Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/18098
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

A construção de sujeitos sociais.

A educação das crianças no Movimento dos Sem Terra

A construção de sujeitos sociais. A educação das crianças no Movimento dos Sem Terra

Publicado em . Elaborado em .

"Caminhando e cantando

E seguindo a canção

Somos todos iguais

Braços dados ou não

Nas escolas, nas ruas

Campos, construções

Caminhando e cantando

E seguindo a canção..."

Geraldo Vandré

RESUMO

O presente trabalho de conclusão possui como área de concentração o Direito Constitucional, Sociologia Rural e Sociologia da Educação. A escolha do tema foi motivada pelo interesse em discutir a educação da criança, integrante de um movimento social, especificamente, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra. Compreender a Educação no Movimento e o seu processo educativo são fundamentais para entender a forma, como esses sujeitos, adquirem emancipação social. O objetivo foi analisar de que forma o MST se propõe a oferecer às crianças o acesso à educação, discutindo se a educação oferecida promove o pleno desenvolvimento do indivíduo enquanto sujeito da sua própria experiência. Como hipótese analisou-se que o processo educativo adotado pelo MST contribui para a formação e a emancipação social. Este processo é significativo, ou seja, reconheçe a história particular de cada criança e, também, do grupo social, cujo objetivo é a construção de um coletivo, que atenda as necessidades de cada uma das crianças. A educação chama a atenção para uma nova conjuntura globalizada, pois amplia a necessidade por conhecimento e pela libertação social, especialmente das massas menos favorecidas. O primeiro capítulo considera os aspectos históricos da educação, evidenciando que o ensino no Brasil estava sob responsabilidade das ordens religiosas até a metade do século XVIII e que apenas uma pequena minoria tinha acesso a educação, acesso este que, desde os seus primórdios, nunca foi igualitário. Destacando também o direito à educação no Brasil através de suas constituições. Abordou-se também, o direito da criança à educação, segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente, reconhecendo as crianças como categoria social diferenciada. No segundo capítulo destacou-se a origem dos Movimentos sociais, especialmente o MST. Os movimentos sociais referem-se a ação dos homens na história, a qual envolve um fazer e um pensar coletivo, por meio de um conjunto de idéias que motivam e dão fundamento à ação. Também abordou-se a evolução do Movimento Sem Terra e a luta pela escola e evidencio-se que a relação do MST, com a educação é uma relação baseada na luta e na busca da cidadania e da humanização do sujeito. No terceiro capítulo abordou-se o processo pedagógico do movimento como formador de sujeitos socias. Discutindo a pedagogia diferenciada utilizada no Movimento. Abordou-se também a educação libertadora e os Direitos Humanos como instrumentos de emancipação social e que os direitos humanos, procuram proteger o individuo, independente de seu país, grau de desenvolvimento da sociedade em que vive ou sua própria condição social. Evidenciando-se que para compreender o que significam os direitos humanos, basta saber que, tais direitos correspondem às necessidades essenciais para a pessoa humana, necessidades que são iguais para todos os seres humanos e que devem ser atendidas para que a pessoa possa viver com dignidade. Por último, destacou-se o papel da luta social como princípio educativo, evidenciando que os sem terra se educam no próprio contexto do movimento e sua atuação desencadeia uma identidade que é lhe própria, fecunda e desafiadora.

Palavras-chave: Movimento dos Sem Terra. Educação. Direitos Humanos.


ABSTRACT

The present conclusion work has as concentration area the Contitutional Law, The Rural Sociology and the Educational Sociology. The theme chosen was raised by the interest in discussing the education of a child belonging to a social movement, more specifically the Landless workers’ movement. Comprehending that the education in the movement and the educational process are fundamental to understand the way how theses ones obtain social emancipation, becoming subjects. The aim was to analyze how the Landless workers’ movement (LWM) offer the children an approach to education, discussing if the offered education promotes the complete development of the individual while subject of his own experience. It was pointed out as hypothesis that the educational process adopted by the LWM contributes to the formation and to the social emancipation.This process is significative,in other words, it recognizes the particular history of each child and,also,of the social group, whose purpose is the construction of a collective that takes into account the needs of each one of the children. The education calls the attention for a new conjuncture, because it increases the need for knowledge and for social liberation, especially of the least favored crowds.The first chapter considers the historical aspects of education, showing that the teaching in Brazil was under the responsibility of religious orders until half of the century XVIII and that only a small minority had access to education, this access which, since their beginnings,never was egalitarian.The right to education in Brazil through its Constitutions was also contrasted.The child’s right to education according to the Statute of the Child and Adolescent was also approached, recognizing the children as differentiated social category. In the second chapter,the origin of social movements, specially the LWM was pointed out.The social movements refers to the action of men in history, which involves a do and a collective thinking, by means of a set of ideas that motivate and give grounds for the action.The development of the Landless Movement and the fight for school were discussed and it was evidenced that the LWM relation with the education is a relation based on fight, in search for citizenship and for the subject humanization. In the third chapter, the pedagogical process of the movement as a former of social subjects was studied, discussing the differentiated pedagogy used in the movement. It was about the liberating education and the Human Rights as instruments of social emancipation,since the Human Rights must protect the individual independent of his country, degree of development of the society where he lives or his own social condition.It was evidenced that to comprehend the meaning of the Human Rights,it is necessary to know that such rights correspond to the essential needs of the human person,needs that are equal for all human beings and that must be carried out in order that the person can live with dignity.Finally, the role of the social fight as educational principle was highlighted, evidencing that the landless educate themselves in the context of the movement itself and their activity initiates na identity that is personal, productive and challenging.

Key Words: Landless Workers’ Movement. Education.


1 INTRODUÇÃO

O presente estudo trouxe à discussão a questão da emancipação social da criança acampada, através da educação nos movimentos sociais, especificamente, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra. Neste sentido, este estudo tem o fito de verificar de que forma o processo pedagógico adotado pelo movimento contribui para a formação desses sujeitos sociais, eis que desde a criação do movimento, na década de 80, encontram-se comprometidos com a transformação e a emancipação social das crianças.

A delimitação do tema questiona a educação da criança acampada, no Movimento dos Sem Terra aliado à emancipação social do sujeito e os vínculos com os Direitos Humanos. Esta investigação, assim, teve como problema de pesquisa questionar em que medida o processo pedagógico adotado pelo MST contribui para a formação da criança enquanto sujeito social.

Destarte, a hipótese levantada para tal problema foi a de que o processo pedagógico adotado pelo MST contribui para a formação de sujeitos sociais comprometidos com a transformação e a emancipação social. Este processo é significativo, ou seja, reconhece a história particular de cada criança e, também, do grupo social, cujo objetivo é a construção de um projeto coletivo.

Como objetivo geral do estudo, busca-se analisar de que forma o MST se propõe a oferecer às crianças o acesso à educação de forma adequada, discutindo se a educação oferecida promove o pleno desenvolvimento do indivíduo enquanto sujeito da sua própria experiência.

A justificativa inicialmente considerada é a de que o tema proposto é de suma importância na medida em que a educação constitui-se em tema fundamental. Assim, refletir sobre o acesso à ela é refletir sobra a real efetivação desse direito. A educação chama a atenção nessa conjuntura globalizada, pois amplia a necessidade por conhecimento e pela libertação social, especialmente dos menos favorecidos. Neste sentido, esta pesquisa tem como finalidade fazer uma reflexão acerca da educação no movimento "sem terra", bem como o acesso a ela. O presente estudo, desta forma, garante a sua importância pois se destina a discutir a herança educacional que o MST deixará para seus integrantes, bem como para seus descendentes.

Como método de abordagem optou-se pelo método dedutivo que busca, a partir de pressupostos gerais chegar a conclusões de caráter particular. Como método de procedimento utilizou-se a pesquisa bibliográfica que se preocupa em explicar a temática abordada através de referenciais e marcos teóricos publicados em documentos, livros, textos e doutrinas.

O presente trabalho foi estruturado em cinco seções, incluindo esta seção introdutória e a seção conclusiva do trabalho. Na segunda seção trata-se da história da educação e sua evolução no Brasil e da análise da historicidade da educação brasileira desde a época do Brasil império até aos dias atuais. Demonstram-se aí os fatos mais importantes dessa evolução até chegarmos a positivação destes na legislação pátria.

Após, referem-se os direitos da criança, destacando-se que durante toda a história nunca foi vista como um ser humano ou como um cidadão completo. Posteriormente, são abordadas as questões sobre a gênese da Declaração Universal dos Direitos da Criança, e da criação, no Brasil, do Estatuto da Criança e do Adolescente, legislação que reconhece as crianças como sujeitos de direitos, destacando que a educação do futuro deverá ser o ensino primeiro e universal.

Na terceira seção trata-se dos movimentos sociais, especificamente o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra. Primeiramente aborda-se a origem do movimento e o significado de sua criação, no sentido de que o MST é o mais importante movimento social no Brasil contemporâneo, pois é o que apresenta maior grau de articulação interna. Após, trata-se da evolução do movimento e da luta pela escola, demonstrando que a relação do MST com a educação é uma relação baseada na luta e na busca pela cidadania, eis que o direito coloca a educação no terreno dos grandes valores da vida e da formação humana. Ainda, procura-se enfatizar que o movimento dos sem terra, acredita no poder da força comunitária para construir a história do campo. O estudo, também, procura demonstrar de forma sucinta, a criação da primeira escola no campo, fundada pelo MST.

Na quarta seção dedica-se ao estudo mais aprofundado do processo pedagógico do movimento como formador de sujeitos sociais, feita através da pedagogia diferenciada, utilizada no movimento como prática de ensino no movimento. É caracterizada a pedagogia e a escola como instrumentos necessários para a transmissão de conhecimentos e formação social. Posteriormente, aborda-se a luta social como princípio educativo, eis que o papel da coletividade exerce influência no contexto educativo, no interior do movimento social, levando à constituição da "identidade sem terra" nas pessoas e para além delas.

Por fim, em seção conclusiva, faz-se uma análise dos pontos importantes abordados durante todo o trabalho, agrupando as idéias centrais e discutindo os resultados obtidos com a pesquisa.


2 ANÁLISE HISTÓRICA DA EDUCAÇÃO

Fazer uma análise sobre a história da educação, exige uma profunda reflexão. Neste sentido, explica Rayo (1998) que a partir da teoria, da experiência e da prática, responde-se a uma nova forma de pensar o mundo e seus valores; a desaprender os valores de uma cultura que nem sempre respondeu à solidariedade, à justiça e a tolerância.

2.1 A Evolução da Educação no Brasil

O ensino no Brasil estava sob a responsabilidade das ordens religiosas até a metade do século XVIII, sendo que na época da escravidão, apenas uma pequena minoria tinha acesso à educação, acesso este que, desde os seus primórdios, nunca foi igualitário.

A renascença foi prolífica em tratados sobre educação. Os do primeiro período reeditam as idéias de Platão, Aristóteles e Quintiliano: o fim da educação é produzir o homem perfeito, capaz de compartilhar plenamente das atividades sociais. O ideal de homem educado era procurado entre os vultos céleres da antiguidade: Demóstines, Aristóteles, César, Plínio e, sobretudo, Cícero. (COOMAN;PEETERS,1967, p.59)

Destaque-se o interesse pela educação durante a época do renascimento: educar tornava-se uma questão de moda e uma exigência, principalmente pela proliferação de colégios e manuais para alunos. Neste sentido, Aranha (2007, p.125) afirma que,

[...] enquanto os mais ricos ou da alta nobreza continuavam a ser educados por preceptores em seus próprios castelos, a pequena nobreza e a burguesia também queriam educar seus filhos e os encaminhavam para a escola, na esperança de melhor prepará-los para a liderança e a administração da politica e dos negócios. Já os interesses de segmentos populares, em geral, não eram levados em conta, restringindo-se a aprendizagem de ofício.

A direta influência da reforma foi decisiva para o estado criar escolas públicas, baseando-se na concepção de que cada cidadão deveria saber ler, a fim de poder interpretar as sagradas escrituras. Segundo Comman e Peeters (1967, p. 65) o conceito de educação mudou e deve-se à reforma protestante a idéia moderna da educação popular e a secularização do controle exercido sobre as escolas.

A Companhia de Jesus exerceu forte influência na história da educação brasileira, já que seu objetivo era o de catequizar, sendo o ensino jesuítico voltado às humanidades. Neste sentido, acrescenta Aranha (2007, p.127) que a "ordem jesuítica estabelecia uma rígida disciplina militar e tinha como objetivo inicial a propagação missionária da fé, a luta contra os infiéis e os heréticos." Para tanto, os jesuítas se espalharam pelo mundo, desde a Europa até a Ásia, África e América. No período que os jesuítas chegaram ao Brasil, avançava na Europa a marcha da reforma e da contra-reforma protestante.

Os jesuítas se consagraram pelo empenho na formação religiosa, intelectual e moral das crianças e dos jovens. Para tanto, instauraram rígida disciplina aplicada nos internatos para garantir proteção e vigilância. Aranha ( 2007, p. 190) afirma que "no século XVIII, por volta de 1759, após 200 anos de ação pedagógica jesuítica, o primeiro ministro de Portugal, Marquês de Pombal, expulsou os jesuítas do reino e de seus domínios, inclusive do Brasil." O mesmo aconteceu mais tarde em outros países, até que em 1773, o Papa Clemente XIV extinguiu a Companhia de Jesus. Restabelecida a Companhia em 1814, esta continuou a sofrer inúmeras perseguições durante o século XIX. Aranha (2007. p.191) fala que,

Após a expulsão dos jesuítas, os bens dos padres foram confiscados, muitos livros e manuscritos importantes destruídos. Segundo alguns historiadores, de início o desmantelamento da estrutura educacional montada pela Companhia de jesus foi prejudicial porque, de imediato, não se substituiu o ensino regular por outra organização, enquanto os índios, entregues à sua própria sorte, abandonaram as missões.

Destaque-se que no ano de 1772 teria sido implantado o ensino público oficial. Segundo Aranha (2007, p. 191), "a coroa nomeou professores, estabeleceu planos de estudo e inspeção, modificou o curso de humanidades, típico do ensino jesuítico, para o sistema de aulas régias de disciplinas isoladas, como ocorria na metrópole."

Conforme a historiografia tradicional, o Marquês de Pombal não obteve êxito ao tentar introduzir de imediato as inovações de sua reforma no Brasil. Segundo Piletti; Peletti (1997, p. 137) "Sebastião José de Carvalho e Melo, o Marquês de Pombal, foi o primeiro-ministro de Portugal, de 1750 a 1777." Em seu governo, desmantelou a estrutura jesuítica de Portugal e de todos os seus domínios. Pombal declarou rompimento de Portugal com a Companhia de Jesus, pois alegava intenções de opor-se ao controle do governo português. Desta maneira acabou provocando o retrocesso de todo o sistema educacional brasileiro, já que no Brasil os Jesuítas integraram-se desde, o início à política colonizadora do rei de Portugal e foram responsáveis quase que exclusivamente, pela educação brasileira durante um longo período.

A reforma pombalina criada por Pombal, tinha como objetivo formar uma educação útil aos fins do Estado, que organizasse a escola de maneira que, antes de servir aos interesses da igreja, servisse aos imperativos da colônia. Piletti e Piletti, (1997, p. 137) apontam que foram criadas as aulas régias de latim, grego e retórica, que nem de longe chegaram a substituir o eficiente sistema de ensino organizado pela Companhia de Jesus.

Destaque-se que o Brasil sofreu várias influências no campo da educação e faz-se importante comentar que uma delas foi o Iluminismo. Este exerceu influência sobre a colônia, pois as idéias que circulavam em Portugal por meio dos intelectuais, também tiveram sua divulgação no Brasil. Para Guirardelli (2001), os reflexos e efeitos do Iluminismo e da Revolução Francesa brilharam e tornaram-se precursores do direito à educação.

Os iluministas propagavam a idéia de que a educação era promotora do desenvolvimento da sociedade e do progresso humano, tendo papel fundamental nestas transformações. (ARANHA, 2007, p. 192). Esta atuação dava-se não só pela atuação dos formados pela universidade de Coimbra, mas pela difusão de obras iluministas recomendadas por Pombal e, também, as que foram por ele condenadas. Para Aranha ( 2007, p. 192),

Já no final do século XVIII, em 1798, o bispo Azeredo Coutinho abriu o seminário de Olinda, em Pernambuco, sob a inspiração das idéias iluministas que absorvera como aluno da Universidade de Coimbra. Nesse seminário, destinado à formação de padres educadores, deu-se destaque ao ensino das ciências, das línguas vivas e da literatura moderna. Cuidou-se também de uma nova metodologia de ensino, distinta daquela tradicional baseada em castigos físicos e na memorização.

Durante o século XVIII, permanecia o contraste entre o Brasil e a Europa. O Brasil continuava com a sua aristocracia agrária escravista e a economia agroexportadora era submetida à política colonial da opressão. No panorama da educação, mantinha-se o analfabetismo e o ensino precário. Com a vinda da Família Real Portuguesa para o Brasil em 1808 e com a Independência em 1822, a educação passou a ser preocupação fundamental do governo, todavia apenas para a elite dirigente do país. Segundo Piletti e Piletti (1997, p. 145) ,

Ao invés de procurar montar um sistema nacional de ensino, integrado em todos os seus graus e modalidades, as autoridades preocuparam-se mais em criar algumas escolas superiores e em regulamentar as vias de acesso a seus cursos, especialmente, através do curso secundário e dos exames de ingresso aos estudos de nível superior.

O problema da educação pública foi inaugurado pela Constituinte de 1823, pelo Imperador Dom Pedro I. Nela o imperador afirmava que: "[...] tenho promovido os estudos públicos, quanto é possível, porém, necessita-se de uma legislação especial." (FAVERO, 1996, p.36). Deste modo, refere o autor que Dom Pedro I aludia ao Colégio das Educandas, uma escola fundada por ele e que tinha a finalidade de ministrar educação para moças. A principal preocupação do governo era a formação da elite dirigente, o que levou o governo a concentrar seu apoio ao ensino secundário e superior.

Durante esta época, as elites não só enviavam seus filhos aos colégios particulares como, também, se utilizavam do poder do estado para criar em benefício próprio uma rede de ensino público para o atendimento de seus filhos. Monacorda (2006) explica que, para a criança pobre, existiam poucas e precárias escolas, localizadas no interior do país, onde os professores não possuiam sequer formação profissional. O Brasil, neste período, era uma sociedade exclusivamente agrária, que não exigia do cidadão muitos conhecimentos e os trabalhos manuais ficavam a cargo de escravos.

O estado esforçava-se para oferecer escolas gratuitas para os pobres, pois os ricos procuravam as escolas tradicionais religiosas. Ainda, a urbanização e a industrialização criaram o fenômeno das "crianças de rua", gerando a necessidade de escolas como forma de controle dos possíveis problemas sociais. Aranha (2007, p.201) afirma que,

Ao lado da expansão da rede escolar, outro objetivo dos educadores no século XIX era formar a consciência nacional e patriótica do cidadão. Até então a educação tivera um caráter geral e universal, mas agora se dava maior ênfase à formação cívica, certamente em razão das tendências nacionalistas da época.

