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Comentários à Súmula 444 do STJ.

O que conta e o que não conta na fixação da pena base, no tocante aos antecedentes e à conduta social

Comentários à Súmula 444 do STJ. O que conta e o que não conta na fixação da pena base, no tocante aos antecedentes e à conduta social

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Resumo

Considerando a garantia constitucional da situação de inocência [01], insculpida no art. 5º, LVII, o Superior Tribunal de Justiça, através do Enunciado da Súmula 444, em maio de 2010, ratificou entendimento que se vinha desenvolvendo na jurisprudência, no sentido de que apenas as condenações criminais definitivas têm o condão de agravar a pena base do sentenciado. As razões de ser dessa orientação estão em que, tradicionalmente, a doutrina e a jurisprudência nacionais viam nos antecedentes e na conduta social do réu, duas das chamadas circunstâncias judiciais previstas no artigo 59, do Código Penal, o espaço para análise de procedimentos criminais em curso como fator de majoração da reprimenda penal. Este artigo discute os contornos das duas circunstâncias antes citadas e sua conformação com o entendimento recendente do STJ.

Palavras-chave: Direito Penal; Fixação da Pena; Direito Constitucional; Garantias.


1. Introdução

Em maio de 2010, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 444, cujo enunciado afirma que "É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base" [02]. Tal enunciado está em conformidade com a disposição constitucional que reflete o chamado princípio da situação jurídica de inocência, insculpido no art. 5º, LVII, da Constituição da República. De acordo com essa noção, até que transite em julgado sentença penal condenatória, eventuais procedimentos criminais instaurados e não encerrados em definitivo não podem funcionar para a majoração da pena-base, prejudicando o réu. Dessa forma, a visão tradicional da doutrina de que os antecedentes e a conduta social representam toda a vida pregressa do sentenciado e que podem ser representados por inquéritos policiais, termos circunstanciados de ocorrência e até por antecedentes infracionais precisa ser revista e remoldada.

O ponto de partida desta reconstrução da compreensão dos antecedentes e da conduta social como instrumento de dosagem da reprimenda penal está em uma revisão constitucionalmente adequada da individualização jurisdicional da pena, trazendo para o interior da discussão dogmática e da fundamentação das decisões judiciais as garantias constitucionais, especialmente a da situação jurídica inocência, que afirma a não-culpabilidade até o trânsito em julgado de sentença condenatória.

Analisando as garantias e os princípios constitucionais relativos ao Direito Penal e ao Processual Penal, Guilherme de Souza NUCCI (2010, p. 239), define situação de inocência:

No cenário penal, reputa-se inocente a pessoa não culpada, ou seja, não considerada autora de crime. Não se trata, por óbvio, de um conceito singelo de candura ou ingenuidade. O estado natural do ser humano, seguindo-se fielmente o princípio da dignidade da pessoa humana, base do Estado Democrático de Direito, é inocência. Inocente se nasce, permanecendo-se nesse estágio por toda a vida, a menos que haja o cometimento de uma infração penal e, seguindo-se os parâmetros do devido processo legal, consiga o Estado provocar a ocorrência de uma definitiva condenação criminal.

Assim, se o status jurídico de inocência apenas cede ao influxo de sentença transitada em julgado, nada mais adequado que deixar de lado na estipulação da pena, aqueles tantos fatos cuja definitividade ainda não se deu pela força da irrecorribilidade de uma decisão condenatória.

Este artigo, nas linhas que se seguem, pretende estabelecer os contornos e o alcance dos conceitos de antecedentes e de conduta social, duas das chamadas circunstâncias judiciais previstas no art. 59, do Código Penal, utilizáveis na fixação da pena-base, a fim de que se possam verificar as diferenças havidas entre o posicionamento da doutrina chamada "tradicional" e o entendimento recentemente pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça e que já vinha, de algum modo, sendo praticado pelos Tribunais.


2. Da fixação da pena: O Método Trifásico

O art. 68, do Código Penal, diz que "A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento". À vista desse dispositivo legal, evidencia-se que lei penal brasileira adotou a chamada metodologia trifásica para a individualização judicial da pena já que, primeiro, consideram-se as circunstâncias judiciais; depois as circunstâncias legais, atenuantes e agravantes; e, por fim, as causas gerais e especiais de diminuição e aumento de pena, nesta ordem.

As regras do art. 68, do Código Penal, deixam clara a adoção de um critério misto de dosimetria da pena, que nem tolhe por completo a liberdade da atividade do Magistrado, mas que também não deixa toda esta a cargo da discricionariedade do Judiciário. Assim, há elementos que são legalmente valorados e outros que devem ser sopesados pelo órgão do judiciário responsável pela sentença condenatória. Essa forma de compreender a dosagem da pena promove certo equilíbrio entre regras legais cogentes e liberdade do Magistrado, na fixação da pena.

