. Manual de direito financeiro & direito tributário. 14. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2000.

SABBAG, Maristela Miglioli. In RT. Competência tributária. São Paulo, jun. 1996, v. 728.

SILVA MARTINS, Ives Gandra da (Coord.). Curso de direito tributário. 2. ed. Belém: CEJUP, 1993.


Autor

  • Augusto Cesar Ramos

    Augusto Cesar Ramos

    advogado, especialista em Direito e Processo do Trabalho pelo CESUSC

    é autor dos livros “Direito e Sociedade: ensaios para uma reflexão crítica” (Tubarão: UNISUL, 2001) e “Eutanásia: aspectos éticos e jurídicos da morte” (Florianópolis: OAB/SC, 2003), ex-aluno da Escola da Magistratura do Trabalho da AMATRA XII, e sócio da Casa da Cultura Jurídica e do Instituto de Direito Alternativo.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RAMOS, Augusto Cesar. Competência tributária. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 54, 1 fev. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2621. Acesso em: 29 abr. 2024.