Note-se que, desde o século XVIII, buscava-se o ideal de escola pública, gratuita e universal sob a responsabilidade do estado. Assim, cada vez mais a educação assume um caráter político, devido a sua importância na formação do cidadão, além de constituir-se um forte instrumento de cultura e formação da cidadania. Para Aranha (2007, p. 245) "a escola representava a esperança de democratização da sociedade." Peeters e Cooman (1967, p. 145) explicam que, os livros escolares eram desconhecidos até bem pouco tempo. O Ministro Paulino de Souza, em 1870 no relatório encaminhado às Câmaras, lamenta o completo abandono da instrução no Brasil. Neste sentido falam Peeters e Cooman (1967, p. 146):

Em 21 de outubro de 1875, foi dado novamente impulso à criação de escolas normais e em 1880 fundou-se a de São Paulo, a qual apenas funcionou como escola noturna frequentada por moços e moças que trabalhavam durante o dia, de maneira que foi escasso o proveito. Aliás, faltavam professores de carreira, e foi mister recorrer a advogados, médicos, engenheiros, etc..., talvez muito competentes no exercício da sua profissão mas desprovidos de treino pedagógico e muito empenhados nos seus próprios afazeres.

Posto isso, compreende-se que naquele período havia preocupação com a criação de escolas, mas, ainda haviam problemas com a deficiência de números de professores qualificados para trabalhar a questão pedagógica e exercer a função de ensinar.

É importante destacar que no decorrer do século XIX com a expansão das escolas públicas, Rui Barbosa pleiteou, em 1882, a liberdade de ensino, a laicidade da escola pública e a intrução primária obrigatória." Diante disso, aumentou o cuidado com o método de ensino, que se baseava na compreensão da natureza infantil, aplicando-se a ele a psicologia da educação. Neste sentido, sobre a educação da criança, pode-se dizer que

O primeiro atentado que contra ela, contra a sua existência normal, contra os seus direitos indefesos cometem o mestre e o método é esquecerem no aluno a existência de um corpo com as mais imperiosas de todas as necessidades. A escola olvida, ignora que a educação não atua sobre elementos impalpáveis, que a sua influência se exerce contínua e diretamente sobre a saúde do organismo. (BARBOSA, 1883, apud PILETTI; PILETTI, 1997, p. 155)

Pode-se dizer que no século XIX não havia, ainda, uma política de educação sistemática e planejada. Aranha (2007) aponta que quando a família real chegou ao Brasil, existiam as aulas régias do tempo de Pombal, o que obrigou o rei a criar escolas, sobretudo superiores, afim de atender as necessidades do momento. Com a queda da monarquia em 1989, começou a Primeira República, que durou até 1930. Segundo Cotrim (1999, p. 229) "em 15 de novembro de 1890 reuniram-se na cidade do Rio de Janeiro a Assembléia Constituinte, para elaborar, então, a primeira Constituição da República brasileira." Dessa forma,

Competia à Assembléia apreciar o anteprojeto constitucional, elaborado por juristas nomeados em dezembro de 1889. Destacaram-se na redação desse documento Rui Barbosa e Saldanha Marinho. O Anteprojeto constitucional tinha como modelo a Constituição dos Estados Unidos. (COTRIM, 1999, p. 229)

Com a constituição do Brasil em República, cresceu a autonomia dos estados e, com isso, o governo federal acabou se desinteressando pela instrução primária, ocasionando, assim, um lento desenvolvimento da educação popular durante o primeiro decênio da República.

Neste contexto, os Estados Unidos, acabou impondo padrões de consumo de bens materiais e, também, impondo novos padrões de consumo de bens culturais que influenciaram no Brasil. Entre estes estavam as teorias pedagógicas e do Movimento da Escola Nova, que enfatizava a importância da liberdade da criança e do interresse do educando para um melhor resultado na prática do ensino-aprendizagem. Segundo Aranha (2007, p. 303),

[...] foi publicado um manifesto dos pioneiros da Educação Nova, assinado por 26 educadores, entre eles Fernando de Azevedo e Anísio Teixeira. O documento defendia a educação obrigatória, pública, gratuita e leiga como dever do estado, a ser implantada em programa de âmbito nacional. Um dos objetivos fundamentais expressos no Manifeto que certamente fora redigido sob a inspiração de Anísio Teixeira- era a superação do caratér discriminatório e antidemocrático do ensino brasileiro, que destinava a escola profissional para os pobres e ensino acadêmico para a elite.

Entre 1930 e 1937, o país viveu um dos períodos de maior radicalização política de sua história. Durante este período, originou-se a Reforma Francisco Campos, que Peeters e Cooman (1967, p. 140) explicam que "pôs fim ao monopólio do estado e reconheceu nela condições para aprovação dos estabelecimentos particulares." Também, em 1942, conhecida sob o nome de Lei Capanema, respondeu às aspirações da corrente que pleiteava o retorno aos estudos clássicos e formadores de personalidade.

Xavier, Ribeiro e Noronha (1994) apontam que em 1930, o governo provisório de Getúlio Vargas criou o Ministério da Educação e Saúde, importante para o planejamento das devidas reformas e para a estruturação da universidade. Também, foi o período que Francisco Campos foi nomeado para o cargo de ministro.

Pela primeira vez uma ação planejada pleiteava a organização nacional, já que as que ocorreram anteriormente, tinham sido apenas estaduais. Neste sentido Aranha (2007, p.305) diz que os decretos que efetivavam a reforma Francisco Campos, além dos que dispunham sobre o regime universitário, tratavam da organização da Universidade do Rio de Janeiro, da criação do Conselho Nacional de Educação do ensino secundário e comercial.

Na vigência do Estado Novo, destaca Aranha (2007, p.307) que "durante a ditadura Vargas, o Ministro Capanema empreendeu outras reformas do ensino, regulamentadas através de decretos-leis assinados de 1942 a 1946, que foram denominadas de Leis Orgânicas do Ensino." Após o Estado Novo, regulamentou-se então, a reforma do ensino primário, com introdução de diversas modificações no campo da educação, a saber: a criação do ensino supletivo de dois anos, importante para a redução do analfabetismo, pois atendia adultos e, também, adolescentes que não tinham ainda se escolarizado.

O Estado Novo constituiu-se em uma ditadura. Conforme Guirardelli (2001, p. 83) foi "um regime sem o funcionamento do Congresso Nacional, sem partidos legais, sem eleições. Desenvolveu-se, o fortalecimento do Estado no sentido de melhor servir aos interesses do capitalismo." Verifica-se que o Estado Novo, além das leis orgânicas do ensino, chamadas de Reforma Capanema, forjou algumas entidades que passaram a ter importância nos processos de educação formal do país.

É deste período a criação do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP), do instituto Nacional do livro, do serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, do Serviço Nacional de Aprendizagem (SENAI), do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC). A criação dessas instituições e a decretação da Reforma Capanema esboçaram um sistema educacional para o país, até então inexistente. (GUIRARDELLI, 2001, p.83)

Verifica-se que o SENAC e o SENAI, ofereciam aos alunos salários para poder estudar e treinamento profissionalizante nas empresas, o que tornava o projeto atrativo para as classes populares. Para Guirardelli (2002, p. 88),

Nos anos finais do regime, Vargas deu uma guinada à esquerda. Sempre buscando apoio popular, concedeu anistia aos presos políticos, permitiu a legislação do Partido Comunista, reconheceu a URSS e estabeleceu relações diplomáticas com esse país. Os chefes militares que lhe deram apoio durante o Estado Novo passaram a ver tais manobras com maus olhos e, procurando evitar o continuismo, trataram logo de depor o presidente antes das eleições da ANC.

No período de 1945 a 1964, com a queda da ditadura de Vargas, houve um processo de redemocratização do Brasil, (ARANHA, 2007, p. 309). O país inclina-se ao Estado de Direito, com governos eleitos pelo povo e marcados pela esperança de um progresso acelerado.

A Constituição de 1946 era considerada liberal e regularizou a vida do país, pois procurou garantir o desenrolar das lutas político-partidárias, estabelecendo assim, uma certa democracia. Segundo o entendimento de Guirardelli, (2001, p.110) "nem todos os partidos políticos puderam ter existência legal. O Partido Comunista, após 1947, não recuperou mais o seu registro e teve de contentar-se com a semilegalidade dos períodos de menor repressão."

Destaque-se que a primeira lei brasileira a estabelecer as Diretrizes e Bases da Educação Nacional em todos os níveis, desde o primário ao superior explicam que "foi a Lei nº 4.024 , de 20 de dezembro de 1961. E que quando publicada, já se encontrava ultrapassada, pois esta Lei, chegou ao Congresso em 1948, onde foi discutida por 13 anos." Piletti; Piletti ( 1997, p. 189) Embora o anteprojeto de lei fosse avançado na época da sua criação, verifica-se que ele envelhecera, a espera dos debates e confronto de interesses.

Com esta lei, pode-se verificar que os currículos deixaram de ser tão rígidos, permitindo aos estabelecimentos educacionais optar por uma maior variedade no ensino, em relação às matérias optativas. Segundo Piletti e Piletti, (1997, p. 191) três partes compunham os currículos: a) uma nacional, constituída por disciplinas obrigatórias indicadas pelo Conselho Federal de Educação: Português, História, Geografia, Matemática, Ciências e Educação Física. b) uma regional, abrangendo disciplinas também obrigatórias, fixadas pelos Conselhos de Educação dos Estados. c)uma própria dos estabelecimentos, cujas disciplinas seriam escolhidas pelas escolas a partir de uma lista elaborada pelos Conselhos de Educação dos estados.

Durante a época, em que prosseguia a discussão acerca das diretrizes e bases da Educação, desenvolveu-se no país uma intensa campanha pela escola pública. Toda a sociedade se empenhou: educadores, órgãos de imprensa, sindicatos e outras categorias profissionais. Esta campanha buscava tornar realidade o preceito constitucional que garantia educação para todos. (PILETTI ; PILETTI 1997, p. 191) Para que todos tivessem acesso à educação, seria necessário ampliar o número de escolas públicas e gratuitas, já que as particulares eram pagas e, dessa forma, só acessíveis a determinadas classes sociais.

Vê-se que, de 1946 a 1964, houve grande atuação de diversos movimentos de educação popular, especialmente destinados à alfabetização de adultos. Destaque-se alguns destes movimentos: a Campanha de Educação de Adultos, o Movimento de Educação de Base e o Programa Nacional de Alfabetização foram patrocinados pelo governo federal. O Ministério da Educação era o responsável pelo financiamento das unidades de ensino, por orientar os trabalhos de alfabetização e pela mobilização da opinião pública tanto dos governos estaduais como municipais, no sentido de aderirem à campanha.

Verifica-se que o Programa Nacional de Alfabetização de Adultos iniciou suas atividades em julho de 1963, mas foi oficialmente instituído em 1964. A alfabetização de adultos se faria mediante o uso do " Sistema Paulo Freire". (PILETTI ; PILETTI 1997, p. 194) O próprio Paulo Freire foi nomeado coordenador do Programa Nacional de Alfabetização neste período. Entretanto, quando no dia 1ª de abril os militares tomaram o poder, extinguiu-se o Programa e os seus coordenadores foram presos ou exilados. A idéia básica deste método de ensino era a adequação do processo educativo às características do meio. Dessa forma, o programa localizava e recrutava os analfabetos que residiam nas áreas escolhidas para a realização dos trabalhos de alfabetização.

Nesta metodologia, o ensino dava-se através das próprias experiências e vivências do educando. Eram colhidas entrevistas com os adultos e com as pessoas mais antigas do lugar. Registravam estas experiências que, futuramente, auxiliariam no processo de aprendizagem . Neste sentido, Piletti e Piletti (1997, p. 194) apontam que

Durante toda a década de 1950 Paulo Freire vinha acumulando experiências no campo da alfabetização de adultos em áreas urbanas e rurais próximas a Recife, experimentando novos métodos, técnicas e processos de comunicação. A partir de 1961, o método já praticamente estruturado foi posto em prática no Recife. Em 1962, estendeu-se a João Pessoa ( Paraíba) e a Natal ( Rio Grande do Norte), onde se desenvolveu a campanha "De pé no chão também se aprende a ler". Mas, a experiência que deu divulgação nacional ao método foi a realizada em Angicos, no Rio Grande do Norte, cujo encerramento contou com a presença do Presidente da República.

A partir de 1964, a educação no Brasil passou a sofrer com o autoritarismo que se instalou no país, provocando reformas em todos os níveis de ensino. Neste sentido, Piletti e Pilletti ( 1997, p. 200) afirmam que várias reformas foram efetuadas em todos os níveis de ensino, impostas de cima para baixo, sem a participação dos maiores interessados: alunos, professores e outros setores da sociedade.

Após 1964, verifica-se que as vagas no ensino superior, na década de 70, estavam limitadas. Muitos jovens passavam no vestibular, mas não podiam ingressar na universidade por falta de vagas. Esta era uma das maiores reivindicações dos estudantes. Além das vagas, os estudantes protestavam pela ampliação do corpo docente, aumento das verbas para a educação e ensino superior. Neste sentido, destacam Xavier, Ribeiro e Noronha (1994, p. 235) que,

No entanto, mesmo sob rigorosa repressão e na ilegalidade, a UNE, realizou clandestinamente seus congressos até 1968, ano em que o CCC ( Comando de Caça aos Comunistas) passou a radicalizar a repressão. Essa organização paramilitar de extrema-direita, entre outros feitos, atacou e destruiu as instalações da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP, episódio que ficou conhecido como a Batalha da Rua Maria Antônia.

Explica Gohn, (2001, p. 58) que contrastando com as perdas, "tivemos alguns ganhos no plano sócio-político. A sociedade como um todo aprendeu a se organizar e a reivindicar." Neste sentido, verifica-se que a história da educação no Brasil, sempre foi questão de discussão entre as diferentes classes sociais e que com o passar dos anos, alunos e professores continuam a lutar pelo que entendem ser o ideal de educação.

2.2 O direito à educação no Brasil através de suas constituíções

Existem certos direitos que são protegidos por lei. As Constituições de quase todos os países, fazem referência a estes direitos e, pode-se destacar alguns destes, chamados de Direitos Sociais, pois são garantidos a qualquer cidadão. Entre eles tem-se: o direito à vida, à liberdade, à segurança, à propriedade, ao trabalho e a educação, dentre outros. A proteção aos direitos e às garantias do cidadão estende-se desde a igualdade entre os homens e mulheres, em direitos e obrigações, até a liberdade de pensamento, credo e ideologia. Desta forma, o objetivo é garantir à pessoa humana seu pleno desenvolvimento social. Segundo Chalita (2001, p. 107) "o pleno desenvolvimento da pessoa humana significa o desenvolvimento, não apenas do aspecto cognitivo ou da mera instrução, mas do ser humano de forma integral." Diante disso, a questão da educação está na ordem do dia na realidade brasileira e no tema desta pesquisa. Posto isto, far-se-á agora uma rápida abordagem sobre como era postulado o direito à educação em cada Constituição promulgada no Brasil. A primeira constituição promulgada no Brasil foi a de 1824, e imposta por Dom Pedro I.

A dissolução da Assembléia Constituinte de 1823, levou os grandes proprietários de terra a temerem que o autoritarismo de D. Pedro I aumentasse de proporções e viesse a prejudicar seus interesses econômicos. Para acalmar os ânimos mais exaltados, o imperador apressou-se em em convocar uma comissão de dez membros, todos brasileiros natos, incumbindo-a em elaborar um novo projeto de Constituição para o país. A comissão nomeada pelo imperador trabalhou durante quarenta dias até concluir o texto final do anteprojeto constitucional. Esse documento foi enviado à apreciação de diversar câmaras Municipais e, que de modo geral, foi aceito. D. Pedro I decidiu, então, outorgar a nova Constituição à nação, pelo decreto imperial de 25 de março de 1824. (COTRIM, 1999, p. 166)

A Constituição imperial de 1824, tinha características essencialmente européias, destacando-se a existência de um quarto poder nesta constituição, chamado de Poder Moderador. Sobre este quarto poder, explica Cotrim (1999, p. 167), que era exclusivo do imperador, sendo definido como a "chave mestra" de toda a organização política. Neste período, estava acima de todos os demais poderes. Percebe-se, neste período, a pouca valorização da educação como direito, onde a educação formal era privilégio apenas de famílias nobres ou burguesas.

Desde que o Brasil se tornou independente, foi um dos primeiros do mundo a promulgar a gratuidade da educação, Assim, Peeters e Cooman (1967, p. 145) afirmam que a Constituição promulgada por D. Pedro I, artigo 179, dizia que " a instrução primária é gratuita a todos os cidadãos". Neste sentido, Cotrim (1996, p. 303) apresenta este artigo:

Artigo 179. A inviolabolidade dos direitos Civis e Políticos dos cidadãos brasileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do império, pela maneira seguinte: [...] XXXII- A instrucção primária, é gratuita a todos os cidadãos. XXXIII- Collégios e Universidades, aonde serão ensinados os elementos das Sciencias, Bellas Letras, e Artes.

Um novo projeto de lei em 1827, criou pedagogias em todas as vilas e povoações mais populosas do país. O ato Adicional de 1834, deixava para as Províncias o cuidado de implantar o ensino primário e secundário. Algumas províncias ciaram escolas normais e a primeira delas foi a da cidade de Niterói, no Rio de Janeiro, em 1835.

A Constituição de 1891, foi promulgada em 24 de fevereiro de 1891, tornando-se a primeira constituição brasileira da República. Suas principais mudanças implicavam que o ensino religioso das escolas seria banido, proibindo, também, a assistência religiosa em quartéis, hospitais e prisões. A igreja Católica reagiu de forma negativa a esta novidade, que estabelecia a separação da Igreja e do Estado e a laicização do ensino nos estabelecimentos públicos.

Em 31 de dezembro de 1927, Julio Prestes sancionou a lei nº 1884. Esta lei abria mão do monopólio oficial da educação e permitia escolas normais livres. Entre 1920 a 1930, começou a ser introduzida no país a "Escola Nova". Neste sentido, Guirardelli Jr. (2002, p. 25) diz que

A divulgação da pedagogia nova ocorreu no interior da crescente influência cultural norte-americana sobre o Brasil, principalmente após a Primeira Guerra Mundial. Antes da Guerra, o Brasil, como vários paises com economia baseada na monocultura e na exportação, ficava suscetível ao controle dos banqueiros ingleses que, em troca de financiamentos para as lavouras, mantinham o país sob controle econômico e sujeito ao pagamento de altos juros de uma dívida externa crescente. Após a Guerra, com a Inglaterra vencedora mas cambaleante, os Estados Unidos ocuparam o espaço deixado pelos ingleses no cenário financeiro e mercantil internacional.

A Lei 4024/ 61, que trata das Diretrizes e Bases da Educação Nacional, constituiu um primeiro plano, para a plena democratização do ensino brasileiro. Segundo Xavier, Ribeiro e Noronha ( 1994, p. 221),

A proposta de conteúdo comum obrigatório (universialização do ensino) para todo o país, uma legislação que institucionalizasse os anseios de uma organização escolar fundada em diretrizes e bases para a educação nacional, reflete avanços normativos, que vinham sendo buscados desde os anos 20 e que foram introduzios na lei nº 4.024/61 e, posteriormente, na lei nº5.692/71.

No dia 16 de julho de 1934, foi promulgada a Constituição de 1934, a primeira a incluir um capítulo especial sobre educação, (PILETTI; PILETTI, 1997, p.176) Estabeleceu, então, alguns pontos importantes, como a educação como um direito para todos, a obrigatoriedade de escola primária integral, a gratuidade do ensino primário, a assistência aos estudantes necessitados.