Sobre esse sistema já disse Mario GARRIDO MONTT (2001, 306/307) que:

A pena relativamente determinada é o sistema pelo qual majoritariamente se inclina a doutrina na segunda metade do presente século XX, que requer de uma coordenada e estreita cooperação do legislador e do juiz. Ao legislador corresponde "criar um marco penal que seja o mesmo para todos os casos que se subsumam no preceito legal"; se trata de um espaço relativamente amplo dentro do qual pode fixar-se a pena para o fato singular de que se trate. Ao juiz corresponde escolher, entre as distintas alternativas estabelecidas pela lei, a pena aplicável e sua magnitude, considerando a natureza e a gravidade do fato típico (fins preventivos gerais e seu merecimento); porém ademais há de considerar a culpabilidade e condições pessoais do autor, como também a possibilidade de remissão da sanção ou a aplicação de uma medida alternativa (fins preventivos especiais e sua necessidade). O juiz conta com uma relativa discricionariedade para a determinação da pena dentro do marco legal, porém essa discricionariedade não é absoluta, deve respeitar aos princípios jurídicos que a orientam e aos fins que esta persegue (prevenção geral e especial, merecimento e necessidade da sanção). De conseguinte, o juiz há de ter presente o princípio de igualdade ao impor ao caso singular a sanção e, de outro lado, o da culpabilidade do sujeito no fato e suas condições individuais para avaliar as consequências que em sua vida futura lhe acarretará a pena, as que necessariamente têm de ser levadas em conta na regulação da sanção. [tradução livre do espanhol]

No Brasil, quanto à metodologia de individualização da pena, historicamente, atribui-se o método trifásico ao magistério de Nelson Hungria. Para ele

o art. 59 só inclui as circunstâncias judiciais, e, por isso, (...) a aplicação da pena deve ser feita em três escalas: primeiro, atendendo às circunstâncias judiciais, do artigo 59, fixará o juiz a pena-base, "tendo-se em vista, necessariamente, a pena in abstracto"; em seguida, tendo em vista as circunstâncias legais (tanto as agravantes como as atenuantes), aumentará ou diminuirá a pena fixada in concreto, ou pena-base; por último, ocorrendo causa de aumento ou diminuição de pena, o juiz as aplicará com base na pena obtida na segunda operação. (MARQUES, 2002, 295) [03]

O método trifásico pugnado por HUNGRIA enfrentava a reação de Roberto LYRA – e também do próprio José Frederico MARQUES – que tendiam a entender a fixação da pena em apenas duas fases, não em três.

Roberto Lyra preconiza outro sistema: as circunstâncias agravantes e atenuantes, examinadas conjuntamente com as do art. 59, darão ao juiz os elementos para fixar a pena-base. Em seguida, aplicar-se-ão as causas de aumento e diminuição. O procedimento usado, portanto, se desenvolve em duas fases tão-somente. (MARQUES, 2002, 295) [04]

E José Frederico MARQUES, tomando a sério a proposta de Roberto LYRA, dizia:

Não nos parece que haja necessidade de separar as circunstâncias judiciais das circunstâncias legais, no juízo que o magistrado formula ao apreciar os elementos apontados no art. 59. Em primeiro lugar, o exame em bloco das circunstâncias todas do crime é muito mais racional, e também, mais indicado para a individualização judiciária da pena. Em segundo lugar, com bem argumenta Basileu Garcia, as circunstâncias legais não estabelecem cálculo a efetuar, como sucede com as causas de aumento e diminuição de pena. (...) Não há modificação quantitativa precisa quando se reconhece a existência de uma agravante ou atenuante. Supérfluo seria, assim, separá-las das circunstâncias judiciais, para efeito do cálculo da pena entre o máximo e o mínimo cominados. (MARQUES, 2002, 296/297)

Vencida essa discussão, prevaleceu, no texto reformado após 1984, a ideia preconizada por HUNGRIA. De sorte que há a separação em três etapas diferentes, a que a doutrina convencionou chamar de pena-base (primeira fase), pena provisória (segunda fase) e pena definitiva (terceira fase).


3. Fixação da pena-base

A primeira etapa da dosimetria da reprimenda penal (privativa de liberdade e multa [05]) constitui a fixação da pena-base. Para tanto, o órgão da função jurisdicional deve ter em conta as chamadas circunstâncias judiciais, previstas no art. 59, do Código Penal, que são "fatores legais de medição da pena, ou seja, elementos que o magistrado aprecia quando da determinação judicial da sanção penal" (PRADO, 2006, 502).

Quando se fala em circunstância, em geral, refere-se a fatos que circundam o delito, sem, no entanto, fazer parte da definição típica, podendo agravar ou diminuir a pena daquela conduta realizada (SHECAIRA, 2002, 264). Ou seja, são dados que, sem atingir a caracterização da infração penal, gravitam em seu redor, promovendo modificação na sua forma de punição. As circunstâncias judiciais, muito embora assim sejam chamadas, não têm exatamente natureza de circunstância, já que somente servem para informar o órgão da função jurisdicional na dosagem da pena, sem dizer respeito, nem indiretamente, ao fato criminoso mesmo.

Sergio Salomão SHECAIRA e Alceu CORRÊA JÚNIOR já o afirmaram:

As denominadas circunstâncias judiciais não são, na verdade, "circunstâncias do crime", mas sim parâmetros que vinculam e condicionam a aplicação da pena pelo juiz, limitando assim sua discricionariedade, tendo em vista que deverá levar em consideração tais fatores no caso concreto, mormente para determinar a chamada "pena-base". (SHECAIRA, 2002, 264)

Visto este detalhe conceitual, as circunstâncias judiciais recebem essa nomenclatura por serem quesitos que, por não terem definição fechada pela legislação, servem para guiar a atividade do órgão da função jurisdicional na fixação da primeira etapa da dosimetria da pena. Essa atividade, portanto, passa a ser aberta e, em grande parte, valorativa. E, até por esta razão, acaba por possibilitar diversas compreensões acerca do alcance de cada um dos termos empregados em sua redação legal.

As circunstâncias judiciais devem ser analisadas cada uma, de maneira a que fiquem absolutamente claras as razões que levaram o Magistrado a dosar a pena em maior ou menor grau, observando a garantia constitucional da motivação das decisões judiciais, insculpida no art. 93, IX, da Constituição. No entanto, é o resultado obtido pela visão de conjunto dessas circunstâncias que deve informar a aproximação do máximo ou a aproximação do mínimo. Ou seja, embora analisadas uma a uma – fato que garante ao réu o pleno conhecimento dos motivos da majoração ou minoração de sua pena –, o que faz com que a pena-base esteja mais próxima do máximo ou do mínimo é o resultado, positiva ou negativamente valorado, do conjunto dessas circunstâncias. Se elas, tomadas em geral, forem desfavoráveis, a pena aproximar-se-á do máximo; se, do contrário, em geral, forem favoráveis, a pena deve estar mais próxima do mínimo.

E é, como já referido alhures, o art. 59, do CP, que define, pois, quais são as chamadas circunstâncias judiciais. Diz ele que:

Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime:

I - as penas aplicáveis dentre as cominadas;

II - a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos;

III - o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade;

IV - a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível.

Para o presente artigo, tendo em vista o que inspirou o entendimento fixado na Súmula 444, do STJ – ora em comento –, interessa a compreensão constitucionalmente adequada de duas dessas circunstâncias: os antecedentes e a conduta social.


4. Os antecedentes

A questão da definição dos antecedentes é tormentosa. A doutrina adrede entendia o seguinte:

Deve o julgador observar, também, os antecedentes (bons ou maus) do agente. Verifica-se a vida pregressa do réu, com base no que constar do inquérito policial (art. 6º, incisos VIII e IX, do CPP) e nos demais dados colhidos durante a instrução do processo, apurando-se se já foi envolvido em outros fatos delituosos, se é criminoso habitual, ou se sua vida anterior é isenta de ocorrências ilícitas, sendo o delito apenas um incidente esporádico. (MIRABETE, 2008, 300)

No mesmo sentido, Fernando CAPEZ (2006, 436)

2) Antecedentes: são todos os fatos da vida pregressa do agente, bons ou maus, ou seja, tudo o que ele fez antes da prática do crime. (...) Desse modo, antecedentes passaram a significar, apenas, anterior envolvimento em inquéritos policiais e processos criminais. Assim, consideram-se para fins de maus antecedentes os delitos que o condenado praticou antes do que gerou a sua condenação.

E Damásio Evangelista de JESUS [06](1995, 484):

Antecedentes são os fatos da vida pregressa do agente, sejam bons ou maus, como, p. ex.: condenações penais anteriores, absolvições penais anteriores, inquéritos arquivados, inquéritos ou ações penais trancadas por causas extintivas da punibilidade, ações penais em andamento, passagens pelo Juizado de Menores, suspensão ou perda do pátrio poder, tutela ou curatela, falência, condenação em separação judicial etc.

Nesse mesmo sentido era o magistério de Edgar Magalhães NORONHA (1987, 240), dizendo que

Os antecedentes entram como segundo elemento par ao exame. São tanto os bons como os maus, tanto os judiciais como os extrajudiciais. Aprecia-se, assim, o fato de haver o réu sido condenado anteriormente (abstraída a reincidência), de terem existido outros processos contra ele, de estar sendo processado por mais delitos etc.

Ou, nas palavras de Cezar Roberto Bitencourt

Antecedentes – Por antecedentes devem-se entender os fatos anterior praticados pelo réu, que podem ser bons ou maus. São maus antecedentes aqueles fatos que merecem reprovação da autoridade pública e que representam expressão de sua incompatibilidade para com os imperativos ético-jurídicos. (BITENCOURT, 2009, p. 627) [07]

Com esses excertos, fica evidenciado que, na opinião desses autores, os antecedentes dizem respeito a toda a vida pregressa do réu sentenciado, podendo, pois, ser bons ou maus, e envolvendo, como se viu nos trechos acima, fatores que escapam ao próprio universo normativo do direito e atingem, por outro lado, o universo valorativo da moral [08].

Entretanto, a partir de uma aplicação mais adequada da garantia da situação de inocência [09], insculpida no art. 5º, LVII, da Constituição, o entendimento tem tendido a ser outro, ao menos para boa parte da doutrina e setor considerável da jurisprudência. Mormente, a partir da edição da Súmula 444, do STJ, objeto das digressões deste texto.