Artigo 150. Compete à União: a) fixar o plano nacional de educação, comprenhensivo do ensino de todos os graus e ramos, comuns e especializados, e coordenar e fiscalizar a sua excução, em todo o território do paiz.[...] c) organizar e manter, nos territórios, systemas educativos apropriados aos mesmos. ( COTRIM, 1996, p.305)

Nesta constituição ficou esclarecido que a educação religiosa aconteceria de forma facultativa e de acordo com a religião de cada criança, com autorização dos pais ou dos responsáveis e a responsabilidade pela educação seria solidária: entre a família e os poderes públicos. Neste sentido, Romanelli (1978, p. 142) afirma que

A constituição de 1891, em vigor atá 1934, pelo seu artigo 72, paragrafo 6, declarava que: " será leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos públicos". Já a constituição de 1934, pelo seu artigo153, declarava: o ensino religioso será de frequência facultativa, e ministrado de acordo com os princípios da confissão religiosa do aluno manifestada pelos pais ou responsáveis e constituirá matéria dos horários nas escolas públicas primárias, secundárias, profissionais e normais. Modificando um pouco o teor da prescrição, a Constituição de 1937 determinava, pelo seu artigo 183: " O ensino religioso poderá ser contemplado com matéria de curso ordinário das escolas primárias normais e secundárias. Não poderá, porém, constituir objeto de obrigação dos mestres ou professores, nem por frequeência compulsória por parte dos alunos.

Destaca-se que a constituição de 1934 estabelecia que o presidente da República seria eleito de forma indireta, escolhido pelos membros da Assembléia Constituinte, para um mandato de quatro anos. O primeiro presidente brasileiro eleito pela constituinte foi Getúlio Vargas, que logo após ser eleito, iniciou seu mandato constitucional.

Note-se que a Constituição de 1937, promulgada por Getúlio Vargas, extinguiu a igualdade dos cidadãos perante a lei. O incentivo dado às classes menos favorecidas, quando o assunto se referia à educação, era a de que procurassem a escola pública profissionalizante, especialmente, para o aprendizado de alguma atividade profissional, conforme ditava o texto constitucional.

Artigo 15. [...] IX- fixar bases e determinar os quadros da educação nacional, traçando as diretrizes a que deve obedecer a formação física, intelectual e moral da infância e da juventude. [...] artigo 129. À infância e à juventude, a que faltarem os recursos necessários à educação em instituições particulares, é dever da Nação, dos Estados e dos municípios, assegurar, pela fundação de instituições públicas de ensino em todos os seus graus, a possibilidade de receber uma educação adequada às suas faculdades, aptidões e tendências vocacionais. O ensino prevocacional e profissional destinado às classes menos favorecidas é, em matéria de educação, o primeiro dever do estado. Cumpre-lhe dar execução a esse dever, fundando institutos de ensinoprofissionais e subsidiando os de iniciativa dos Estados, dos Municípios e dos indivíduos ou associações particulares e profissionais.( COTRIM, 1999, p.308)

Segundo Guirardelli (2002, p.82) a Carta de 1937 não determinava ao Estado tarefas no sentido e fornecer à população uma educação geral, através de uma rede de ensino público e gratuito. Pelo contrário, a intenção desta constituição era a de manter um explícito dualismo educacional: os ricos proveriam seus estudos através do sistema público ou particular e os pobres, deveriam procurar as escolas profissionalizantes.

Verifica-se que o Ensino Superior, a partir da década de 30, também sofreu modificações. Segundo Guirardelli (2001, p. 175) "a reforma universitária, incluída nas Reformas de Base do período janguista, direcionava-se no sentido de democratização do ensino superior." Com isto, percebe-se a vontade dos governantes em democratizar o acesso ao ensino superior.

Já a Constituição de 1946, promulgada em 18 de setembro de 1946, consagrou as liberdades expressas na Constituição de 1934 que, durante a vigência da Constituição de 1937, haviam sido retiradas. Destaque-se que esta Constituição era bastante avançada para a época, pois marcou um avanço da democracia e direitos individuais do cidadão brasileiro.

Na área da educação, verifica-se o avanço da participação popular. O ensino técnico-profissional conseguiu sua equivalência com o secundário e gerou um debate nunca visto. A Lei de Diretrizes e Bases (LDB), foi discutida durante treze anos no Congresso Nacional. Dessa forma Piletti e Piletti ( 1997, p. 187) afirmam que,

A Constituição de 1946 estabeleceu como regra " o ensino ministrado pelos poderes públicos", embora livre a iniciativa popular, dentro dos limites da lei. Manteve também, o ensino religioso obrigatório para os estabelecimentos e ministrado segundo a confissão religiosa dos alunos. Apesar da mudança de regime e da nova constituição, a legislação educacional herdada do Estado Novo vigorou até 1961, quando teve início a vigência da Lei de Diretrizes e Bases da educação nacional. Este fato, contudo, não impediu que numerosas campanhas fossem organizadas, visando à ampliação e à melhoria do atendimento escolar, refletindo na expansão do número de matrículas.

Verifica-se que o texto constitucional desta constituição específica, não sofreu muitas inovações e que o ensino religioso nas escolas públicas foi a questão mais debatida. A Constituição de 1967, entrou em vigor em 15 de março de 1967. Nessa fase, há de se observar que o que foi estruturado na Constituição de 1946, nesta já não estava garantido. O estado estava passando por um momento conturbado e desorganizado. Os interesses em relação ao ensino e a valorização do cidadão, cairam no esquecimento e pouco foi feito para a efetivação desse direito. Destaque-se nesta Constituição o que segue:

Artigo 8º, Compete à União: [...] XIX- estabelecer planos de educação e de saúde.[..] Artigo 168- A educação é direito de todos e será dada no lar e na escola; assegurada a igualdade de oportunidade, deve inspirar-se no princípio da unidade nacional e nos ideais de liberdade e de solidariedade humana.( FÁVERO, 2000, p. 310)

Percebe-se que os dispositivos constitucionais que tratam da educação, são apenas dois artigos e estes reafirmam o direito de todos à educação. Por fim, foi promulgada em 05 de outubro de 1988, a sétima carta constitucional do país, consagrando o Brasil como Estado Democrático de Direito. Isto significa dizer que o povo pode participar da formação do governo, elegendo-os diretamente ou por meio de representantes eleitos. Verifica-se que no Brasil, a formação colonial e a sucessão de períodos ditatoriais, durante a curta história republicana impediu, que durante séculos, o povo brasileiro exercesse sua cidadania. O direito a educação constitui um dos direitos sociais previstos no artigo 6º e artigo 205 da Constituição Federal de 1988, conforme pode ser visto abaixo:

Art.6º São direitos sociais a educação, a saúde,o trabalho, a moradia, o laser, a segurança, a previdencia social, à maternidade e a infância, a assistencia aos desamparados, na forma desta constituição. [...] Art.205 A educação, direito de todos e dever do estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. (BRASIL, 2007, p.15)

Na Declaração Universal dos Direitos da Criança, também está previsto a garantia ao acesso à educação em seu Princípio VII. Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente,

A criança tem direito a receber educação escolar, a qual será gratuita e obrigatória, ao menos nas etapas elementares. Dar-se á à criança uma educação que favoreça sua cultura geral e lhe permita, em condições de igualdade de oportunidades, desenvolver suas aptidões e sua indiidualidade, seu senso de responsabilidade social e moral. ( BRASIL, 2007, p. 102)

Refletir sobre a garantia da educação é uma tarefa necessária. Em primeiro lugar, para ajudar a compreender a educação e a cidadania, pois como afirma Arroyo (2002, p. 34)é preciso entender a relação entre educação e cidadania e se está contribuindo para a garantia da cidadania dos trabalhadores, ou ao contrário, está contribuido para justificar e racionalizar a sua exclusão.

2.3 O direito da criança à educação segundo o ECA – Lei 8.069/90, de 13/07/90

Durante toda a história, a criança nunca foi vista como um ser humano ou como um cidadão completo. Segundo Porto, (1999, p. 27) "ela era vista apenas como se fosse um meio-adulto, com poucos deveres e, conseqüentemente poucos direitos", que não possuía opinião para assuntos relacionados à sua família. Neste sentido, a criança gozava de poucos direitos. Somente a partir do século XVI, quando as idéias liberais começaram a surgir, é que as crianças passaram a ser vistas e reconhecidas como uma categoria social diferenciada. Mas a legislação demorou até o século XX para reconheçê-los.

De início, todo o poder era conferido aos pais. Instituído de pátrio poder, os pais exerciam-no como bem entendessem. Segundo Porto (1999, p.27) os filhos não tinha direitos, pois os pais os representavam em todas as ocasiões. Posteriormente, passou-se a entender o poder como algo a ser usado somente em defesa dos filhos. Se utilizado contrariamente, o filho teria direito de recorrer à justiça.

A convenção das Nações Unidas é apresentada como instrumento de domesticação do poder parental e estatal, principalmente nas suas relações autoritárias, com a infância e a adolescência, como instrumento de mobilização da sociedade e de construção de uma cultura institucional que veja a criança e o adolescente como cidadãos e como alavancadores no processo de institucionalização de um sistema de garantia de direitos eficiente e eficaz. (NOGUEIRA NETO, 1999, p.29)

Verifica-se que a proteção dos direitos das crianças ganhou força em 1959 quando as Nações Unidas editaram a Declaração Universal dos Direitos da Criança. Em 1989, comemorando os 30 anos da declaração, os países que formam a ONU subscreveram a Declaração Universal dos Direitos da Criança, aprovada pela Assembléia Geral das Nações Unidas em 20 de novembro de 1989. No Brasil, o Congresso Nacional Brasileiro aprovou-a através do decreto legislativo 28 em 14 de setembro de 1990. Posteriormente, o Presidente da República promulgou a convenção, transformando-a em lei interna. (PORTO, 1999, p.28)

Desta forma analisa-se que a Constituição Federal artigo 24, XV e 30, II, (NETO,1999, p.39) serviu como base de sustentação dos principais dispositivos do Estatuto da Criança e Adolescente e fundamentou a campanha Criança Constituinte. Esta foi uma grande mobilização da sociedade civil com o objetivo de inserir no texto constitucional os princípios da Declaração dos Direitos da Criança, no sentido de dar efetivação aos princípios constitucionais garantidores da dignidade humana da criança. Assim, foi editada a Lei nº 8.069/90, (NETO, 1999, p. 39) promulgada em 13 de julho de 1990 conhecida como Estatuto da Criança e Adolescente. Neste sentido,

A democracia requer leis que garantam e promovam a dignidade da pessoa humana, assegurando seus direitos e o cumprimento dos deveres. O atual Estatuto responde ao anseio, há anos acalentado, de dotar o País de um instrumento válido para salvaguar a vida e garantir o desenvolvimento pleno das meninas e meninos do Brasil, especialmente dos 30 milhões de empobrecidos. (SILVA, 2000, p. 13)

O Estatuto reconhece as crianças e os adolescentes como cidadãos, possuidores de todos os direitos, iguais aos adultos, e de outros direitos especiais por serem sujeitos em desenvolvimento. Desta forma, concretizou um notável avanço democrático ao regulamentar as conquistas relativas às crianças e adolescentes. Destaque-se o artigo 3º e o art. 53 da lei 8.069/90 que fala sobre o direito da criança à educação:

Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta lei. Assegurando-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunida; des e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolivimento físico, mental, moral, espirirual e social, em condições de liberdade e dignidade. Art. 53 A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício e qualificação para o trabalho, assegurando-lhes: I- igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II- direito de ser respeitado por seus educadores, III-direito de contestar critérios avaliativos, podendo recorrer às instâncias escolares superiores, IV- direito de organização e participação em entidades estudantis, V- acesso à escola pública e gratuita próxima de sua esidência. PARÁGRAFO ÚNICO. É direito dos pais ou responsáveis ter ciência do processo pedagógico, bem como participar da definição das propostas educacionais. (BRASIL, 2007, p. 32)

Quanto ao direito à Educação, o Estatuto da Criança e do Adolescente, alterou este campo. Transformou uma série de conceitos antigos, cabendo ao Estado e ao sistema educacional promover a criança e ao adolescente, alocar meios para construir a cidadania das crianças e adolescentes e prepará-los para uma vida digna, onde possam gozar de seus direitos e garantias fundamentais.

São duas as palavras que resumem esse direito fundamental: acesso e permanência. Segundo Porto (1999, p. 59),

O acesso é o direito de ingressar na escola, e ele é garantido a todos, sem discriminação: aos alunos tidos como "normais", aos "fora de faixa", normalmente mal vistos pelas escolas; aos "desistentes", que por algum motivo abandonam a escola durante o ano letivo; aos "adolescentes que trabalham", e não podem estudar durante o dia; e aos "portadores de deficiência", que, para minorar seu sentimento de exclusão, devem ser preferencialmente educados na rede regular de ensino. Garantir a permanência na escola é provavelmente, uma tarefa mais difícil. Não precisamos ir muito longe para concluir que a falta de condições de permanência na escola decorre, de maneira direta, da falta de condições de vida do educando e de sua família.

Como sujeito de direito, a criança precisa aprender a ser cidadão, compreender que a vida em sociedade depende do respeito que todos devem ter para com os outros. Por isso, a educação do futuro deverá ser o ensino primeiro e universal, centrado na condição humana. A educação não é, pois, para a sociedade senão o meio de preparação das condições essenciais da própria existência.

[...]a educação é a aquisição de arte de utilizar os conhecimentos. É uma arte muito difícil de se transmitir. Sempre que se escreve um manual de verdadeiro valor educacional, pode-se estar quase certo de que algum crítico dirá que será muito difícil ensinar por meio dele. Naturalmente que será mais difícil. Se fosse fácil, o livro deveria ser queimado, pois não poderia ser educacional. (GADOTTI, 2005, p. 117)

Refletir sobre a garantia da educação é uma tarefa necessária, em primeiro lugar, para ajudar a compreender a forma como vem sendo colocada a educação nos assentamentos do MST, objetivo deste estudo, pois como afirma Arroyo (2002, p. 34) compreender a relação entre educação e cidadania contribui para a garantia da cidadania dos trabalhadores ou, ao contrário, contribui para justificar e racionalizar a sua exclusão social.

Diante do exposto acerca, da trajetória da educação no Brasil, passa-se agora à discussão acerca deste processo nos assentamentos do Movimento dos Sem Terra, buscando verificar como esta é praticada e como são constituídos os sujeitos sociais através deste processo educativo.


3 O MOVIMENTO DOS SEM TERRA

Movimentos sociais referem-se à ação dos homens na história, a qual envolve um fazer e um pensar coletivo, por meio de um conjunto de idéias que motivam e dão fundamento à ação. Herkenhoff ( 2004, p.15) explica que

Na Sociologia Acadêmica, o termo " movimentos sociais" surgiu com Lorenz Von Stein, por volta de 1840. Lorenz Von Stein defendeu a pertinência de uma ciência da sociedade que se dedicasse aos "movimentos socias", tais como ele os percebeu então – o movimento operário francês, o Comunismo e o Socialismo emergentes.

É importante destacar que estes movimentos, fazem parte dos movimentos denominados de "velhos movimentos sociais" e conforme refere Herkenhoff, ( 2004, p. 15), a partir da segunda metade do século XX, os movimentos sociais, na Europa e nos Estados Unidos, assumem nova fisionomia. Estes foram chamados de "novos movimentos sociais". Nesse sentido, surgem como forma crítica ao capitalismo dominante.

Como os movimentos socialistas são movimentos contestatórios dentro da sociedade capitalista, eles se originam com a crítica ao capitalismo. São movimentos para os quais o pensamento teórico exerce um papel fundante, apesar de sua origem real ser a experiência da exploração vivida pelas camadas populares no sistema capitalista. ( HINKELAMMERT, 2003, p. 10)

Destarte, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra é um destes movimentos. Contestam, portanto, a sociedade capitalista e privilegiam em seus discursos, a educação cultural e uma política por igualdade na participação social. Hinkelammert (2003, p. 11) fala que "por esse motivo, elaboram teorias da sociedade, da economia e da democracia. Esperam uma sociedade diferente e a formulam de modo que possam alcançá-la como força política." Nesse sentido, o MST, é fruto de um processo histórico de resistência do campesinato brasileiro. É, portanto, parte e continuação da história da luta pela terra, por milhares de trabalhadores que não tem ou tiveram acesso à terra. Neste sentido Fernandes (2000, p. 49) explica que

[...] os fatores econômicos e políticos são fundamentais para a compreensão da natureza do MST. Na década de 1970, os governos militares implantaram um modelo econômico de desenvolvimento agropecuário que visava acelerar a modernização da agricultura com base na grande propriedade, principalmente pela criação de um sistema de créditos e subsídios. Esse sistema financiou a modernização tecnológica para alguns setores da agricultura, de forma que esta passou a depender menos dos recursos naturais e cada vez mais da indústria produtora de insumos. Esse modelo causou profundas transformações no campo. De um lado, aumentou as áreas de cultivo da monocultura de soja, da cana-de-açúcar, da laranja entre outras; intensificou a mecanização da agricultura e aumentou o número de trabalhadores assalariados. De outro lado, agravou ainda mais a situação de toda a agricultura familiar: pequenos proprietários, meeiros, rendeiros, parceiros, etc.,que continuaram excluídos da política agrícula. Essa política ficou conhecida como modernização conservadora promoveu o crescimento econômico da agricultura, ao mesmo tempo que concentrou ainda mais a propriedade da terra, expropriando e expulsando mais de 30 milhões de pessoas que migraram para as cidades e para outras regiões brasileiras.

É neste sentido que o MST é o mais importante movimento social no Brasil contemporâneo, pois, segundo Grzybonwski, (1987, p. 22) "o movimento dos trabalhadores sem terra é o que apresenta maior grau de articulação interna entre os movimentos de luta pela terra em nível nacional". Fundado na década de 80, é fruto de uma questão agrária que é estrutural e, também histórica no Brasil, especialmente na região centro-sul do país (MELUCCI, 1994, apud Gohn 2007, p.160) "os movimentos sociais vistos como fenômeno simultaneamente discursivos e políticos, localizados na fronteira entre as referencias da vida pessoal e política." Ainda, Herkenhoff ( 2004, p. 21) explica que:

As marchas do MST, ao meu ver, são marchas de luta pela justiça, são marchas cívicas de salvação nacional. Quando assusta a migração do campo para a cidade, num país que, por sua imensa extensão territorial, tem vocação agrícola, o que o MST pretende é a migração da cidade para o campo.

O Movimento dos Sem Terra existe desde 1979. Neste sentido, explica Grzybowski (1987), que a origem do MST está associada às ações de resistência e às ocupações de terras por grupos de trabalhadores rurais de algum modo excluídos da sociedade. Teve seu principal pólo aglutinador o estado do Paraná, irradiando-se com força para Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Mato Grosso, estendendo-se para todo o país ao longo dos anos 80. Segundo Rua e Abramovay ( 2009, p. 39) "desde o final dos anos 50, os partidos políticos e os movimentos sociais começaram a questionar a situação fundiária no Brasil". Percebe-se, então, que o MST é mais forte no sul e sudoeste do Brasil, chegando ao apogeu em meados da década de 1980 quando, em forma de luta, realizou vários acampamentos coletivos e ,com isso, chamou a atenção da sociedade.

Pode-se perceber que um acampamento do MST não é um lugar desorganizado, com um amontoado de barracos e gente, e sim um espaço de esperança onde concentram a vontade de viver com dignidade, onde há uma lição humana e política a se aprender. Neste sentido explica Gorgen ( 1989, p.17) "que estes acampamentos são uma forma teimosa e organizada de lutar pela terra e reivindicar a imediata concretização da Reforma Agrária." Destaque-se que, normalmente, esses acampamentos são a continuidade de uma luta após a ocupação da terra, pois funciona como uma forma permanente de reivindicação de direito à terra. Gorgen ( 1989, p. 17) aponta que

O acampamento existe como forma de pressão e uma maneira de tornar pública para toda a sociedade a situação dos sem terra. No acampamento fica visível a dura realidade de miséria vivida pelos sem terra. No interior, nas comunidades rurais, esta realidade fica escondida, dividida e sem força política.