Rogério GRECO (2007, 563/564), em posicionamento diametralmente oposto aos que se transcreveram anteriormente, afirma que

Os antecedentes dizem respeito ao histórico criminal do agente que não se preste para efeitos de reincidência. Entendemos que, em virtude do princípio constitucional da presunção de inocência, somente as condenações anteriores com trânsito em julgado, que não sirvam para forjar a reincidência, é que poderão ser consideradas em prejuízo do sentenciado, fazendo com que a sua pena-base comece a caminhar nos limites estabelecidos pela lei penal. (...) Se somente as condenações anteriores com trânsito em julgado , que não prestem para afirmar a reincidência, servem para conclusão dos maus antecedentes, estamos dizendo, com isso, que simples anotações na folha de antecedentes criminais (FAC) do agente, apontando inquéritos policiais ou mesmo processos penais em andamento, inclusive com condenações, mas ainda pendentes de recurso, não têm o condão de permitir com que a sua pena seja elevada.

Não é outra a opinião da jurisprudência recente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Nos autos da apelação criminal de número 1.0471.05.045464-7/001(1),que tramitou na 3ª Câmara Criminal do TJMG, com julgamento em novembro de 2006, decidiu-se que:

EMENTA: ROUBO BIQUALIFICADO TENTADO - CORRUPÇÃO DE MENORES - INOCORRÊNCIA - MAUS ANTECEDENTES - INQUÉRITOS E AÇÕES EM ANDAMENTO - EXACERBAÇÃO DA PENA BASE E REGIME PRISIONAL - INADMISSIBILIDADE - QUALIFICADORAS - PERCENTUAL MÍNIMO - POSSIBILIDADE. (...). De acordo com o princípio constitucional da não-culpabilidade (art. 5.º, LVII/CF), inquéritos e ações em andamento, por si só, não autorizam a exacerbação da pena-base ou o regime prisional a título de maus antecedentes, pois somente a coisa julgada autoriza juízo desfavorável contra o réu. (...).

E, também, o Supremo Tribunal Federal já se tinha manifestado no seguinte sentido:

HABEAS CORPUS - INJUSTIFICADA EXACERBAÇÃO DA PENA COM BASE NA MERA EXISTÊNCIA DE INQUÉRITOS OU DE PROCESSOS PENAIS AINDA EM CURSO - AUSÊNCIA DE CONDENAÇÃO PENAL IRRECORRÍVEL - PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA NÃO-CULPABILIDADE (CF, ART. 5º, LVII) - PEDIDO DEFERIDO, EM PARTE. - O princípio constitucional da não-culpabilidade, inscrito no art. 5º, LVII, da Carta Política não permite que se formule, contra o réu, juízo negativo de maus antecedentes, fundado na mera instauração de inquéritos policiais em andamento, ou na existência de processos penais em curso, ou, até mesmo, na ocorrência de condenações criminais ainda sujeitas a recurso, revelando-se arbitrária a exacerbação da pena, quando apoiada em situações processuais indefinidas, pois somente títulos penais condenatórios, revestidos da autoridade da coisa julgada, podem legitimar tratamento jurídico desfavorável ao sentenciado. Doutrina. Precedentes. (STF - 2ª Turma, HC 79966/SP, Rel. p/ Acórdão Min. Celso de Mello, j. 13.06.2000; in DJU de 29.08.2003, p. 34).

E, mesmo o próprio STJ, antes até da edição da Súmula 444, já era de opinião que:

HABEAS CORPUS. ROUBO CIRCUNSTANCIADO E RECEPTAÇÃO. NECESSIDADE DE CORRETA MOTIVAÇÃO DAS DECISÕES. DOSIMETRIA DA REPRIMENDA. CONSIDERAÇÃO DE MAUS ANTECEDENTES E PERSONALIDADE DESAJUSTADA COM BASE EM PROCESSOS EM ANDAMENTO E ATOS INFRACIONAIS. ORDEM CONCEDIDA. 1- As decisões judiciais devem ser cuidadosamente fundamentadas, principalmente na dosimetria da pena, em que se concede ao Juiz um maior arbítrio, de modo que se permita às partes o exame do exercício de tal poder. 2- Inquéritos policiais e ações penais em andamento não constituem maus antecedentes, má conduta social nem personalidade desajustada, porquanto ainda não se tem contra o réu um título executivo penal definitivo. 3- Os atos infracionais praticados durante a adolescência do acusado não podem ser considerados como geradores de antecedentes, nem de personalidade desajustada. 4- (...). (STJ, HC 81.866/DF, Quinta Turma; Relatora Ministra Jane Silva, julgamento em 25 de setembro de 2007, publicado no DJ de 15 de outubro de 2007)

Assim, uma interpretação constitucionalmente adequada do disposto no art. 59, do CP, no que tange aos antecedentes, força o reconhecimento de que só podem ser consideradas as condenações criminais transitadas em julgado, que não sirvam para a conformação da reincidência. Não fosse assim, poderia o réu, em sua sentença, ver-se prejudicado em razão de fatos supostamente criminosos com relação aos quais ainda vigora a situação de inocência, já que não julgados em definitivo.

Ainda no contexto do estabelecimento do alcance dos antecedentes, levando a sério a definição de que são aquelas condenações que não servem à caracterização da reincidência, os tribunais superiores nacionais têm entendido que aquelas condenações que já sofreram o efeito da caducidade quinquenal prevista no art. 64, do Código Penal, servem a configurar antecedentes. Assim, mesmo que, entre o cumprimento de pena anterior e o novo crime, a reincidência desapareça, aquela condenação definitiva contará para a exasperação da pena-base.

Este é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, conforme se pode ver no julgamento do HC 30.211/SP, cujo relator foi o Ministro Felix Fischer:

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. MAUS ANTECEDENTES. REINCIDÊNCIA. Decorrido mais de cinco anos, a sentença penal condenatória anterior não prevalece para efeito da reincidência (art. 64, I, do CP), subsistindo, no entanto, para efeito de maus antecedentes. Habeas corpus denegado.

E é essa, também, a orientação do Supremo Tribunal Federal, em recentíssima decisão:

EMENTA: HABEAS CORPUS. DIREITO PENAL. INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA. FIXAÇÃO DA PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CONDENAÇÕES EXTINTAS HÁ MAIS DE CINCO ANOS. MAUS ANTECEDENTES. CARACTERIZAÇÃO. PRECEDENTES. RECURSO DESPROVIDO. I - Embora o paciente não possa ser considerado reincidente, em razão do decurso do prazo de cinco anos previsto no art. 64, I, do Código Penal, a existência de condenações anteriores caracteriza maus antecedentes e demonstra a sua reprovável conduta social, o que permite a fixação da pena-base acima do mínimo legal. Precedentes. II - Recurso ordinário em habeas corpus desprovido. (RHC 106814 / MS Relator:  Min. RICARDO LEWANDOWSKI Julgado em 08 de fevereiro de 2011, pela primeira turma. Publicado em 24 de fevereiro de 2011).

Assim, tanto as condenações definitivas que não concretizem situação de reincidência, por não serem antecedidas por outra condenação irrecorrível ou que já tenham sofrido a caducidade de cinco anos, são eficientes para conformar a definição de antecedentes. Ao menos parece ser esta a opinião pacificada pelos Tribunais Superiores.


5. A Conduta Social

A terceira das circunstâncias judiciais previstas no art. 59, do CP, diz respeito à conduta social do agente. CAPEZ (2006, 438) diz que

Enquanto os antecedentes se restringem aos envolvimentos criminais do agente, a conduta social tem um alcance mais amplo, referindo-se às suas atividades relativas ao trabalho, seu relacionamento familiar e social e qualquer outra forma de comportamento dentro da sociedade.

Já Rogério GRECO afirma que

Por conduta social quer a lei traduzir o comportamento do agente perante a sociedade. Verifica-se o seu relacionamento com seus pares, procura-se descobrir o seu temperamento, se calmo ou agressivo, se possui algum vício, a exemplo de jogos ou bebidas, enfim, tenta-se saber como é seu comportamento social, que poderá ou não ter influenciado no cometimento da infração penal (2007, 564)

Ou seja, quando se fala em comportamento social (ou inserção social, como prefere Guilherme de Souza NUCCI (2005, 201)) o que se tem em vista é a relação do réu com seu ambiente social. E comportamento, como diz o Código, pressupõe a externação da personalidade. Conduta social, pois, tem a ver modo de comportar-se no espaço social ocupado pelo agente; tem a ver com seu "comportamento (...) nos papéis de pai/mãe, marido/esposa, filho, aluno, membro da comunidade, profissional, cidadão, etc." (FERREIRA apud SANTOS, 2011, p. 311), "se foi um homem voltado ao trabalho, probo, caridoso, altruísta, cumpridor dos deveres, ou se transcorreu os seus dias ociosamente, exercendo atividades parasitárias ou antissociais" (COSTA JÚNIOR, 2010, p. 245). E é interessante refletir que o órgão da função jurisdicional deve levar em conta o ambiente social em que vive o réu, não um espaço social ideal – ou ideado pelo Magistrado. E Ney Moura TELES é incisivo nesse sentido:

O juiz deve verificar a integração do condenado no meio social em que ele vive, e não no meio social que o juiz considera adequado. Deve verificar se seu comportamento é compatível com o aceito no ambiente de seu estrato social, por exemplo, na favela, com todas as suas características. Se, em seu meio, o condenado cumpre seus deveres, suas obrigações sociais, respeita os valores ali cultivados, convive harmoniosamente com seus pares, tal circunstância lhe será favorável, militará em seu favor, beneficiando-o com pena-base próxima do mínimo (2006, 365).

De sorte que, levando a sério a ideia de que cada caso é um caso diferente e que tem peculiaridades que são próprias – inclusive no que toca a levar a sério as particularidades do sujeito –, ensejando uma análise completa de sua conformação para dar a solução adequada a ele, conhecer a realidade social do indivíduo que se sentencia é algo de primeira necessidade para o Magistrado. Não pode o comportamento do réu em seu entorno social ser relegado, portanto, a mera figura de retórica vazia na sentença [10].