Os movimentos sociais e as organizações populares têm suas raízes históricas nas reivindicações e nos embates do período ditatorial. Para Warren (2005, p.52) "no Brasil, o período ditatorial, com seu regime, restringiu e constrangeu a atuação das camadas populares nos planos econômico, político e cultural/ideológico. Foi o espaço para que antigos grupos de pressão se organizassem em novos moldes, como por exemplo, o novo sindicalismo, novas associações de bairro, etc.

Conforme Fernandes (2000) construir o MST foi um grande desafio dos sem terra em todos os estados. Para tanto, foi fundamental tomar para si a responsabilidade do processo de luta que sempre fizeram. Essa condição foi e é determinante na construção da identidade desse movimento. Destarte, o autor aborda as bases de formação do MST:

Nesse período-1985 a 1990- O MST se territorializou por dezoito estados, tornando-se um movimento nacional, estando presente na luta pela terra em todas as grandes regiões. Ocupação por ocupação, estado por estado, lutando pelo direito à terra por meio das negociações e enfrentamentos, os sem terra espacializaram a luta, construindo o movimento, desde seu nascimento à sua consolidação, dimensionando e transformando as suas realidades. Assim, prosseguiram com o processo de formação do MST, ressocializando famílias de trabalhadores excluídos pela territorialização do capital e do latifúndio, lutando pela reforma agrária e pela transformação da sociedade. (FERNANDES, 2000, p. 170)

Percebe-se que estas mudanças na democracia brasileira contribuíram para a formação desses movimentos nas camadas populares, já que se reunindo faziam com que a ação coletiva fosse possível. Desta forma inseriam suas exigências na agenda nacional, participavam das tomadas de decisão e criavam um relacionamento mais amplo entre democracia e estratégias de desenvolvimento.

O comportamento e a trajetória dos movimentos sociais deve ser o relacionamento entre movimentos e elites políticas. As reivindicações dos movimentos são feitas contra as elites políticas, e a resposta da elite determina não apenas se essas exigências são traduzidas em políticas públicas, mas também se o movimento é reconhecido como um ator legítimo, e se a ele é concedido o acesso aos centros de tomada de decisão dentro do Estado. (HOUTZAGER 1996, p. 133)

Neste sentido, destaca-se que um movimento social, adquire legitimidade quando é reconhecido pelo Estado. Passando a exercer e obter mudanças na esfera social e cultural, desenvolvendo ações relacionadas às condições humanas e socioeconômicas do cidadão, buscando a construção de uma realidade que está sempre além da realidade vivenciada. Conforme Amann (2003) afim de que lhe sejam asseguradas a homogeneidade e a consciência de suas funções, quer no campo econômico, político ou social.

Os movimentos sociais, influenciam na formação do cidadão, atuando em coletividade, fazendo com que cada indivíduo ali presente, contribua para o crescimento individual e coletivo de seus integrantes. Segundo Hinkelammert (2003, p. 19) "fala-se agora da sociedade na qual caibam todos os seres humanos, mas igualmente a natureza externa ao ser humano." Neste sentido, Gohn (2001, p. 16) afirma que "o cidadão coletivo presente nos movimentos sociais reivindica baseado em interesses de coletividade de diversas naturezas." Dessa forma, entende-se que, conforme Gohn (2001), o cidadão é homem civilizado que participa de uma comunidade de interesses, solidário aos seus companheiros, a fim de se formar uma cidadania coletiva.

A construção da cidadania coletiva se realiza quando, identificados os interesses opostos, parte-se para a elaboração de estratégias de formulação de demandas e táticas de enfrentamento dos oponentes. Este momento demarca uma ruptura com a postura tradicional de demandatários de bens de consumo coletivo: não se espera o cumprimento de promessas, organiza-se táticas e estratégias para a obtenção do bem por ser um direito social. ( GOHN, 2001, p. 18)

Verifica-se que a convivência coletiva, proporcionada pelos movimentos sociais, possibilita aos seus integrantes um acúmulo de experiências. Para Bobbio (2000, p. 30) "todo grupo social está obrigado a tomar decisões vinculatórias para todos os seus membros com o objetivo de prover a própria sobrevivência." Nesse sentido, explica Gohn (2001) que as experiências vivenciadas no passado, por cada sujeito, são resgatadas no imaginário coletivo e fornecem elementos para a leitura do presente. Verifica-se que, a questão do acampamento influi na formação do sujeito, já que é neste espaço que se concentram as diversidades e interesses em comum, em prol da transformação da realidade.

Na luta pela terra, acampar é determinar um lugar e um momento transitório para transformar a realidade. Quando os sem terra tomam a decisão de acampar, estão desafiando o modelo político que os exclui da condição de cidadãos. A resistência no acampamento não é façanha. A persistência é o desafio. Para sobreviver, os acampados dependem de sua organização, do trabalho e do apoio dos que defendem a reforma agrária. ( FERNANDES, 2000, p. 55)

Faz-se importante destacar, também, que o MST, após serem assentadas as famílias, continuam a reivindicar a regularização de suas necessidades e interesses. Segundo Medeiros (2003, p.85),

[...] a presença demográfica dos assentamentos certamente tem desdobramentos sobre o contexto político, uma vez que tendem a gerar um acréscimo na pressão das demandas em torno da infra-estrutura e equipamentos sociais, já que os assentados reivindicam escolas, postos de saúde, condições de transportes e escoamento da produção. Isto coloca os assentados numa relação direta com as autoridades públicas (locais, estaduais, federais). Os assentamentos tenderam a representar mudanças nas formas de ocupação do espaço, transformando áreas onde predominavam pastagens, criação extensiva, monoculturas decadentes e em crise.

É através destas exigências que vão se construindo os espaços para a formação humana destas pessoas. À medida que o MST avança como movimento, verifica-se que seus projetos vão se completando. Explica Falkembach (2007, p. 150) que

Na trajetória do MST, a relação com o sofrimento passou a se constituir como uma técnica entre si, que não subtraiu o indivíduo do convívio, pelo contrário, o manteve necessitado, solidário e ocupado com o outro coletivo, este último que é a própria forma de existência criada num cotidiano renascido. Associada a outras técnicas de relação consigo e com outros, como a formação permanente, a relaçãom com o sofrimento transformou-se em quase-norma, fez-se socializadora no interior do MST. Relembrando palavras de um assentado, "a formação e o sofrimento" marcaram as personalidades e deram força aos trabalhadores sem terra na sua trajetória de resistência e luta.

A identidade dos Sem-Terra configura-se de forma coletiva, baseada na luta, na organização e desenvolvimento social. Segundo Vendramini (2007, p.1405), ainda que suas trajetórias sejam determinantes no processo de organização nos acampamentos e nos assentamentos, os sem-terra constroem uma identidade na relação entre si, na luta política. Algo os identifica, os une em torno da bandeira do movimento.

Estas lutas podem ter pouco impacto, economicamente falando, ou resultados imediatos, mas têm uma grande importância política. À medida que os problemas dos sem terra, dos sem-trabalho, dos sem-rendimento, estão cada vez mais politizados, as vitimas que tem que reagir politicamente. Seus problemas passam cada vez mais pela política nacional e mundial. (VENDRAMINI, 2007, p. 1405)

O MST, através de seu trabalho coletivo, está construindo uma sociedade sobre outras bases, que não permite a desigualdade social. Assim, a autora reforça a idéia de que, o MST, está construindo uma luta radical que se manifesta no questionamento das idéias libertadoras para a construção de uma sociedade idealizada por eles. Neste sentido Vendramini (2007, p.1407) fala que

Ao analisarmos as ações do MST, observamos que ele se move num emaranhado de relações contraditórias entre si. Ele se constitui num contexto em que predominamos velhas relações de produção, mas ao mesmo tempo defende e busca implementar novas formas de organização material da vida. Isso significa dizer que ele se move entre o velho e o novo, num movimento dinâmico, só possível de ser aprendido tendo em vista a percepção das contradições sociais.

Verifica-se que o movimento acredita no poder da força comunitária para construir a história do grupo. Assim, o MST cria uma nova forma de fazer política e vida societária, os acampamentos coletivos. Deste modo, se operam dentro dos acampamentos, os ideais de mudança, através da solidariedade e ajuda mútua.

A transformação de necessidades e carências em direitos, que se opera dentro dos movimentos sociais, pode ser vista como um amplo processo de revisão e redefinição do espaço de cidadania [...]. Parece que estamos vivendo um processo de construção coletiva, de uma nova cidadania, definida por um conjunto de direitos, tomados como auto evidentes, que é pressuposto da atuação política e fundamento de avaliação da legitimidade do poder. (DURHAN, 1984, apud WARREN, 2005, p. 54)

Os acampamentos do MST são um exemplo de uma forma de redefinição da sociedade, pois adquirem através da resistência e organização, a atenção da sociedade para a construção de um modelo social ideal.

Ser acampado é ser sem terra. Estar no acampamento é resultado de decisões tomadas a partir de desejos e de interesses, objetivando a transformação da realidade. O acampado é o sem terra que tem por objetivo ser um assentado. Os acampamentos são espaços e tempos de transição na luta pela terra. São por consegüinte, realidades em transformação. São uma forma de materialização da organização dos sem terra e trazem em si, os principais elementos organizacionais do movimento. Predominantemente, são resultados de ocupações. São portanto, espaços de luta e resistência. Assim sendo, demarcam nos latifúndios os primeiros momentos do processo de territorialização da luta. As ações de ocupar e acampar interagem com os processos de espacialização e territorialização. Podem estar localizados dentro de um latifúndio ou nas margens de uma estrada, conforme a conjuntura política e a correlação de forças. Também podem ser as primeiras ações das famílias ou podem ser a reprodução dessa ação por diversas vezes. (FERNANDES, 2001, p. 75)

Verifica-se que a ocupação se faz necessária no sentido de pressionar o governo para a desapropriação de terras. Os sem terra compreendem que acampar sem ocupar, dificilmente levará à conquista da terra. Essa ação é política e se efetiva como ato de luta e resistência.

Os assentamentos conquistados ao longo dos últimos vinte anos foram implantados de forma precária. Os governos não implementaram verdadeiras políticas de reforma agrária, mas compraram terras de fazendeiros falidos e jogaram lá os sem terra para se livrar do conflito social e do desgaste da opinião pública. Assentamentos sem estradas, sem energia, sem parcelamento racional dos lotes, com terra insuficiente, longe dos centros de consumo, sem assistência técnica adequada, sem políticas de apoio é crédito, isolados entre si, etc. (GÖRGEN, 2004, p.52)

Destaque-se que a ocupação coloca como questão central a propriedade capitalista da terra, no processo de criação da propriedade familiar. Assim, pode-se compreender que a ocupação da terra, em forma de protesto, chama a atenção para aquilo que não é justo. Vieira (2004, p. 114) explica que, "nem toda sociedade é sociedade democrática. Sociedade democrática é aquela na qual ocorre real participação de todos os indivíduos." Diante disso, o autor quer dizer que todos os cidadãos devem ter acesso à cidadania, de forma igualitária para que possam participar da sociedade e viver com dignidade.

O processo de desenvolvimento, para que conduza ao bem estar e para que atenda às exigências do homem como pessoa humana, abrangendo "cada homem e todos os homens" deve ser harmônico, autêntico, democrático e solidário. Um desenvolvimento é harmônico quando se processa "em sentido global e equilibrado"; é autêntico se respeita as características do país; democrático, se realizado com a participação consciente e livre do povo"; e finalmente, solidário, quando objetiva a promoção "de todos" e não de "uns poucos". (AMANN, 2003, p. 76)

Compreende-se que os acampamentos são uma forma de pressão para reivindicar o assentamento, uma prática exclusiva do MST. Esta prática visa garantir o assentamento até que todas as famílias estejam organizadas. (FERNANDES, 2000, p. 297) fala que

A organicidade é uma característica dos movimentos socioterritoriais. É representada na manifestação do poder político e de pressão que os sem terra possuem no desenvolvimento da luta, tanto para conquistar a terra, quanto para as lutas que se desdobram nesse processo

Entende-se que os movimentos criam a sua identidade política específica, o MST, por exemplo, tem sua identidade ligada ao campo, ao trabalhador rural, a vida rural, representando através da sua identidade uma nova consciência de direitos.

Mas como chegar ao reconhecimento de um direito? A simples situação de miséria, de discriminação ou mesmo exploração não produz automaticamente este reconhecimento. E, mais ainda, como reconhecer o direito de lutar por um direito? Nesse sentido é fundamental a existência de um fator subjetivo, ou seja, o reconhecimento de sua dignidade humana, que sempre foi solopada nas classes subalternas e tem raízes no sistema escravocrata e colonial. Para a descoberta de dignidade humana dos camponeses, os trabalhos da Teologia da Libertação e respectivas pastorais têm sido fundamentais. Criam-se, assim, a consciência não apenas do direito a um direito, mas o direito e o dever de lutar por este direito e de participar em seu próprio destino. ( WARREN, 2005, p .69)

É importante ressaltar que os movimentos sociais, conforme explica Herkenhoff (2004) não se submetem aos padrões do Direito estabelecido pelo Estado. Segundo o autor, uma sociedade como a brasileira, onde milhões de pessoas estão a margem de qualquer direito, num estado de permanente negação da cidadania, o indivíduo está sempre em busca de seus direitos, para garantir sua dignidade.

Os movimentos sociais tendem a buscar a construção de uma realidade que está sempre além da realidade posta. Se a realidade posta contentasse a percepção do que é justo e bom, quer por parte do conjunto da sociedade, quer por parte de seus elementos integradores, não haveria razão de luta, e conseqüentemente, não haveria "movimento social". O que anima e da razão de ser aos "movimentos sociais" é justamente a divergência entre o "mundo posto" e um "projeto de mundo". (HERKENHOFF, 2004, p. 23)

Destaque-se, então, que os movimentos sociais, existem para questionar a realidade vivenciada e contribuir para a transformação social, contribuindo, assim, para o seu fortalecimento. Nesse sentido (Grzybowski, 1987, p. 59) afirma que

enquanto espaços de socialização política, os movimentos permitem aos trabalhadores, em primeiro lugar, o aprendizado prático de como se unir, organizar, participar, negociar e lutar; em segundo lugar, a elaboração de uma identidade social, a consciência de seus interesses, direitos e reivindicações; finalmente a apreensão crítica de mundo, de suas práticas e representações sociais e culturais.

Desta forma, verifica-se que através desta práxis, vão se constituindo novos sujeitos sociais, que auxiliam na construção de uma nova sociedade, mais justa e igualitária, para o exercício da cidadania, para que os trabalhadores rurais, adquiram consciência de cidadãos, de seus direitos. Para Grzybowski, 1987, p. 60) "aprendem a conhecer seus adversários, suas táticas, suas organizações. Todos estes aspectos são muito enfatizados pelos trabalhadores rurais de diferentes movimentos quando falam de suas histórias de luta e de sua participação." Desta forma, compreende-se, que a luta pela terra ensina a viver. Cada família que participa desta luta pela terra, têm sua história rica em acontecimentos que marcarão por toda a vida. Para eles, não há como esquecer o que vivenciaram, tanto pelo sofrimento da caminhada, quanto pela alegria da conquista da terra.

3.1 A evolução do movimento e a luta pela escola

Durante a sua caminhada, o MST constituiu uma estrutura de organização para facilitar o trabalho e a divisão das atividades, pois destaca-se que a luta pela terra é uma luta de resistência e que durante seu desenvolvimento, existia muito trabalho a fazer, desde o momento da organização de um acampamento, até depois da ocupação da terra. Segundo Fernandes (2000, p. 222) "os sem terra não são apenas excluídos da terra, também são excluídos de outros direitos básicos da cidadania. Para conquistar seus direitos, dimensionaram a luta pela terra em luta pela educação." Verifica-se que pressionam o governo, também, por moradia, por saúde, por politica agrícola, enfim por tudo que caracterize uma vida digna. Neste sentido, Cardoso ( 1985, p. 83) fala que "a relação dos MST, com a educação é uma relação baseada na luta e na busca da cidadania e da humanização do sujeito." Neste sentido, explica Gohn (1992, p.11) que, historicamente a relação movimentos sociais e educação tem um elemento de união que é a questão da cidadania.[...] no liberalismo, a questão da cidadania aparece associada à noção dos direitos."

É neste sentido que o direito coloca a educação no terreno dos grandes valores da vida e da formação humana, pois o movimento social no campo representa, segundo Arroyo (2004) uma nova consciência do direito à terra, ao trabalho, à justiça, à igualdade e a educação. Conforme Arroyo (2004, p. 73) "o conjunto de lutas e ações que os homens e mulheres do campo realizam, os riscos que assumem, mostram o quanto se reconhecem sujeitos de direitos."

Um dos traços especiais que fundamentam a luta pela escola é a identidade do movimento que busca uma educação no campo. Desta forma, explica Caldart (2002, p. 26), "somos herdeiros e continuadores da luta histórica pela educação como direito universal, de todos: um direito humano, de cada pessoa em vista do seu desenvolvimento mais pleno, e um direito social, de cidadania e de participação mais crítica e ativa na dinâmica da sociedade." Percebe-se que o MST tem uma preocupação prioritária com a escolarização da população que vive no campo. Desta maneira, que a educação para o MST, sempre teve sentido de luta na mesma intensidade que a luta pela terra. A necessidade da educação e a luta que ela ocasiona, pode gerar uma transformação da realidade social. Neste sentido, ressalta Freire (2005, p. 41)

[...] que a realidade social objetiva, que não existe por acaso, mas como produto da ação dos homens, também não se transforma por acaso. Se os homens são os produtores desta realidade e se esta, "inversão da práxis", se volta sobre eles, e os condiciona a transformar a realidade opressora é tarefa histórica, é tarefa dos homens.

O MST tem chamado a atenção dos diversos segmentos da sociedade, por trazer na sua ideologia, a luta pela terra e, juntamente com isso, a luta pela escola, tendo como base fundamental, a própria norma constitucional, garantidora do direito. Assim, percebe-se que as famílias "sem terra", se mobilizaram para conquistar a escola no campo, lutaram pela possibilidade de uma escola que assumisse a tarefa de produzir uma proposta pedagógica específica para as escolas organizadas pelo e no movimento. Destaque-se que um exemplo disso são as escolas itinerantes do movimento.

O Conselho Estadual de Educação do Rio Grande do Sul, segundo Morissawa (2001, p. 243) "aprovou, em 19 de novembro de1996, a Escola Itinerante, proposta do MST para a Educação das crianças acampadas no Estado." Esta foi que foi uma conquista histórica, obtida às custas de um longo e sofrido processo de reivindicações, como as demais propostas do Movimento.

Verifica-se que a Escola Itinerante nos acampamentos do MST estão organizadas em etapas, que correspondem ao ensino fundamental de 1ª a 5ª séries, com objetivos e conteúdos próprios de cada etapa, priorizando aqueles considerados socialmente necessários, e com sentido concreto para as vidas dos alunos.

As etapas previstas na Proposta Pedagógica da Escola Itinerante caracterizam-se por flexibilização pela integração. A organização curricular prevista a cada etapa possibilita a apreensão e a sistematização de conhecimentos conforme o processo de cada aluno, aluna. No momento em que a criança construir as referências correspondentes a cada etapa, ela passará para a seguinte, ficando claro que o ingresso ou a passagem das etapas poderá acontecer em qualquer época do ano letivo, a partir de avaliação realizada pelos professores. (MORISSAWA, 2001, p.247)

Ainda, Morissawa ( 2001) destaca que durante o ano de 1996, o MST realizou um programa de alfabetização de adultos nos assentamentos em convênio com o Ministério da Educação. Foram alfabetizados sete mil adultos e o programa recebeu premiação do UNICEF, Fundo das Nações Unidas para a Infância, destacando a educação do movimento em nível nacional.