Visto isso, cumpre mencionar que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, cotejando os conceitos de antecedentes e de conduta social, tal qual se faz ao longo desta exposição, integralizou esse último com processos e inquéritos em. Quer dizer, embora reconheça o TJMG que para a conformação dos antecedentes haja a necessidade de sentenças transitadas em julgado, que não produzam reincidência, o mesmo tribunal já manifestou entendimento de que os mais dados relativos a processos e inquéritos possam servir para conformar mau comportamento social.

Veja-se isso, por exemplo, nos autos da apelação criminal 1.0112.07.070229-8/001(1), que tramitou perante a Terceira Câmara Criminal, tendo sido relator o Desembargador Antônio Carlos Cruvinel. Em seu voto, disse ele que:

Inconformado com a sentença de fls. 94/101, que condenou o apelado nas sanções do artigo 33, caput, c/c o § 4º, da Lei 11.343/06, às penas de 02 (dois) anos de reclusão, a ser cumprida em regime fechado, e 200 (duzentos) dias-multa, fixado o dia-multa em 1/30 do salário-mínimo vigente ao tempo do fato, interpõe o apelante acima nominado o presente recurso.

Nas razões de fls. 102/110, sustenta-se, que a pena do apelado foi equivocadamente reduzida em 2/3, porquanto consta da Certidão de Antecedentes do mesmo "..além de inúmeros procedimentos baixados, uma instrução criminal para apuração de delito de roubo majorado pelo concurso de agentes (...) e dois inquéritos..."; que a expressão maus antecedentes "...abrange a existência de inquéritos e de outros processos criminais em face do réu"; que o § 4º, do artigo 33, da Lei 11.343/06, é enfático ao exigir que o acusado possua bons antecedentes, não se dedique a atividade criminosa, dentre outros, requerendo por fim o decote da redução prevista pelo § 4º, do artigo 33, da Lei 11.343/06.

(...)

Antecedentes são os fatos da vida pregressa do denunciado que possam interessar para que se avalie a sua conduta social e a sua personalidade, ligando tudo isso subjetivamente o crime.

Em outros julgados, no entanto, entendeu o mesmo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, na esteira da compreensão que fundamenta a exclusão de sentenças não transitadas em julgado para configurar os maus antecedentes, que também o mau comportamento social não se pode verificar a partir de processos e inquéritos em curso, também em respeito à garantia da situação de inocência. Veja-se:

DIREITO PENAL - FURTO QUALIFICADO - ANTECEDENTES - INQUÉRITOS E PROCESSOS EM ANDAMENTO - CONDUTA SOCIAL - PENA DE MULTA - PROPORCIONALIDADE COM A PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE - CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL RETRATADA EM JUÍZO - ATENUANTE - FIXAÇÃO DAS PENAS - REGIME PRISIONAL E SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. I - Inquéritos e processos criminais em andamento nãopodem macular o réu como portador de maus antecedentes, em respeito ao princípio da não-culpabilidade. II - Conduta social "é o pap el do réu na comunidade, inserido no contexto da família, do trabalho, da escola, da vizinhança etc" (NUCCI), não se podendo fazer um juízo de reprovação de tal circunstância judicial com base na existência de inquéritos e processos criminais em andamento. (...) . (APELAÇÃO CRIMINAL N° 1.0040.07.062772-0/001 - COMARCA DE ARAXÁ - APELANTE(S): MARCIO BATISTA NEIVA, CLÉBIO BARBOSA NETO - APELADO(A)(S): MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADO MINAS GERAIS - RELATOR: EXMO. SR. DES. ADILSON LAMOUNIER)

No mesmo sentido a jurisprudência do STJ:

HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO SIMPLES TENTADO. NECESSIDADE DE MOTIVAÇÃO DAS DECISÕES. DOSIMETRIA DA REPRIMENDA. CONSIDERAÇÃO DE MAUS ANTECEDENTES COM BASE EM PROCESSOS INSTAURADOS SEM DECISÃO TRANSITADA EM JULGADO. EQUIVOCADOS ANTECEDENTES TAMBÉM CONSIDERADOS COMO MÁ CONDUTA SOCIAL. INVERSÃO DAS FASES DA DOSIMETRIA FAVORÁVEL AO RÉU. AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO NO QUE SE REFERE À PROPORÇÃO TOMADA NA REDUÇÃO DA PENA PELA TENTATIVA. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. 1- As decisões judiciais devem ser cuidadosamente fundamentadas, principalmente na dosimetria da pena, em que se concede ao Juiz um maior arbítrio, de modo que se permita às partes o exame do exercício de tal poder. 2- Inquéritos policiais e ações penais em andamento não constituem maus antecedentes, má conduta social nem personalidade desajustada, porquanto ainda não se tem contra o réu um título executivo penal definitivo. 3- O método trifásico deve ser rigorosamente obedecido, posto que resulta de disposição legal, mas se é feita inversão das suas fases e ela resulta em favor do réu, sem recurso da acusação, deve ser mantida. (...) . (HC 81726 / GO HABEAS CORPUS 2007/0089791-1 – 5ª Turma – Ministra Jane Silva)