Foi inaugurada no final de 1997 a Escola de Ensino Supletivo Josué Castro, em Veranópolis, Rio Grande do Sul, única no país que ensina Administração em Cooperativismo para assentados. Credenciada para desenvolver ensino supletivo de 1ª e 2º graus, já havia formado duas turmas em meados de 2000. Em julho de 1997, o MST realizou o 1ª Enera (Encontro Nacional de Educadores da Reforma Agrária) em convênio com a Unb ( Universidade de Brasília), a Unesco ( Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura) e o Unicef. O Encontro reuniu 700 delegados de 30 universidades de 19 estados e do Distrito Federal, além de 200 convidados. Sob o tema " Escola, terra e dignidade", o evento serviu para o intercâmbio das diversas experiências pedagógicas desenvolvidas nos acampamentos e assentamentos dos trabalhadores rurais. ( MORISSAWA, 2001, p. 244)

Durante os primeiros anos de luta, os sem terra tinham como prioridade a conquista da terra. Mas logo se compreendeu que isso não era o bastante. Verificou-se que a terra representava a possibilidade de trabalhar, produzir e viver dignamente, mas faltava-lhes um instrumento fundamental para a construção do conhecimento necessário à continuidade da luta. Deste modo, a educação tornou-se prioridade do Movimento.

É possível dividir a história das lutas em favor da escola pública, em pelo menos, quatro fases: a primeira foi o conflito entre católicos e liberais-escolanovistas, ocorrido no período que vai de 1931 a 1937, sobre as linhas que deveria assumir a política nacional de educação; a segunda gira em torno do conflito entre escola pública e escola particular e vai de 1956 a 1961, culminando com a aprovação, pelo Congresso Nacional, da Lei 4.024; a terceira corresponde ao surgimento dos "movimentos de educação popular" que vai de 1969 a 1964; finalmente a quarta, que iniciou na década de 80 e se caracteriza pela mobilização da sociedade em torno da universalização e democratização da escola. (LIBÂNEO, 1984, p. 57)

Neste sentido pode-se compreender que para o MST, a continuidade da luta exigia conhecimentos tanto para lidar com assuntos práticos (como financiamentos bancários), quanto para compreender assuntos relacionados a política e à economia. Essa preocupação abrangia principalmente os acampamentos, ( MORISSAWA, 2001, p.239) que, "ao fazer um plano de ocupação, o MST inclui nele a escola para as crianças e adultos. Os pais ficam mais estimulados pela certeza de que seus filhos teriam onde estudar, material escolar, merenda e atenção dos professores." Destaque-se que o barraco da escola no acampamento é chamado de itinerante e é construído antes do barraco de moradia, pois tem a função, também, de centro de encontros.

Há ainda, um ponto fundamental que merece aprofundamento. Segundo Grzybowski (1987) "é o que se refere ao modo como, através dos movimentos, os trabalhadores rurais se constituem em sujeitos com identidades próprias, afirmando e acentuando a sua diversidade." Verifica-se que é através do coletivo que a luta une forças. Assim, explica Rodrigues (2004, p.70) que

Sujeitos sociais organizados em entidades de classes e nos movimentos sociais utilizam-se do sindicato, do partido, da música, do teatro e da cultura popular para se contrapor às ações antidialógicas e ideológicas contidas no ensino oficial, construindo rompimentos da linha reprodutivista na educação formal. Essas ações de classe e para a classe, a que, sistematizadas e organizadas, chamamos de "educação popular", ao serem trabalhadas na escola, na comunidade, nos movimentos sociais, desencadeiam inúmeras interações educativas, produzindo novos conhecimentos e, frequentemente, opostos aos desenvolvimentos da escola formal.

Desta maneira o autor destaca que a educação pública deve servir a todos, por isso a escola assume um papel de destaque na formação do indivíduo, assumindo a tarefa de contribuir para a formação social da criança. Neste sentido, pode-se dizer que o MST luta pela escola pública.

O movimento em favor da escola pública, enquanto direito fundamental de todos os brasileiros terem acesso à educação e instrução, difunde-se hoje, por todo o país e representa, sem dúvida, um momento de amadurecimento político da geração de educadores que vem atuando nas escolas, nestes últimos tempos. ( LIBANEO, 1984, p. 57)

Verifica-se que um dos maiores desafios do Movimento foi perceber que educação estava sendo oferecida no meio rural e de que forma a implantação de uma escola mais democrática contribuiria para a formação dos Sem Terra. Segundo Arroyo (1999, p. 24) a educação no campo deve ser uma educação específica e diferenciada, isto é, alternativa. Mas, sobretudo, deve ser uma educação, no sentido amplo de "processo de formação humana."

Faz-se importante destacar que a interação campo-cidade faz parte do desenvolvimento da sociedade brasileira, só que em forma de submissão. Conforme a idéia do autor, o homem do campo foi esteriotipado pela ideologia dominante, como uma pessoa fraca e atrasada, que precisaria ser redimido pela sociedade para se integrar à totalidade do sistema social.

Há uma tendência dominante em nosso país, marcado por exclusões e desigualdades, de considerar a maioria da população que vive no campo como a parte atrasada e fora de lugar no almejado projeto de modernidade. No modelo de desenvolvimento que vê o Brasil apenas como mais um mercado emergente, predominantemente urbano, camponeses e índios são vistos como espécies em extinção. Nessa lógica, não haveria necessidades de políticas públicas específicas para essas pessoas, a não ser do tipo compensatório à sua própria condição de inferioridade e/ou diante de pressões sociais. ( KOLLING; NERY ; MOLINA, 1999, p.21)

Desta forma, que a educação existe no campo como uma importante ferramenta, promotora de desenvolvimento humano e social das crianças, visto que há um preconceito a ser quebrado e o MST, busca, através da educação, a produção de conhecimento a partir de sua própria realidade. Assim, para Caldart (2002, p.33) "a educação do campo precisa extrair as lições da pedagogia das lutas sociais que estão em sua origem e com os quais se vincula e ter intencionalidade na formação dos sujeitos destas lutas."

Verifica-se que o Movimento dos Sem Terra, sempre tratou a educação com prioridade. Segundo Morissawa (2001, p. 239) "no período 1979-1985, início do movimento social que se iniciou no Rio Grande do Sul, ao lado da luta pela terra impôs-se outra: a do desenvolvimento humano dos sem terra." A preocupação era com o futuro das crianças acampadas e de que forma se daria a educação nos acampamentos. Posteriormente, outra luta se daria para a efetivação deste direito: a conquista da escola legal e, também, o tipo de ensino a desenvolver nessa escola, que precisava ser diferente em vista das circunstâncias e do tipo de aluno.

O surgimento do setor da educação no MST deu-se no Rio Grande do Sul, mais precisamente no acampamento da Fazenda Anonni, onde se foi formada a primeira escola no campo. No que se refere a sua formalização, pode-se dizer que

O setor Nacional de Educação do MST foi formalizado em 1987, no 1ª Encontro Nacional de Educação, em São Mateus, Espírito Santo. Educadores do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Mato Grosso do Sul, Espírito santo e Bahia, estados onde o MST estava se organizando, discutiram a implementação de escolas públicas da 1ª a 4ª série, e a formação de professores para escolas de assentamentos. (MORISSAWA, 2001, p.240)

Neste encontro foram debatidas várias questões. Fernandes (2000) destaca as mais importantes para a construção do ensino no campo, entre elas: o que se pretende com as escolas dos assentamentos? Como deve ser uma escola de assentamento? Pode-se verificar que as escolas de assentamentos e acampamentos devem ser espaços de formação humana dos sujeitos que as conquistam. Desta forma explica Fernandes (2000) que não basta lutar pela escola: é preciso, também, construí-la, no sentido de elaborar experiências pedagógicas voltadas para as suas necessidades e interesses.

Insta destacar, também, outro projeto implantado pelo MST nos acampamentos e assentamentos em prol da educação das crianças. A creche idealizada pelo MST, chamada de Ciranda de Pedra, não é apenas um local para cuidar das crianças de zero a quatro anos, mas segundo explica Morissawa (2001) é um espaço educativo dirigido à garotada, no qual se aprende a cantar, desenhar, brincar, escrever e fazer teatro de acordo com a faixa etária. Também, neste sentido, é importante salientar que

A rede de creches se ampliou graças às demandas de movimentos sociais organizados que, ao final dos anos 70 e início dos 80, reivindicaram creches públicas e gratuitas nos bairros periféricos. Creche passou a ser sinônimo de atendimento à população, particularmente às vésperas dos pleitos eleitorais. Elas passaram a ter a mesma importância que tiveram as escolas primárias de subúrbios, nas décadas de 40/50. A rede pública de pré-escola, iniciada nos anos 70, também se expandiu. Infelizmente o teor predominante nas justificativas destas expansões sempre foi a educação compensatória, ou seja, para compensar carências e desvantagens sócio-culturais, sem atentar para um caráter realmente educativo dos equipamentos adequados à faixa etária (0-6 anos). ( GOHN, 1992, p. 72)

Verifica-se que a luta pela escola é uma dimensão da luta pela terra. A educação é um setor de atividade do MST, com organização deste setor, o movimento deu os primeiros passos para superar os desafios referentes ao analfabetismo e à baixa escolaridade das crianças no início de sua formação. A elaboração teórica da proposta de educação no MST, que continua sendo um desafio até hoje, teve por base essas duas questões.

Como resultado desse 1ª Encontro, o Movimento criou em 1988 o setor de Educação em vários estados, como resposta às necessidades educacionais em seus diversos assentamentos e acampamentos. Isso correspondia também à decisão do 4ª Encontro Nacional dos Sem Terra, realizado no início daquele ano, de intensificar o programa popular de educação primária e implementar a alfabetização de adultos. (MORISSAWA, 2001, p. 240)

Compreende-se que era notória a preocupação do MST, com a educação e com a formação política de seus integrantes, segundo afirma Morissawa (2001) paralelamente ao esforço de alfabetização de crianças, jovens e adultos, e à luta pela conquista da escola, verificam-se nos estados, diversos cursos de formação dirigida ao trabalho nos assentamentos. (STEIN, 1982, p. 66) a escola foi transformada na grande esperança dos pobres e subdesenvolvidos, a grande esperança dos políticos responsáveis, a esperança de justiça social, de paz, de superação da miséria material.

O problema permanece, pois, em aberto. E pode ser recolocado nos seguintes termos: é possível encarar a escola como uma realidade histórica, isto é, suscetível de ser transformada intencionalmente pela ação humana? Evitemos de escorregar para uma posição idealista e voluntarista. Retenhamos da concepção crítico-reprodutiva a importante lição que nos trouxe: a escola é determinada socialmente; a sociedade em que vivemos, fundada no modo de produção capitalista, é dividida em classes com interesses opostos; portanto a escola sofre a determinação do conflito de interesses que caracteriza a sociedade. Considerando-se que a classe dominante não tem interesse na transformação histórica da escola ( ela está empenhada na preservação de seu domínio, portanto apenas acionará mecanismos de adaptação que evitem a transformação). (SAVIANI, 1989, p.41)

Neste sentido percebe-se que a luta por uma escola democrática, se arrasta por vários anos, já que como afirma o autor, a escola foi criada durante o modo de produção capitalista, ou seja, atendia apenas aos interesses da elite. A luta por uma educação no campo então, tornou o MST alvo de repressão política, o que, segundo Morissawa (2001) obrigou o movimento a centrar esforços no trabalho e na formação e organização internas. Desta maneira, fez-se importante a criação de um Coletivo Nacional de Educação, onde foi o responsável, no período, por uma reflexão mais profunda em torno do trabalho educacional ocasionando assim, avanços pedagógicos. Conforme a idéia de Stedile (1999, p. 74) "A nossa luta é para derrubar três cercas: a do latifúndio, a da ignorância e a do capital."

A criação de um Coletivo Nacional de Educação foi responsável por vários avanços, dentre eles pode-se destacar, o primeiro curso de Magistério voltado a escolas de assentamentos. O curso foi realizado no departamento de Educação Rural da Fundep ( Fundação de Desenvolvimento Educação e Pesquisa) na Região Celeiro. A Fundep foi criada em agosto de 1989 pelos diversos movimentos sociais do campo para atender às demandas de escolarização alternativa do meio rural. Com sede atualmente no Iterra (Instituto Técnico da Capacitação e Pesquisa da Reforma Agrária), em Veranópolis, RS, o curso estava formando em 2000, sua sexta turma, com alunos de 18 estados. ( MORISSAWA, 2001, p. 241)

A proposta do MST, busca reorganizar o meio rural no Brasil, busca-se democratizar a terra e o conhecimento. Segundo Stedile, pela primeira vez aparece o acesso à educação e a organização das escolas como uma meta necessária, como parte de um programa agrário e de uma reforma agrária.

Para nós, tão importante quanto distribuir terra é distribuir conhecimento. Somos parte de um processo mais amplo de desenvolvimento do meio rural, para que consequentemente as pessoas se desenvolvam, sejam mais felizes e mais cultas, mesmo morando na roça. O Brasil tem essa visão das elites de quem mora no meio rural é atrasado. Nossa visão, com esse programa agrário, é justamente o contrário: só é possível desenvolver o Brasil, fazer com que os pobres tenham uma vida melhor, se desenvolvermos o meio rural. ( STEDILE, 2001, p.76)

É importante destacar que a escola precisa se libertar dessa ótica capitalista de educação, onde apenas e elite recebe qualidade na educação. Segundo Mello (1993, p.81) "As escolas dos países em desenvolvimento como o Brasil, podem tornar-se instituições mais comprometidas com a aprendizagem de seus alunos, desde que atuem de forma igualitária". Verifica-se que a escola pode tornar-se um lugar privilegiado de formação de conhecimento e cultura, valores e identidades das crianças. De modo que, não feche os horizontes, mas para abra-os ao mundo, desde o campo, ou desde o chão em que pisam para um novo projeto de vida.

O MST carrega a bandeira da luta popular pela escola pública como direito social e humano e como dever do Estado. Nesse sentido, ( Arroyo; Caldart; Molina, 2004, p.14) Nas últimas décadas os movimentos sociais vêm pressionando o Estado e os diversos entes administrativos a assumir sua responsabilidade no dever de garantir escolas, profissionais, recursos e políticas educativas capazes de configurar a educação no campo.

Neste sentido, os autores destacam algumas questões relativas ao ensino no campo, que faz-se importante destacar: (ARROYO; CALDART; MOLINA, 2004, p. 73) "Porque educar um trabalhador no campo, a trabalhadora, os sem terra, por quê? Porque são sujeitos de direitos. Os direitos aqui estão destacados nas paredes, destacados nas músicas nas bandeiras, na mística: terra, justiça e igualdade." Destaque-se que o MST, como um movimento social do campo, representa uma nova consciência de direitos e que a universalização da consciência dos direitos foi sempre o caminho para a universalização da educação básica no campo.

Uma primeira condição para construirmos esta escola do campo é a clareza do lugar social que a educação pode ocupar na construção de um projeto de desenvolvimento. A educação não resolve por si só os problemas do país, nem tão pouco promove a inclusão social. Ela pode ser um elemento muito importante, se combinada com um conjunto de ações políticas, econômicas e culturais, que mexam diretamente no modelo econômico. A educação não levará ao desenvolvimento do campo se não for combinada com reforma agrária e com transformações profundas na política agrícola do país. É preciso ter claro isto para não cair na antiga falácia de que a educação, por si só, pode impedir o êxodo rural, por exemplo. (ARROYO; CALDART; MOLINA, 2004, p. 53)

Destaca-se que para que haja uma boa educação no campo, faz-se necessário a aplicação de uma política agrícola capaz de dar sustentação às famílias de trabalhadores rurais, para que ocorra o desenvolvimento completo da criança no campo. Possibilitá-las escrever suas próprias histórias, é uma das tarefas da alfabetização.

Portanto, num trabalho de alfabetização, tomar o assentamento como um tema gerador implica em olhar a sua historicidade e os seus sujeitos. Implica, também, em criar situações que motivem os alfabetizandos e alfabetizandas a refletirem e rememorarem a história que construíram. E isso pode ser feito com fotos, místicas, teatros, notícias de jornais, depoimentos, fitas de vídeo, músicas, poesias. O resgate e o registro da história do assentamento pode ser feito também a partir da reflexão e análise dos diferentes momentos em que as histórias das trabalhadoras e dos trabalhadores assentados se cruzam no espaço e no tempo. É importante então que sejam criadas perguntas que ajudem os alfabetizandos a refletir sobre momentos que envolvem a formação do assentamento, que têm a ver com sua origem, sua história e sobre a construção de uma identidade, a identidade Sem Terra (VARGAS; SCHWENDLER, 2003, p. 17 )

Desta forma, pode-se compreender que a história dos assentamentos, está ligada à história dessas mulheres e desses homens, com a trajetória que elas e eles viveram mesmo antes da sua organização e participação no MST.

Neste sentido, verifica-se que no início da história do Movimento, não haviam escolas, as crianças ficavam sem estudar. Com o decorrer do tempo, foram feitas reuniões e os acampados decidiram bancar a escola. Segundo Vargas e Schwendler ( 2003, p. 103) "os pais eram quem pagavam os professores e as aulas eram nas casas. Em algumas comunidades foram feito barraco de lona ou folhas de taquara e palmeira, e até de madeira lascada". Assim, o movimento iniciou sua trajetória em busca da educação no campo. O desafio para eles é continuar ocupando a escola, para fazer dela um ambiente agradável e um espaço de formação humana.

3.2 A primeira escola fundada pelo MST no Rio Grande do Sul.

Esta escola está situada no campo, sendo resultado da luta pela terra. Verifica-se que a luta pela terra proporcionou a luta por escola, e conjuntamente com a organização de um projeto político pedagógico para o campo, onde a educação deve ser de qualidade para todos.

A primeira escola do MST, segundo Caume (2006, p. 43) "foi construída em 1986, no acampamento 15 de março, em Pontão, no Rio Grande do Sul. A Escola Estadual de Ensino Fundamental 29 de outubro, está localizada hoje, na área 09 do assentamento da antiga Fazenda Annoni", onde foram assentados os sem terra após a desapropriação da Fazenda, interior do município de Pontão. A escola pertence a 7ª Coordenadoria Regional de Educação – Passo Fundo-RS.

Verifica-se que o exercício da docência era feito por pessoas acampadas, que possuíam o curso de Magistério, licenciatura ou apenas o ensino primário completo. Destaca-se que foram estas pessoas que atuaram decisivamente para a formação da escola, que leciona apenas o ensino fundamental. A escola trabalha com a pedagogia do Movimento, o qual define que a escola deve produzir a consciência da necessidade de aprender, participando do processo educativo de forma organizada, unindo a teoria com a prática do conhecimento. Esta educação ensina para que as crianças continuem na luta e que tenham consciência do direito e o dever de estudar, para assim, poder compreender a realidade vivida e poder transformá-la.

Verifica-se que a prática pedagógica da escola, busca desenvolver ações práticas, que tem como suporte, o saber organizar-se. Neste sentido, as ferramentas usadas como suporte, são as que tem como valor básico o diálogo, a vivência do sujeito individual e coletivo, contribuindo para tornar o aluno da escola um cidadão.