Entretanto, o mesmo STJ, em julgamento anterior, havia reconhecido a possibilidade de que processo em que havia sido reconhecida a prescrição da pretensão punitiva retroativa (ou seja, sem sentença condenatória irrecorrível), servisse como indicativo de má conduta social do réu:

CRIMINAL. RESP. ESTELIONATO. CONTINUIDADE DELITIVA. SEPARAÇÃO DE PROCESSOS. OBJETIVO DE EVITAR TUMULTO E DIFICULDADE NA INSTRUÇÃO. PERTINÊNCIA PARA FINS DE APLICAÇÃO DE PENA. PREJUÍZO À DEFESA NÃO EVIDENCIADO. RECONHECIMENTO PELO JUÍZO DA EXECUÇÃO. POSSIBILIDADE. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. PROCESSO COM PENA PRESCRITA. CONSIDERAÇÃO COMO MÁ CONDUTA SOCIAL. FRAUDE IDÔNEA À CONFIGURAÇÃO DO DELITO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 07/STJ. NÃO CONHECIMENTO. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E DESPROVIDO. (...) IV - Improcedente a alegação de excesso de pena pelo reconhecimento de circunstâncias inexistentes no art. 59 do CP, se o processo no qual se reconheceu a prescrição retroativa não foi considerado à título de maus antecedentes criminais, como alegado nas razões recursais, mas configurador de má conduta social. V - Não se conhece de alegações referentes à inexistência de fraude idônea à configuração do delito, se evidenciado que o exame das questões levantadas no recurso ensejaria verdadeira reapreciação do material cognitivo e incursão na seara fático-probatória. Incidência da Súmula n.º 07/STJ. VI - Recurso parcialmente conhecido e desprovido. (REsp 623073 RS RECURSO ESPECIAL 2004/0008994-4 – Quinta Turma – Ministro Gilson Dipp)

Em suma, os dissídios doutrinários e jurisprudenciais sobre o entendimento do que seja, efetivamente, a má conduta social persistem. No entanto, a transformação no entendimento do STJ – e também de outros tribunais – aponta no sentido de que o que não pode estar contido nessa circunstância está plenamente claro. Assim, parece que, na jurisprudência nacional, o conceito de conduta social tem sido formado por exclusão. Ou seja, por ser tarefa difícil especificar todas as situações que importem em mau ou bom comportamento social, os julgados recentes dos tribunais superiores são no sentido de excluir, caso a caso, determinados eventos. Veja-se o exemplo abaixo retirado de recente julgado do Superior Tribunal de Justiça:

HOMICÍDIO QUALIFICADO. DOSIMETRIA. FIXAÇÃO ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CULPABILIDADE. CONSIDERAÇÃO DAQUELA PRÓPRIA DO TIPO. INVIABILIDADE. AÇÃO PENAL SEM CERTIFICAÇÃO DO TRÂNSITO EM JULGADO. SOPESAMENTO NA PRIMEIRA ETAPA DA DOSIMETRIA COMO MAUS ANTECEDENTES. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. SÚMULA 444 DESTE STJ. CONDUTA SOCIAL E PERSONALIDADE. DESEMPREGO. ARGUMENTO INIDÔNEO. DESFAVORABILIDADE DAS CIRCUNSTÂNCIAS DO DELITO. ELEMENTOS CONCRETOS. CONSTRANGIMENTO EM PARTE EVIDENCIADO. SANÇÃO REDIMENSIONADA. FIXAÇÃO DA REPRIMENDA NO MÍNIMO LEGAL. DESCABIMENTO. ORDEM CONCEDIDA EM PARTE. 1.(...) 2. Consoante orientação já sedimentada nesta Corte Superior, inquéritos policiais ou ações penais sem certificação do trânsito em julgado não podem ser levados à consideração de maus antecedentes para a elevação da pena-base, em obediência ao princípio da presunção de não-culpabilidade. Exegese da Súmula 444 deste STJ. 3. O fato de o paciente não trabalhar, por si só, não evidencia a negatividade das circunstâncias judiciais da conduta social e da personalidade, tendo em vista que a falta de emprego, diante da realidade social brasileira, é infortúnio, e não algo tencionado. 4. (...). (STJ, HC 120.154/MS, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 16/12/2010, DJe 01/02/2011)

Importa, por fim, deixar claro que, por conta do texto expresso da Súmula 444, do STJ, deixou-se de avaliar, neste artigo, a possibilidade de a conduta social funcionar como fato de minoração da reprimenda penal. Não se pode olvidar que, diferentemente dos antecedentes, que representam algo que piora a condição do réu na dosagem da pena, a avaliação adequada das condições sociais de comportamento do réu nem sempre lhe são desfavorável. Por sinal, haverá vezes em que esse comportamento, por ser socialmente adequado, servirá como fator de minoração da reprimenda penal, em uma individualização judicial que reconheça na pessoa do réu elementos positivos.


Conclusões

Após todo o exposto, vê-se, que, observando as garantias constitucionais relativas ao direito penal, a orientação da jurisprudência dos tribunais superiores brasileiros, em especial aquela concretizada no enunciado da Súmula 444, do STJ, encaminharam-se no sentido de excluir da avaliação, em prejuízo do réu, na fixação da pena base, processos e procedimentos criminais, salvo aqueles em que já tenha havido sentença condenatória irrecorrível.

Desta forma, afasta-se do recente entendimento jurisprudencial aquelas noções da doutrina penal nacional que tornava toda a vida pregressa réu elemento suficiente para caracterizar os antecedentes e a conduta social, como duas das circunstâncias judiciais, a ser avaliadas quando da fixação da pena-base, no método trifásico de individualização judicial da pena.

Assim, no conceito de antecedentes, apenas se podem incluir condenações definitivas que não sirvam para caracterizar a reincidência, seja porque não há condenação definitiva anterior seja porque já houve o efeito da caducidade quinquenal, conforme prevista no art. 64, do Código Penal. Processos criminais em curso, boletins de ocorrência, termos circunstanciados de ocorrência, antecedentes infracionais, e coisas que equivalham a estas, não podem majorar a reprimenda penal do réu.

Já, por seu turno, no comportamento social, que é um conceito certamente eticizado, apenas se podem conter dados relativos à atuação do sujeito em seu ambiente social, não podendo, também, aí, encontrarem-se aqueles mesmos procedimentos criminais, conforme citado anteriormente.

Vê-se, por fim, a constitucionalização do Direito Penal, algo que um direito de matriz pós-convencional, fundamento no poder comunicativo democrático, precisa, de fato, revelar.


Referências

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Notas

  1. No presente estudo, prefere-se a utilização do termo "situação" de inocência em lugar de "presunção" de inocência em razão de estar de acordo com a idéia de que a garantia não concretiza uma presunção, mas uma situação jurídica de inocência. Para maiores informações acerca dessa postura conceitual, veja-se Paulo RANGEL, em seu Processo Penal (vide referências).
  2. Data da Decisão, 28/04/2010. DJE 13/05/2010, RSTJ VOL.: 00218, PG:00712
  3. José Frederico Marques faz referência direta ao texto de Nelson Hungria: Novas questões jurídico-penais, páginas de 145 a 172.
  4. José Frederico Marques aponta para os Comentários ao Código Penal, de Roberto Lyra, vol. II, páginas de 167 a 175.
  5. Já que, na sistemática do Código Penal, as restritivas de direitos são sempre substitutivas da Pena Privativa de Liberdade.
  6. No mesmo sentido de Francisco Dirceu BARROS (2006, 342), que afirmou que os antecedentes são os fatos bons ou maus da vida pregressa do autor do crime.
  7. Interessante mencionar que, na edição de 2009 do volume 1 de seu Tratado de Direito Penal, Bitencourt revê sua posição acerca dos antecedentes para acompanhar a noção desenvolvida a seguir de "somente podem ser valoradas como "maus antecedentes" decisões condenatórias irrecorríveis." (BITENCOURT, 2009, p. 628)
  8. Sobre essa discussão sobre a inversão jurídico-moral do direito penal, vejam-se os estudos do Prof. Lúcio Antônio Chamon Júnior, em seu CHAMON JÚNIOR, Lúcio Antônio. Teoria Geral do Direito Moderno: por uma reconstrução crítico-discursiva na alta modernidade. Rio de Janeiro : Lumen Juris, 2006.
  9. Compartilhamos a opinião de Paulo RANGEL (vide referências) de que a situação de inocência não se enquadra na definição jurídica de presunção. Preferimos, por isso – mais que por uma questão meramente semântica – a utilização de situação ou estado de inocência.
  10. Somos da opinião de que é necessário levar-se em conta informações relativas ao sujeito que pratica o crime e não somente relativas ao fato criminoso, objetivamente considerado. Isso não importa naquilo que a doutrina chama de Direito Penal de autor e que é, quase sempre, defenestrado pelos juristas nacionais. Neste artigo, leva-se a sério a ideia de se repessoalizar o direito, a partir de um reconhecimento constitucionalmente adequado da dignidade presente na pessoa humana. Contra essa tese, veja-se a opinião do Prof. Tulio Vianna e da Profa. Geovana Mattos, externada em seu artigo "A inconstitucionalidade da conduta social e personalidade do agente como critérios de fixação da pena" (vide referências), bem como o pensamento do Prof. Juarez Cirino dos Santos, em seu Direito Penal: Parte Geral. (vide referências).

Autor

  • André de Abreu Costa

    André de Abreu Costa

    Graduado pela Universidade Federal de Ouro Preto/MG. Mestre em Teoria do Direito pela PUC-Minas.Professor de Direito no Instituto Metodista Izabela Hendrix. Professor de Direito da Faculdade de Pedro Leopoldo. Professor da pós graduação em Direito Público da UNIFEMM. Advogado

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COSTA, André de Abreu. Comentários à Súmula 444 do STJ. O que conta e o que não conta na fixação da pena base, no tocante aos antecedentes e à conduta social. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2844, 15 abr. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18908. Acesso em: 3 maio 2024.