Este projeto ainda firma como uma de suas especificidades a "pedagogia da terra", compreendendo que há uma dimensão educativa na relação do ser humano com a terra: terra de cultivo da terra, terra ambiente, planeta. A educação no campo é intencionalidade de educar e reeducar o povo que vive no campo na sabedoria de se ver como "guardião da terra", e não apenas como seu proprietário ou quem trabalha nela. Ver a terra como sendo de todos que podem se beneficiar dela. Aprender a cuidar da terra e aprender deste cuidado algumas lições de como cuidar do ser humano e de sua educação. ( CALDART, 2002, p.33)

Conforme o Projeto Político Pedagógico da escola, destaque-se que este segue uma metodologia que é discutida e elaborada com a comunidade escolar, conselho escolar e docentes para obter uma perfeita formação integral do aluno na construção de sua cidadania. Passa-se, agora, à discussão acerca do processo pedagógico presente no movimento, com especial atenção ao seu papel diferenciado, enquanto promotor da cidadania.


4 O PROCESSO PEDAGÓGICO DO MOVIMENTO COMO FORMADOR DE SUJEITOS SOCIAIS

Partindo de uma breve revisão da construção da identidade da criança acampada como um sujeito social, esta seção discute a pedagogia diferenciada aplicada nas escolas do Movimento, a qual busca o equilíbrio entre os conteúdos consagrados cono tradicionais e os que refletem as realidades locais. Desta forma, pode-se garantir a qualidade do ensino, estimulando iniciativas que permitem recriar a pedagogia como verdadeira ferramenta na aplicabilidade da educação no campo e para o fortalecimento da escola. Dallari (2004) explica que a educação é um processo de aprendizagem através do qual as pessoas se preparam para a vida. Nesse sentido, a educação proporciona o desenvolvimento individual da criança e de seu grupo.

4.1 A pedagogia diferenciada do Movimento dos Sem Terra

A presente seção, dedica-se a análise pedagógica da educação feita nos escolas do MST, cujo processo faz-se diferente, voltada à construção de um sujeito social. ( FREIRE; NOGUEIRA, 1991, p. 19) "entendo a educação popular como esforço de mobilização, organização e capacitação de classes populares; capacitação científica e técnica." Entende-se, então, que educação popular é uma educação criativa, dinâmica e emancipadora, que objetiva a formação de seres atuantes, que participem do processo político e que procurem formar um sujeito coletivo. ( RODRIGUES, 2004)

Compreender a pedagogia do Movimento não é colocar o acampamento como protagonista da história por falta de condições estruturais adequadas, segundo a concepção da infância moderna. O acampamento é o pano de fundo histórico, o ambiente de vivência, e precisa ser visto como o contexto no qual as crianças estão inseridas. Sua características precisam ser observadas e colocadas como fatores importantes na construção da Infância Sem Terra (FERREIRA, 2006, p. 06)

A educação é popular quando, enfrentando a distribuição desigual de saberes, incorpora um saber como ferramenta de libertação. Desta forma, para Rodrigues (2004, p. 65)

[...] o fato é que a educação popular pode ser entendida como uma atividade específica (...) ela, por outro lado, não requer ser realizada no interior do sistema educativo formal, separada do conjunto de práticas sociais dos indivíduos. Muito ao contrário, a educação popular vem sendo desenvolvida no interior das práticas sociais e políticas e é aí precisamente onde podem residir a sua força e sua incidência.

Verifica-se que falar sobre educação é falar sobre uma alternativa política e social para que um país encontre a dimensão de sua grandeza e encontre a sua dignidade. Segundo Rezende e Valdes (2006, p. 1214) "a pedagogia por sua vez, dedica-se ao estudo do método de ensino mais indicado para promover a aprendizagem de conceitos novos e cada vez mais complexos, considerados importantes para o desenvolvimento do pensamento." Nesse sentido, vislumbra-se a idéia de Chalita (2002) de que a educação pepara o ser humano para o equilíbrio de aceitar que não deve haver prevalececimento das vontades individuais de cada sujeito e que o bom senso determinará o ponto consensual entre todos.

Ao final dos anos 80 e ao longo da década de 90, surgiram as primeiras escolas no campo, em especial, nos assentamentos do MST, organizadas pelo próprio movimento. Essas escolas trouxeram novidades relacionadas à educação, sua metodologia e organização. Neste sentido, afirma Gohn ( 2001, p. 97) que "a experiência educacional dos sem-terra chegou a ganhar prêmio do UNICEF." Contudo cabe esclarecer que isso fez refletir sobre as condições de transmissão do conhecimento. Gohn (2001) explica que, muitas vezes, este acontece sob condições totalmente adversas aos padrões tradicionais de escola, eis que a educação é dada num cenário de pobreza e de dificuldades, onde a criança aprende a valorizar suas origens e buscar a transformação do meio social em que vive. Desta forma, com vontade política, determinação e muito trabalho, aliados à luta social, é possível desenvolver educação com qualidade e contextualizada para todos, independentemente da situação sócio-econômica de cada família.

A cultura deve ser protegida pelo Estado de muitas maneiras. O patrimônio cultural que constitui bagagem de um povo e sua memória, identidade e modos de ação, sua forma de criar e de resistir, tudo isso terá valor à medida que for difundido e protegido pelo conhecimento da comunidade, o que se dá, principalmente, por meio da educação. Não há justificativa aceitável para a opção por uma visão histórica eurocêntrica ou norte-americana em detrimento de tudo o que há para ser conhecido, estudado, difundido, protegido, amado da cultura do Brasil. Esse é um conceito fundamental para a educação, a difusão da cultura nacional e o respeito pela nossa história.( CHALITA, 2002, p.111)

Destaque-se que a educação visa preparar a criança para viver de maneira autônoma em sociedade. Para Dutra, Ferreira e Cláudio (2007) a sociologia da educação estuda este processo através de dois ângulos diferentes: de um lado, examinando como a educação é transmitida às pessoas e, de outro lado, examinando as instituições responsáveis pela sua transmissão. Também, imagina-se que a escola, por meio de habilidades ensinadas, seja capaz de igualizar as chances futuras de pessoas de origens sociais desiguais.Deve-se democratizar a informação em nossa sociedade, no sentido de promover a formação de opiniões e valores que são fundamentais para a organização social e política do sujeito. Conforme destaca Davis e Gatti (1993, p. 75)

[...] é no seio da escola que se encontra uma das muitas possibilidades de entrelaçamento dos processos individuais e histórico-sociais envolvidos na construção do conhecimento. Como é bem sabido, o papel da escola vai além da transmissão exclusiva de conhecimentos arbitrariamente selecionados. Por intermédio de práticas particulares de ensino, valores, hábitos, atitudes e comportamentos são também socializados. Este conjunto de ensinamentos pode ser reproduzido ou superado dependendo dos processos sociais e dos padrões de interação que o definem e lhe dão sentido.

Há no meio rural, uma mobilização no sentido de garantir a educação em uma escola diferenciada, uma escola que, segundo Caldart (2001, p. 140), "construa sua pedagogia vinculada a um movimento pedagógico mais amplo, reconhecendo-se como lugar de formação humana." No mesmo sentido, acrescenta Caldart (2001, p. 140)

[...] na experiência pedagógica do MST, a luta social aparece como base da educação dos "sem terra", exatamente porque aciona o movimento como princípio educativo, e mistura-se com outros processos básicos ou potencialmente formadores do ser humano: a relação com a terra, o trabalho,a construção de novas relações sociais de produção no campo, a vida cotidiana de uma coletividade, a cultura, a história, o estudo.

Note-se que esse movimento pedagógico organizado pelo MST, marca a educação no campo, pois difere dos moldes tradicionais de educação. Desta maneira, ensina Freire (2006, p. 28) "que a educação, portanto, implica uma busca realizada por um sujeito que é o homem. O homem deve ser o sujeito de sua própria educação."

Um aspecto problemático da questão aqui colocada é a de que, ao se falar de educação para a autonomia do sujeito, não se pode esquecer que a criança, em processos iniciais de socialização está, simultaneamente, formando a si mesma e sendo formada por estas ações educativas, onde a questão não se resume apenas em aprender a ler e escrever, mas, conforme a idéia do autor, proporcionar à criança uma alfabetização que construa sua relação com a sociedade. Neste sentido,

A alfabetização não é tratada meramente como uma habilidade técnica a ser adquirida, mas como fundamento necessário a ação cultural para a liberdade, aspecto essencial daquilo que significa ser um agente individual e socialmente constituído. Ainda da maior importância, a alfabetização para Freire é, inerentemente, um projeto político na qual homens e mulheres afirman seu direito e sua responsabilidade não apenas de ler, compreender e transformar suas experiências pessoais, mas também é recontituir sua relação com a sociedade mais ampla. (FREIRE; MACEDO, 1990, p. 07)

Verifica-se que esta pedagogia "diferenciada" age sobre aquilo que forma, produzindo um certo grau de liberdade de escolhas. Conforme Mogilka (1999) essa dialética entre a criança e aquilo que é externo ao seu eu é que permite compreender o seu desenvolvimento e estruturação.

A família, por sua vez, exerce uma importante influência sobre as crianças. É o primeiro contato social da criança com o mundo, a primeira tentativa de socialização. Todavia, torna-se insuficiente para a formação da criança como um sujeito social, pois "a família não dá conta das inúmeras formas de vivência de que todo o cidadão participa e há de participar para além dessa primeira socialização." ( CURY, 2006, p. 670). Por isso, é tão importante a instituição escolar na vida da criança, na medida em que desempenha a função de transmitir conhecimentos e valores. A escola desempenha funções importantes para a vida social do sujeito, faz parte da denominada socialização secundária. Segundo Cury (2006) a escola é uma esfera pela qual, junto com a família, a pessoa vai sendo influenciada para a vida social e formando sua personalidade.

Neste sentido, pode-se dizer que as crianças assumem um papel ativo, criativo e empreendedor, na construção da cidadania. Cidadão é aquele que tem participação na sociedade, ou seja, o ser humano é um cidadão quando tem participação integral na sociedade: participação na produção, acesso igualitário aos serviços essenciais, como educação, saúde, segurança. Segundo Boneti (1998, p. 37) "à medida que o Estado promove o desenvolvimento tecnológico, mas não democratiza o acesso a ele de forma a considerar as desigualdades de acesso, promove um processo de diferenciação social, o que pode levar a exclusão."

[...] a exclusão social, entende-se que manifesta-se no mesmo processo de seletividade, de participação da dinâmica produtiva da sociedade, faz com que o sujeito social perca também o direito ao atendimento igualitário nos serviços sociais básicos, como é o caso da educação, da saúde e da segurança, e perca o direito de ser diferente. Em síntese, a exclusão social, onde quer que ela se manifeste, resume-se na exclusão do direito à cidadania. ( BONETI, 1998, p. 39)

Destarte que, os sujeitos do Movimento, contestam a ordem social pelo conjunto, pois são mais do que uma categoria social de trabalhadores que não têm terra. São um nome que revela uma identidade, uma herança trazida e que pode ser deixada aos seus descendentes. São diferentes na educação de suas crianças, no jeito de ser da sua coletividade e que projeta valores. Estes não são os mesmos cultivados no formato atual de nossa atual sociedade. Nesse sentido, afirma Gehlen (1998, p. 137) que

Entende-se que é preciso imaginar soluções diversas para uma realidade complexa e plural. Porque, nos assentamentos, não pensar em modelos que valorizam e resgatem a experiência diversa dos agricultores, resguardando as identidades, valorizando-as, a despeito das diferentes expectativas de viabilidade competitiva e de mercados modernos? Pode-se pensar em modelo que valorize também a experiência acumulada pela tradição da subsistência familiar, com o objetivo primeiro de garantir qualidade de vida, reprodutibilidade ecológica e social e valorização da cidadania participativa desses "novos" agricultores.

A infância destas crianças é gerada sob desigualdades sociais, onde são rotulados e estigmatizados pela sociedade. Neste sentido importante analisar a afirmação de Di Pierro (1995, p. 07) que diz que

Em um país em que o acesso à educação é seletivo, guardando simetria com as profundas desigualdades geográficas e socioeconômicas, como é o caso do Brasil, a identidade político pedagógica da educação de jovens e adultos não foi construída com referência às características psicológicas ou cognitivas das etapas do ciclo de vida (juventude, maturidade, velhice), mas sim em torno de uma representação social enraizada, de um lado, no estigma que recai sobre os analfabetos nas sociedades letradas e, de outro, em uma relativa homogeneidade sociocultural dos educandos conferida pela condição de camponeses ou migrantes rurais (ou sua descendência) e trabalhadores de baixa qualificação pertencentes a estratos de escassos rendimentos.

A pedagogia pode ser feita em qualquer lugar onde o conhecimento possa ser produzido, em qualquer lugar onde exista a vontade de aprender e a vontade de ensinar. Destaque-se que os professores que lecionam para os sem-terra, recebem uma formação cuja base são os ensinamentos de Paulo Freire, unindo teoria e prática, partindo da realidade da criança. (PEREIRA et al, 2001, p. 37) "A formação dos professores se limita a um curso intensivo de três dias-oferecidos pelo MST. Este curso os prepara para ensinar aos alunos a origem, os motivos e objetivos do MST."

É desta maneira que as crianças aprendem a ter consciência de seus direitos desde a infância. Neste sentido para Torres (1987, p. 22) "a pedra fundamental do fenômeno educação popular foi colocada pelo pedagogo Paulo Freire, com seu método psicossocial de alfabetização e conscientização, que apontava para a libertação do oprimido", da forma que a pedagogia apontasse para um enfoque cultural e humanista do processo de ensino. Verifica-se que, segundo Freire e Betto (1988, p. 28-29) " a partir da aplicação do método, conscientizar é passar da consciência ingênua para a consciência crítica." Desta forma, pode-se entender que através deste método de ensino o sujeito aprende a ver o mundo e a refletir sobre ele. Neste sentido faz-se a padagogia do movimento,

[...] aquela que tem de ser forjada com ele e para ele, enquanto homens ou povos, na luta incessante de recuperação da humanidade. Pedagogia que faça da opressão e de suas causas objeto de reflexão dos oprimidos, de que resultará o seu engajamento necessário na luta por sua libertação, em que esta pedagogia se fará e refará. ( FREIRE, 1974, p. 32)

Observa-se que uma das preocupações do MST é verificar se os professores conseguem reproduzir nas crianças a ideologia do movimento. De acordo com essa ideologia a luta não é só por terra. É também por educação, igualdade e dignidade. Neste sentido (PEREIRA et al, 2001, p. 37) destacam que "o sistema de ensino aos professores, funciona através de cinco etapas. Os educadores têm uma hora por dia para estudo e planejamento. Esses professores são avaliados pelos pais e pela direção do acampamento."

Os movimentos sociais reivindicam que nos programas de formação de educadores e educadoras do campo sejam incluídos e conhecimento do campo, as questões relativas ao equacimento da terra ao longo de nossa história, as tensões do campo entre o latifúndio, a monocultura, o agronegócio e a agricultura familiar; conhecer os problemas da reforma agrária, a expulsão da terra, os movimentos de luta pela terra e pela agricultura camponesa, pelos territórios dos quilombos e dos povos indígenas. (ARROYO, 2007, p. 167)

Na luta pela efetivação desses fins, professores e alunos devem aprender a superar as dificuldades reais, principalmente as que se referem ao espaço físico das salas de aula utilizadas. (PEREIRA et al, 2001, p. 37) "Os livros didáticos utilizados bem como o espaço físico em que acontece a escola, são precários". Neste sentido, existe a necessidade de um olhar mais atento do Estado para melhorar as condições de ensino no campo, que acontece de maneira simples, porém produtiva.

Elaboram projetos, traçam estratégias de trabalho. A consciência dos fins que orientam sua atividade coloca o homem diante da possibilidade de identificar em outros homens os seus próprios propósitos, colocando-os todos em condições de comunhão, no melhor sentido do termo. A partir daí é possível pensar em uma causa comum, como por exemplo, tornar humano o mundo, fazer da escola um espaço de construção coletiva de conhecimento-um espaço de encontros e disputas, mas sempre de crescimento das pessoas. (FERREIRA, 1993, p. 5-6)

As ênfases dadas à educação como direito universal de todo cidadão significa uma grande conquista. Já se avançou muito no reconhecimento das especificidades e das diferenças e, nesse reconhecimento, a cidadania é considerada condição para os sujeitos sociais e culturais, eis que pode concretizar os direitos e torná-los reais. Neste sentido, completa (ARROYO, 2007, p.161) "[...], as escolas do campo são uma exigência e a formação específica dos profissionais do campo passa a ter sentido para a garantia dos direitos na especificidade de seus povos." Completando,

Escola do campo, no campo. A escola, a capela, o lugar, a terra são componentes de sua identidade. Terra, escola, lugar são mais do que terra, escola ou lugar. São espaços e símbolos de identidade e de cultura. Os movimentos sociais revelam e afirmam os vínculos inseparáveis entre educação, socialização, sociabilidade, identidade, cultura, terra, território, espaço, comunidade. ( ARROYO, 2007, p. 163)

Compreende-se que para a pedagogia do MST, a força que o território, a terra, o lugar tem na formação social, política, cultural, identitária dos povos do campo, representa a característica da formação do sujeito. O MST, defende, também, algumas políticas de formação.

Colocar a educação não na lógica do mercado, nem das carências, mas dos direitos dos povos do campo: direito à terra, vida, cultura, identidade, memória, educação. Nessa lógica dos direitos, situa-se dimensão política e pública da formação de profissionais. Políticas de formação afirmativas da especidade do campo. Políticas de formação a serviço de um projeto de campo. Políticas de formação sintonizadas com a dinâmica social do campo. Nunca os direitos, com destaque à educação, foram tão afirmados no campo. Nessa dinâmica, adquire novos significados a construção do sistema escolar e de um corpo de educadoras e educadores capazes de intervir com profissionalismo nessa dinâmica. ( ARROYO, 2007, p. 173-174):

Verifica-se, assim, que o MST vêm se mostrando como um grande educador do campo. As ricas experiências na formação de educadores que acontecem nos cursos de magistério, na pedagogia da terra, graduação e pós graduação, demonstram o quanto se prioriza a arte de ensinar. Ainda, cabe destacar alguns dos principais desafios do setor de educação do MST. Segundo Morissawa ( 2001, p. 246) estes implicam em

Erradicar o analfabetismo de nossas áreas de acampamento e assentamento, conquistar condições reais para que toda criança e adolescente esteja na escola, estudando. Isso implica lutar por escolas de ensino fundamental e ensino médio dentro dos assentamentos. Capacitar a habilitar professores, para que sejam respeitados enquanto sabedores das necessidades e portadores da novidade de construir uma proposta alternativa de educação popular, para que os assentados eduquem os filhos dos outros assentados.

A atuação da escola consiste, segundo Libâneo (1984), na preparação intelectual e moral das crianças para assumir uma posição na sociedade. Destaca-se que o compromisso da escola é com a cultura, pois os problemas sociais pertencem à sociedade.

A pedagogia libertária espera que a escola exerça uma transformação na personalidade dos alunos num sentido libertário e autogestionário. A idéia básica é introduzir modificações institucionais, a partir dos níveis subalternos que, em seguida, vão "contaminando" todo o sistema. A escola instituirá, com base na participação grupal, mecanismos institucionais de mudança( assembléias, conselhos, eleições, reuniões, associações etc.) (LIBÂNEO, 1984, p.36)

Verifica-se que a escola é o espaço da transformação, lugar onde a criança recebe conhecimentos e pode se emancipar para a vida em sociedade. Verifica-se que havia uma relação muito estreita entre educação e transformação da sociedade. "Portanto, haveria um tipo de educação não apenas para transformar as pessoas, mas haveria educação que refletisse com as pessoas a transformação do país inteiro". (FREIRE; NOGUEIRA, 1991)

Conhecer a centralidade da terra e do território na produção da vida, da cultura, das identidades, da tradição, dos conhecimentos...Um projeto educativo, curricular, descolado desses processos de produção de vida, da cultura do conhecimento estará fora do lugar. Daí a centralidade desses saberes para a formação específica de educadoras e educadores. (ARROYO, 2007, p. 167)

Faz-se importante destacar, também, que a escola depende da família, da sociedade, do governo, ou seja, de uma organização coletiva, comprometida com a formação e emancipação desses sujeitos sociais. Neste sentido, completa Adorno (2003, p. 143) "a educação seria impotente e ideológica se ignorasse o objetivo de adaptação e não preparasse os homens para se orientarem no mundo."

A escola e os sujeitos que nela convivem possuem sempre um potencial para a mudança, e são, em parte, autodetermináveis, isto é, possuem autonomia relativa. A escola é influenciada pelas dimensões econômica, política e cultural da sociedade. Não existe escola sem pessoas: em parte, são elas que fazem a escola ser de uma forma ou de outra, ao aceitar, resistir ou modificar as diretrizes e políticas definidas para a instituição. (MOGILKA, 2003)

Neste sentido, insta dizer que há uma necessidade de unir esforços para que a educação se efetive de maneira plena à criança. Família, estado e sociedade, precisam garantir o alcance do conhecimento, através da educação. Diante dessa situação, explicam os autores Bracht e Almeida (2006, p.140) que "é novamente a política que emerge como elemento capaz de nos proporcionar a chance de uma sociedade melhor, ou seja, uma sociedade composta de indivíduos autônomos e capazes de exercer sua indidualidade 'de facto'".

Desta forma, a educação deve ser, portanto, um direito de todos e dever do estado, por se tratar de uma prerrogativa inerente à própria condição tanto da pessoa humana quanto de cidadão, pois se revela como uma proteção de sua dignidade, sua liberdade, sua igualdade.

4.2 Educação libertadora e direitos humanos como instrumentos de libertação e emancipação

Analisar a educação como um instrumento para a emancipação social do sujeito, é ter esperança na libertação do sujeito e na verdadeira efetivação dos Direitos Humanos. Para Boff ( 2002, p. 23) "os oprimidos começam a "extrojetar" o opressor que forçadamente hospedam dentro de si. É o tempo maduro para o processo de libertação. Primeiro na mente. Depois, na organização, por fim, na prática." Nesse sentido, destaque-se que o MST busca através de suas práticas educativas, libertar seus sujeitos, desta condição de oprimidos que se encontram.

Libertação significa a ação que liberta a liberdade cativa. É só pela libertação que os oprimidos resgatam a auto-estima. Refazem a identidade negada. Reconquistam a pátria dominada. E podem constituir uma história autônoma, associada à história de outros povos livres. (BOFF, 2003, p. 23)

Destaque-se que, a libertação começa na consciência. Segundo Boff (2003, p. 18) "precisamos, antes de tudo, libertar a consciência do povo." Neste sentido, o sujeito oprimido precisa convencer-se de sua condição de oprimido, para então poder libertar-se e resgatar sua própria dignidade. Destarte que, o Movimento se liberta também, através das ações e práticas coletivas. Para Boff (2003, p. 134) foi "Paulo Freire nos deixou este legado: ninguém se liberta sozinho; libertamo-nos sempre juntos. [..] temos algo a dar e receber que somente nós podemos oferecer ao crescimento todo." Neste sentido, faz-se importante destacar, a importante ação dos Direitos Humanos na efetivação da libertação social através da educação. Cabe agora explicar um pouco mais sobre o que significam esses direitos.

A expressão Direitos Humanos é uma forma abreviada, segundo Dallari (2004) de mencionar os direitos fundamentais da pessoa humana. São considerados fundamentais porque sem eles a pessoa humana não consegue existir ou se desenvolver.

Verifica-se que os Direitos Humanos, procuram proteger o individuo, independente de seu país, grau de desenvolvimento da sociedade em que vive ou sua própria condição social. Segundo Piovesa (2006. p. 41) "a teoria universalista dos Direitos Humanos, prega que o ser humano é objeto da universalidade dos direitos humanos."

Pode-se afirmar que a evolucão histórica dos direitos humanos se deu junto com a limitação do poder. Primeiramente, cabe salientar que os Direitos Humanos eram pensados por filósofos da antiguidade, como simples expressões de pensamentos individuais. Piovesan (2006), explica que somente quando ocoreu a positivação destas teorias de direitos humanos para limitar o poder estatal é que se pode falar em Direitos Humanos como autêntico sistema de direitos, enquanto direitos positivos e efetivos. Verifica-se que as atrocidades do nazismo, praticados durante a II guerra mundial, também contribuíram para o advento dos Direitos Humanos.

[...] em 10.12.1948, é aprovada a Declaração Universal dos Direitos humanos, com marco maior no processo de reconstrução dos direitos humanos. Introduz ela a concepção contemporânea de direitos humanos, caracterizada pela universalidade e indivisibilidade desses direitos. Universalidade porque chama pela extensão universal dos direitos humanos, sob a crença de que a condição de pessoa é o requisito único para a dignidade e titularidade de direitos. Indivisibilidade porque a garantia dos direitos civis e políticos é condição para a observância dos direitos sociais, econômicos e políticos é condição para a observância dos direitos sociais, econômicos e vice-versa. Quando um deles é violado, os demais também o são. Os direitos humanos compõem assim uma unidade indivisível, interdependente e inter-relacionada, capaz de conjugar o catálogo de direitos civis e políticos ao catálogo de direitos sociais, econômicos e culturais. (PIOVESAN, 2002, p. 41)

Para se comprender o que significam os Direitos Humanos, basta saber que tais direitos correspondem às necessidades essenciais da pessoa humana, necessidades que são iguais para todos os seres humanos e que devem ser atendidas para que a pessoa possa viver com dignidade. Para Dallari (2004, p. 13) "cada pessoa humana tem sua individualidade, sua personalidade, seu modo próprio de ver e de sentir as coisas. Assim, também os grupos sociais têm sua cultura própria, que é resultado de condições sociais." Os direitos humanos representam um

[...] conjunto de valores históricos básicos e fundamentais, que dizem respeito à vida digna jurídico-político-psíquico-físico-econômica e efetiva dos seres e seu habitat, tanto daqueles do presente quanto daqueles do porvir, surgem sempre como condição fundante da vida, impondo aos agentes político-jurídico-econômico-sociais a tarefa de agirem no sentido de permitir e viabilizar que a todos seja consignada a possibilidade de usufruí-los em benefício próprio e comum ao mesmo tempo. (MORAIS, 2004, p.123)

Como se pode observar, os Direitos Humanos foram se incorporando nos ordenamentos jurídicos nacionais e internacionais, evoluindo ao longo do tempo, sendo reconhecidos nas mais diiversas fontes legislativas, inclusive, na Constituição Federal transformando-se em direitos fundamentais.

[...]"direitos fundamentais" se aplica para aqueles direitos do ser humano reconhecidos e positivados na esfera do direito constitucional positivo de determinado estado, ao passo que a expressão "direitos humanos" guardaria relação com os documentos de direito internacional, por referir-se àquelas posições jurídicas que se reconhecem ao ser humano como tal, independentemente de sua vinculação como determinada ordem constitucional, e que portanto, aspiram à validade universal, para todos os povos e tempos. (SARLET, 2003, p. 33)

Cada ser humano tem sua dignidade. Ela precisa ser respeitada e garantida através das normas constitucionais positivadas na Lei Maior. Nesse sentido, Zisman (2005, p. 39) fala que "a necessidade de respeito do homem como pessoa, leva ao entendimento de que a dignidade depende dos direitos fundamentais por parte de cada indivíduo da sociedade e também por parte do Estado."

A dignidade, como o próprio nome refere, relaciona-se com o ser humano, é inerente à ele. Desta maneira, é de suma importância para o cidadão, a aplicabilidade deste direito, já que se encontra positivado, inclusive em nossa Constituição Federal.

Art. 1ª A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípos e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: [...] III – a dignidade da pessoa humana; ( BRASIL, 1988, p. 07)

Verifica-se que o MST garante a efetivação desses direitos, através do contexto de suas lutas por emancipação social. Destarte, é através da transformação social de sua própria realidade, que se criam e recriam novos sujeitos, garantindo sua própria dignidade. Para Herrera Flores ( 2005, p. 52) "problematizar la realidad-es decir, pensar-supone, pues, crear condiciones que nos permitan un encuentro efectivo con los otros seres humanos y con lo otro: la naturaleza que nos alimenta y nos envuelve." Assim, é necessário criar condições capazes de fortalecer o vínculo entre o sujeito e a sociedade, dar-lhes condições emancipadoras para a realização pessoal e social.

Los derechos humanos como productos culturales forman parte de la tendencia humana ancestral por construir y assegurar las condiciones sociales, políticas, económicas y culturales que permiten a los seres humanos perseverar en la lucha por la dignidad, o lo que es lo mismo, el impulso vital que, en términos spinozianos, les posibilita mantenerse en la lucha por seguir siendo lo que son: seres dotados de capacidad y potencia para actuar por si mismos. ( HERRERA FLORES, 2005, p. 244)

Destarte, os direitos humanos são produtos culturais, definidos por lutas sociais comprometidas, por melhores condição de vida para o sujeito e a coletividade onde está inserido. Para Piovesan (2004, p. 125) "os direitos humanos tem em sua base o valor da dignidade humana." Porquanto, a dignidade humana, para Herrera Flores (2005, p. 28) é, "las plurales y diferenciadas formas de lucha por conseguir un lugar en el mundo y desde ahi construir las condiciones que permitan a los seres humanos sentir que su vida es una vida digna de ser vivida." Compreender o ser humano como digno, significa reconheçer a busca pela vida digna e o processo de transformar o modelo de sociedade em que vive.

Deste modo, é através da educação que o MST busca o aprimoramento das relações sociais e a libertação das condições de dominação estabelecidas pela sociedade capitalista, recriando a partir disso, uma vida digna para todos. Para, Herrera Flores, (2005, p. 117) "las luchas a partir de las cuales nombramos y transformamos las experiencias es una de las cuestiones más fundamentales a la hora de hablar y practicar lo que convencionalmente denominamos como derechos humanos." Desta maneira, os direitos humanos também apontam para a luta pela emancipação humana, contribuem para a promoção de espaços, de territórios que sejam em si mesmos libertadores.

La lucha por los derechos humanos y su garantía, han abierto espacios y opciones hacia un mundo menos injusto, como mecanismo de apelación y enfrentamiento contra la adversidad consciente e/o inconscientemente provocada desde las múltiples expressiones del poder. ( RUBIO, 2004, p. 204)

A luta pelos direitos humanos abre espaço para um mundo menos injusto, provocado pelas expressões do poder. Destarte, para o MST, a luta por uma educação libertadora, caracteriza a efetivação dos direitos humanos no movimento social, de forma que a educação libertadora, como se pode perceber, não é uma educação liberal ou tendente à liberdade. Ela questiona a relação entre as pessoas, os indivíduos com os outros indivíduos e o mundo que os envolve. Cumpre salientar que o MST fundamenta suas lutas "onde há situação de opressão, que lesa a liberdade concreta, de ser mais e de dizer, do desejo de ser mais, provoca a reação organizada contra a situação, para transformá-la, isto é, para uma verdadeira libertação." (STEIN, 1982, p.56)

Nesse sentido, quanto mais se articula o conhecimento frente ao mundo, mais os educandos se sentirão desafiados a buscarem respostas, e consequentemente quanto mais incitados, mais serão levados a um estado de consciência crítica e transformadora da realidade. Esta relação dialética é cada vez mais incorporada na medida em que, educadores e educandos se fazem sujeitos do seu processo. ( RUTKOSKI, 2006, p. 359)

Somente a educação pode libertar o sujeito da condição de excluído. Para Dussel (2002) a educação possível de libertar é aquela que parte da realidade da criança, a qual convive com estruturas de dominação que constituem o educando como oprimido. O educando, na condição de oprimido, é quem deve ser educado mais que ninguém através da conscientizacão, método utilizado por Paulo Freire na sua pedagogia libertadora, seguida pelo MST. Para Dussel (2002, p. 441) "a práxis de 'transformação' não é o lugar de uma "experiência pedagógica; não se faz para aprender; não se aprende em sala de aula com "consciência" teórica. E sim na própria práxis transformativa da 'realidade real'."

Assim, a educação libertadora é incompatível com uma pedagogia que, de maneira consciente, tem sido prática de dominação. Para Rutkoski (2006, p. 364) " a pedagogia liberal, cria um homem racional, independente e democrático, [...] dotado de dignidade, liberdade e igualdade, como toda e qualquer pessoa."

O processo transformativo das estruturas de onde emerge o novo "sujeito social" é o ponto central de sua educação progressiva, liberdade que vai se efetuando na práxis libertadora.[...] Freire pensa na educação da vítima no próprio processo histórico, comunitário e real. ( DUSSEL, 2002, p. 435)

Neste sentido, Rutkoski (2006) afirma que a liberdade só encontrará efetivação quando o oprimido tiver condições de refletir e de se descobrir como sujeito de sua própria destinação histórica. Verifica-se que a pedagogia do oprimido é, pois, instrumento de libertação de ambos, do oprimido e do opressor. "Conscientizar" a criança em seu meio transforma a sua realidade através de um processo pedagógico crítico que, para Dussel (2002, p. 437) é um "processo pelo qual o educando irá lentamente efetuando toda uma diacronia a partir de uma certa negatividade até a positividade, como um movimento espiral, de contínuas decisões, retornos, avaliações." Desta forma, percebe-se que descobrir-se oprimido só começa a ser processo de libertação quando esse descobrir oprimido se transforma em compromisso histórico.

4.3 A luta social como princípio educativo

Os movimentos sociais podem ser, também, compreendidos como uma extensão das práticas educativas, principalmente o MST. Os sem terra se educam no próprio contexto do movimento e sua atuação desencadeia uma identidade que lhe é própria, fecunda e desafiadora. Como explica Caldart (2001, p. 132),

[...] os sem terra se educam participando diretamente, e como sujeitos, das ações da luta pela terra e outras lutas sociais que aos poucos foram integrando a agenda do MST. É esta participação que humaniza as pessoas: primeiro no sentido de que devolve à vida social pessoas que estavam excluídas dela, e segundo, no sentido de que a pedagogia da luta educa para uma determinada postura diante da vida.

Este processo pode ser interpretado como um processo de formação humana, cuja matriz é o próprio princípio educativo, pois há metas, objetivos, conteúdos a serem trabalhados, capazes de envolver a criança, tornando-a protagonista de sua própria história. Caldart (2001, p. 133) fala que

[...] participar do movimento da luta vai educando um jeito específico de ser humano, que potencializa o principal traço da humanidade, que é a possibilidade de fazer-se e refazer-se a si próprio, enquanto contesta a ordem estabelecida, problematiza e se produz como sujeito da história

Desta maneira, a luta é construída sobre diferentes bases, de maneira a preocupar-se com a educação do sujeito no mesmo contexto em que vive, recriando sua própria história e contribuido para a história cultural da sociedade. Destaque-se algumas destas diferentes bases utilizada pelo MST como princípio educativo, a saber:

Da aprendizagem gerada com a experiência de contato com fontes de exercício do poder, da aprendizagem gerada pelo exercício de ações rotineiras que a burocracia estatal impõe, da aprendizagem das diferenças existentes na realidade social a partir da perçepção das distinções nos tratamentos que os diferentes grupos sociais recebem de suas demandas. (GOHN, 2001, p. 50)

Verifica-se, então, que a existência de um processo educativo no MST, faz-se no interior de processos que se desenvolvem fora das instituições escolares formais.

A obra de arte de um camponês Sem Terra não se encontra em paisagens pintadas, ou em escritos filosóficos que se tornam obras, mas na paisagem real que se torna poesia. Aquilo que é novidade na natureza para alguns, para um Sem Terra não é ou pode ter outro significado. O pôr- do -sol para muitos pode representar um fenômeno artístico, pintado pelas mãos invisíveis do criador da natureza, para o campônes pode representar apenas a fadiga de um dia duramente trabalhado, onde agora, ambos "vermelhos" de cansaço, no colo da noite adormeçerão, para renascerem no dia seguinte e dispostos, acordarem o amanhecer.( BOGO, 2000, p. 37)

Para Caldart (2000), a educação no movimento cumpre com seu papel, eis que trabalha com a questão da luta social, a qual exerce um papel educativo para as crianças. A pedagogia do MST baseia-se nos princípios do movimento de maneira que se torna uma educação libertadora para as crianças continuarem na luta e para que possam ter consciência da importância de estudar, compreendendo a realidade para, assim, poder transformá-la.

Por meio das brincadeiras, elas estabelecem vínculos sociais, ajustando-se ao grupo e aceitando a participação de outras crianças com os mesmos direitos. Acatando regras, propondo e aceitando modificações, aprendem a agir como ‘ser social’ e crescem. Rompem, dessa maneira, com a necessidade do Estado de produzir lazer, palavra que para muitos remete apenas a espetáculos públicos, geralmente realizados em áreas urbanas. (FERREIRA, 2006, p. 07)

É importante o papel da coletividade no contexto educativo das lutas, no movimento social. Percebe-se que a coletividade educa quando leva à constituição da "indentidade sem terra" nas pessoas e para além delas. Destarte, um dos grandes desafios para os sem terra foi e é o de conviver com a diversidade de sujeitos que se reunem em prol da luta pela terra. Todos com suas capacidades individuais configuram um coletivo amplo, forte e educativo.

Como as possibilidades sociais estão relacionadas com as possibilidades cerebrais, ninguém pode garantir que nossas sociedades tenham esgotado suas possibilidades de aperfeiçoamento e de transformação e que tenhamos chegado ao fim da história. Podemos esperar progresso nas relações entre humanos, indivíduos, grupos, etnias, nações. (MORIN, 2002, p. 75)

O sucesso da luta depende das competências desses sujeitos que se agregam no movimento. Falkembach (2007) explica que são vários rostos, origens e culturas, agregadas a um mesmo objetivo, fazendo com que não exista competitividade individual. Desta forma, contribuem para uma nova lógica nas relações sociais. Entre elas está a lógica da complementariedade, da ajuda mútua, da solidariedade política e da coletividade.

Ressalte-se que para Falkembach (2007, p. 150) "na trajetória do MST, a relação com o sofrimento passou a constituir-se em uma técnica de si, que não subtraiu o indivíduo do convívio, o manteve necessitado, solidário e ocupado com o outro e com o coletivo." Neste sentido, a luta surge como princípio educativo, eis que se faz socializadora, no interior do MST, associada a outras técnicas de relação consigo e com os outros, unindo experiências para a formação do indivíduo.

O coletivo possibilitou a configuração de uma força para que também lutassem contra um "eu interior" que, segundo Falkembach (2007), vez por outra recorreu ao passado de excluído, tendendo ao conformismo. Se nesta caminhada os sem terra livraram-se da impossibilidade de se reproduzirem socialmente, por outro, expuseram-se ao incerto.

Passaram a experimentar a instabilidade e a responsabilidade de viver com a tensão, já caracterizada, de manter o lado corporativo institucional do movimento, há, ainda, a dinamicidade do contexto social que os mantém frente à incerteza sobre "o quê" poderá vir a desafiá-los, a cada passo da vida social e da luta. (FALKEMBACH, 2007, p.151)

A luta como princípio educativo funciona como um ""processo de enfrentamento da realidade, dos problemas que envolvem o indivíduo, o diálogo com o meio, os desejos, as necessidades e perspectivas de mudança (STEIN, 1982, p. 56). Assim, percebe-se que a luta constante funciona como instrumento capaz de educar e modificar um mundo carente de transformações sociais.

Verifica-se, por fim, que o MST, coloca a criança como protagonista de sua própria história de vida e elas, consequentemente, devem sentir orgulho dessa condição. O coletivo infantil é prioridade no movimento. Preocupam-se em deixa-los falar, em deixá-los contestar a realidade vivida, pois este é o mundo onde a criança se desenvolverá e "se para os adultos a experiência de viver numa barraca de lona remete à precariedade, para as crianças significa a possibilidade do exercício cotidiano do brincar, sem as restrições do espaço urbano" (CORREIA; GIOVANETTI; GOUVEIA, 2004, p. 08). Nesse sentido, mesmo que as crianças não se dêem conta, elas estão na escola, escola da vida onde aprendem que é possível somar esforços e enfrentar dificuldades.

A idéia que a sociedade traz em relação aos sem terra, é a de que são apenas trabalhadores rurais sem a terra, marginalizando-os por não ter uma propriedade privada. Todavia, percebe-se que são conceitos típicos de uma sociedade capitalista que valoriza a propriedade privada, de tal modo que supera, inclusive, o da vida humana. (CALDART, 2000) Para o MST a criança figura como principal sujeito de direito, necessitando de proteção, cuidados e escolarização. Desta forma, terá condições de desenvolver-se e humanizar-se de forma completa e efetiva.

É um projeto de educação que reafirma como grande finalidade da ação educativa ajudar no desenvolvimento mais pleno do ser humano, na sua humanização e inserção crítica na dinâmica da sociedade de que faz parte; que compreende que os sujeitos se humanizam ou se desumanizam sob condições materiais e relações sociais determinadas; que nos mesmos processos em que produzimos nossa existência nos produzimos como seres humanos. ( GOHN, 2001, p. 50)

Enfim, é impossível pensar na educação do campo sem referí-las aos sujeitos concretos, históricos, que vivem e se constituem humanos. O desenvolvimento desses sujeitos do campo e no campo, exige uma formação política e moral adequada à sua realidade social. Somente assim, serão capaz de transformá-la, proporcionando a autonomia pessoal e social, assegurando a sua dignidade humana, de maneira que, o campo das lutas sociais, seja o campo próprio onde acontece a garantia desses diretos. Somente neste campo é que estes podem, realmente serem efetivados.


5 CONCLUSÃO

Na análise realizada acerca da história da educação no Brasil, pode-se perceber que, desde os seus primórdios, esta nunca foi igualitária, pois houve preocupação na maioria das vezes, apenas com a educação das elites. A educação pública foi inaugurada com a constituinte de 1823, pelo imperador Dom Pedro I e, durante sua evolução, pode-se observar que a companhia de Jesus exerceu bastante influencia na historia da educação.

O Brasil, neste período, constituía-se em uma sociedade exclusivamente agrária, que não exigia muitos conhecimentos específicos. Neste sentido, durante o século XVIII buscava o ideal de educação, uma educação gratuita e universal sob a responsabilidade do estado. Posto isso, viu-se que naquele período havia uma preocupação com a criação de escolas, mas, ainda, havia problemas com a deficiência de números de professores qualificados para trabalhar a questão pedagógica e exercer a função de ensinar. Assim, a educação, cada vez mais, vai assumindo um caráter político, devido a sua importância na formação do cidadão, além de constituir-se um forte instrumento de cultura e formação da cidadania.

O Movimento dos Sem Terra, objeto deste estudo, é fruto de um processo histórico de resistência do campesinato brasileiro. É continuação da história da luta pela terra, dos trabalhadores que não tem ou tiveram acesso a terra, configurando-se, na contemporaneidade, no mais importante movimento social no Brasil. Averiguou-se que os movimentos sociais influenciam na formação do cidadão, atuando na coletividade, fazendo com que cada indivíduo contribua com o crescimento individual e coletivo de seus integrantes. Observou-se, ademais, que a convivência coletiva proporcionada pelo MST possibilita aos seus integrantes um acúmulo de experiências, eis que a identidade dos sem terra configura-se de forma coletiva, baseada na luta, na organização e no desenvolvimento social.

Os movimentos sociais criam a sua identidade política específica e o MST tem sua identidade vinculada ao campo, ao trabalhador rural, representando uma nova consciência de direitos e contribuindo para a transformação social de seus sujeitos. Através desta práxis, vão sendo construídos novos sujeitos sociais que auxiliam, por sua vez, na construção de uma nova sociedade, mais justa e igualitária, para o exercício da cidadania.

Observou-se que a relação do MST com a educação é uma relação baseada na luta e na busca pela cidadania e pela humanização do sujeito. O movimento social do campo representa uma nova consciência do direito à terra, ao trabalho, a justiça, a igualdade. O MST mobilizou-se desde muito cedo para conquistar a escola no campo. Lutou pela possibilidade de uma escola que assumisse a tarefa de produzir uma proposta pedagógica específica organizada pelo movimento. Neste sentido, pode-se dizer que um dos maiores desafios do Movimento foi perceber a necessidade de uma educação que fosse oferecida no meio rural, ou seja, a necessidade de implantação de uma escola mais democrática que pudesse contribuir para a formação dos sem terra enquanto sujeitos.

Desta forma, verificou-se que o Movimento dos Sem terra, sempre tratou a educação como prioridade. A preocupação é com a educação das crianças e com a efetivação deste direito social, garantido pela Constituição Federal. Como sujeitos de direitos as crianças precisam, cada vez mais, aprender a ser cidadãos, compreender que a vida em sociedade depende do respeito que todos devem ter para com os outros.

O Estatuto da Criança e do Adolescente, por sua vez, reconhece as crianças como cidadãos possuidores de todos direitos e de outros direitos especiais por serem sujeitos em desenvolvimento. Averiguou-se que as ênfases dadas a educação como direito universal de todo cidadão significa uma grande conquista, pois reconhece as diferenças sociais e, por isso, uma pedagogia alternativa pode ser feita em qualquer lugar onde o conhecimento possa ser produzido, em qualquer lugar onde exista duas vontades não-excludentes: a vontade de aprender e a vontade de ensinar. Há no campo uma mobilização no sentido de garantir a educação em uma escola diferenciada, uma escola que construa uma pedagogia vinculada a um movimento pedagógico mais amplo, como lugar de formação humana. Neste sentido, faz-se uma pedagogia de maneira a preocupar-se com a educação do sujeito no contexto em que vive, recriando sua própria historia e contribuindo para a efetivação de uma pedagogia voltada para a libertação do sujeito social. A educação é, então, popular, quando, enfrentando a distribuição desigual de saberes, incorpora um saber como ferramenta de libertação.

Para analisar a educação como instrumento para a emancipação social do sujeito, há a necessidade de lutar pela efetivação dos Direitos Humanos, já que os Direitos Humanos procuram proteger o individuo independente de seu país, grau de desenvolvimento da sociedade em que vive ou sua própria condição social. Os Direitos Humanos correspondem às necessidades essenciais da pessoa humana, necessidades que são iguais para todos os seres humanos e que devem ser atendidas para que a pessoa possa viver com dignidade. O MST garante a efetivação destes direitos através do contexto de suas lutas por emancipação social, através da busca pela realização destes direitos.

Pode-se concluir, por fim, que é através da transformação social de sua própria realidade que se criam e se recriam novos sujeitos sociais comprometidos com a própria dignidade. Neste sentido, o MST busca o aprimoramento das relações sociais e a libertação das condições de dominação estabelecidas pela sociedade capitalista, recriando, a partir de sua proposta pedagógica, uma vida digna para todos. Assim, a luta pelos Direitos Humanos abre espaço para um mundo menos injusto, desenhado pelas expressões do poder. A luta por uma educação libertadora caracteriza, neste estudo, a efetivação dos Direitos Humanos no movimento social, possibilitando a libertação do sujeito da sua condição de excluído.


REFERENCIAS

ALMEIDA, Jaleione. A construção social de uma nova agricultura. Porto Alegre: Ed. UFRGS, 1998.

AMMANN, Safira Bezerra. Ideologia do Desenvolvimento de Comunidade no Brasil. 10.ed. São Paulo: Cortez, 2003.

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. História da Educação e da Pedagogia. 3.ed. São Paulo: Moderna, 2007.

ARAÚJO, Edson Cabral. (org.) Sistema de garantias e direitos: um caminho para a proteção integral. Recife: Ed. Copryrigth, 1999.

ARROYO, Miguel; BUFFA, Ester; NOSSELA, Paolo. Educação e cidadania: Quem educa o cidadão. 10.ed. São Paulo: Cortez, 2002.

ARROYO, Miguel Gonzales. A educação básica e o movimento social do campo. Brasilia: Vozes, 1999.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6023: informação e documentação: referências: eleboração. Rio de Janeiro, 2002.

_________. NBR 10520: informação e documentação: trabalhos acadêmicos. Rio de Janeiro, 2002.

_________. NBR 14724: informação e documentação: trabalhos acadêmicos. Rio de Janeiro, 2002.

BRACHT, Walter; ALMEIDA, Felipe Quintão. Emancipação e diferença na educação: uma leitura com Bauman. São Paulo: Autores Associados, 2006.

BRASIL. Estatuto da criança e do Adolescente e Legislação Pertinente. Porto Alegre: Procuradoria Geral de Justiça, 2007.

______. Constituição da República Federativa do Brasil. São Paulo: Saraiva, 2008.

BOBBIO, Norberto. O Futuro da Democracia. 7.ed. São Paulo: Paz e Terra. 2000.

BOFF, Leonardo. A águia e a galinha: uma metáfora da condição humana. Petrópolis: Vozes, 2002.

BOGO, Ademar. O MST e a Cultura. Revista Sem Terra. n.34, out. de 2000.

CALDART, Roseli. Pedagogia do Movimento Sem Terra. 2.ed. Vozes: Petrópolis, 2000.

_______. Sem terra com poesia. Petrópolis: Vozes, 1987.

CHALITA, Gabriel. Educação está no afeto. 6.ed. São Paulo: Ed. Gente, 2001.

CORREIA, Luciana; GIOVANETTI, Maria; GOUVËA, Maria; Movimentos sociais e experiência geracional: a vivëncia da infância no movimento dos trabalhadores sem terra.Disponível em: <http://www.ces.uc.pt/lab2004/pdfs/LucianaCorreia_MariaGiovanetti_MariaGouvea.pdf>Acesso em 23 ago. 2008.

COTRIM, Gilberto. História e Consciência do Brasil. 7.ed. São Paulo: Saraiva, 2001.

DALLARI, Dalmo de Abreu. Direitos Humanos e Cidadania. 2.ed. São Paulo: Moderna, 2004.

DAMASCENO, Maria N. (Coord.) Educação e Escola no campo. São Paulo: Papirus, 1993.

DI PIERRO, Maria Clara. Notas sobre a redefinição da identidade e das políticas públicas de educação de jovens e adultos no Brasil. Educ. Soc. Campinas,  v. 26,  n. 92,  2005. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script>. Acesso em: 23 ago. 2008.

DUSSEL, Enrique. Ética da Libertação: na idade da globalização e da exclusão. 2.ed. Petrópolis: Vozes, 2002.

ESTEVÃO, Carlos V. Educação, Justiça e Democracia: um estudo sobre as geografias da justiça em educação. São Paulo: Cortez, 2004.

FAVERO, Osmar. (org). Educação nas Constituições Brasileiras. 1823-1988. 2.ed. São Paulo: Autores Associados, 2001.

FERREIRA, Nilda Teves. Cidadania: uma questão para Educação. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993.

FERNANDES, Bernardo Mançano. Questão Agrária, Pesquisa e MST. São Paulo: Cortez, 2001.

FREIRE, Ana Maria Araujo. Analfabetismo no Brasil. São Paulo: Cortez, 1989.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1974.

______. Educação e Mudança. 29. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2006.

______. Pedagogia do Oprimido. 41.ed. São Paulo: Paz e Terra, 2005.

FREIRE, Paulo; NOGUEIRA, Adriano. Que Fazer : Teoria e Prática em Educação Popular. 3.ed. Petrópolis: Vozes, 1991.

FREIRE, Paulo; MACEDO, Donaldo. Alfabetização: leitura do mundo, leitura da palavra. São Paulo: Paz e Terra, 1990.

FREIRE, Paulo; FREI BETO. Essa escola chamada vida: depoimentos ao repórter Ricardo Kotscho. 6.ed. São Paulo: Ática, 1988.

GADOTTI, Moacir. História das idéias Pedagógicas. São Paulo: Ática, 2005.

_______. Pensamento Pedagógico Brasileiro. São Paulo: Parma, 2001.

GADOTTI, Moacir. Lições De Freire. Rev. Fac. Educ. São Paulo,  v. 23,  n. 1-2,   1997. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci>. Acesso em: 23 ago. 2008.

GENTILI, Pablo; FRIGOTTO, Gaudêncio (Org.) A cidadania Negada: práticas de exclusão na educação e no trabalho. 2.ed. São Paulo: Cortez, 2001.

GHIRALDELLI JUNIOR, Paulo. História da Educação. 2.ed. São Paulo: Cortez, 2002.

GOHN. Maria da Glória. Teorias dos movimentos sociais: Paradigmas clássicos e contemporâneos. 6.ed. São Paulo: Ed. Layda, 1997.

_______. Os Sem terra, ongs e cidadania. 3.ed. São Paulo: Cortez, 2003.

______, Movimentos Sociais e Educação. 4.ed. São Paulo: Cortez, 2001.

GORGEN, Sergio Antonio. O fim marcha ao coração do latifúndio. Petrópolis: Vozes, 2004.

GRZYBOWSKI, Candido. Caminhos e descaminhos dos movimentos sociais no campo. Petrópolis: Vozes, 1987.

HERKENHOFF, João Baptista. Movimentos Sociais e Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004.

HERRERA FLORES, Joaquín. Los Derechos Humanos como productos culturales: crítica del humanismo abstracto, Madrid, Catarata, 2005b.

HOUTJAGER, Peter P. Os últimos cidadãos: conflito e modernização no Brasil rural. São Paulo: Globo, 1996.

KOLLING, Edgar Jorge. et al. Por uma educação básica no campo. Brasilia: Peres, 1999.

KOLLING, Edgar Jorge; CEROLI, Paulo Ricardo; CALDART, Roseli Salete. Educação do campo: identidade e politicas publicas. Brasilia: Vozes, 2002

LIBÂNEO, José Carlos. Democratização da Escola Pública: A pedagogia critica-social dos conteúdos. 7.ed. São Paulo: Loyola, 1984.

MARTINS, José de Souza. Reforma Agrária: o impossível diálogo. São Paulo:

Edusp, 2004.

_______.Não há terra para plantar neste verão. O cerco das terras indiígenas e das terras de trabalho no renascimento político do campo. 2.ed. Petrópolis: Vozes, 1986.

MATURANA, Humberto; REZEBKA, Sima Nives. Formação Humana e Capacitação. 4.ed. Petrópolis: Vozes, 2000.

MELLO, Guiomar Varno. Cidadania e Competitividade: desafios educacionais do terceiro milênio. 5.ed. São Paulo: Cortez, 1993.

MOGILKA, Maurício. Autonomia e formação humana em situações pedagógicas: um difícil percurso. Educ. Pesqui. ,  São Paulo,  v. 25,  n. 2,   1999 .   Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&p>. Acesso em: 23 set. 2008.

MONACORDA, Mario Alighiero. História da Educação. 12.ed. São Paulo: Cortez, 2002.

MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. São Paulo: Cortez, 2001.

MORIN, Edgar; CIURAIA, Emilio Roger; Motta, Raul Domingo. Educar na era planetária: O pensamento complexo como método de aprendizagem pelo erro e incerteza. 19.ed. São Paulo: Cortez, 2003.

MORISSAWA, Mitsue. A história da luta pela terra e o MST. São Paulo: Ed. Popular, 2001.

OLIVEIRA, Silvio Luiz. Metodologia Cientifica Aplicada ao Direito. São Paulo: Thomson, 2002.

PEETERS, Francisca; COOMAN, Maria Augusta. Pequena História da Educação. 7.ed. São PAULO: Melhoramentos, 1964.

RAYS, Oswaldo Alonso. (org.) Educação e Ensino. Passo Fundo: Ed. Copyrigth., 2000.

RIZZINI, Irene. A criança no Brasil Hoje: desafio para o terceiro Milênio. Rio de Janeiro: Ed. Santa Ursula, 1993.

PEREIRA, Caroline, et al. O aprendizado num acampamento do MST in: Seminário internacional de educação: novos tempos, novos rumos, 6, 2001. Manual de resumos. Cachoeira do Sul: ULBRA, 2001.

PILETTI, Nelson; PILETTI, Claudino. História da Educação. 7.ed. São Paulo: Ática, 1997.

PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos. vol. 1, Curitiba: Juruá, 2006.

_______. Globalização econômica, integração regional e Direitos Humanos. In PIOVESAN, Flávia (coord). Direitos humanos, Globalização Econômica e Integração Regional. Desafios do Direito Constitucional Internacional. São Paulo: Max Limonad, 2002.

PIXLEY, Jorge. (coord.) Por um mundo diferente: alternativas para o mercado global. Petrópolis: Vozes, 2003.

RAYO. José Tuvilla. Educação em Direitos Humanos: Rumo a uma perspectiva Global. 2.ed. Porto Alegre: Artmed, 2004.

ROMANELLI, Otaiza de Oliveira. História da Educação no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1978.

RUA, Maria da Graça; Abramovay, Mirian. Companheiras de luta ou coordenadoras de panelas? nAs relações de gênero nos assentamentos rurais. 19. ed. Brasilia: Ed. Unesco, 2000.

SANCHEZ, David Rubio; FLORES, Joaquim Herrera; CARVALHO, Salo de. Direitos Humanos e Globalização: Fundamentos e Possibilidades desde a teoria crítica. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2004.

SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 3. ed. Revista, atual. E ampl. - Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003.

SAVIANI, Demerval. Escola e Democracia. 22.ed. São Paulo: Cortez, 1989.

SCHNEIDER, Sergio. Agricultura familiar e industrialização. 2.ed. Porto Alegre: Ed. UFRGS, 1999.

STEDILE, João Pedro; FERNANDES, Bernardo. Brava Gente: A tragetória do MST e a luta pela terra no Brasil. São Paulo: Perseu, 1999.

STEIN, Suzana Alleorng Stein. Por uma educação libertadora. 5.ed. Petropolis: Vozes, 1982.

TORRES, Rosa Maria. Aprendizaje a lo largo de la vida. Educación de Adultos y Desarrollo, Bonn, supl. 60, 2003.

_______. Educação Popular: um encontro com Paulo Freire. São Paulo: Loyola, 1987.

VENDRAMINI, Célia Regina. Educação e Sociedade. Revista de Ciência da Educação. v.28, set/dez. Campinas: Capes, 2007.

VIEIRA, Evaldo. Os Direitos e Política Social. São Paulo: Cortez, 2004.

WARREN, Ilse Sherer. Redes de Movimentos sociais. 3.ed. São Paulo: Loyola, 2005.

XAVIER, Maria Elizabete; RIBEIRO, Maria Luisa; NORONHA, Olinda Maria. História da Educação: a escola do Brasil. São Paulo: FTD, 1994.

ZART, Paulo Afonso; BONETI, Lindomar Wessler; LECHART, Noele Marie Paule; GEHLEN, Ivaldo. Os caminhos da exclusão Social. Ijuí: Unijuí, 1998.

ZISMAN, Célia Rosenthal. Estudos de Direitos Constitucionais. São Paulo: IOB Thomson, 2005.


Autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FAVARIN, Ana Paula Schmidt. A construção de sujeitos sociais. A educação das crianças no Movimento dos Sem Terra. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2731, 23 dez. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18098. Acesso em: 5 maio 2024.