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Responsabilidade civil do Estado em relação às vítimas de balas perdidas

Responsabilidade civil do Estado em relação às vítimas de balas perdidas

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É notório o crescimento da violência urbana, principalmente nas grandes metrópoles. Destaca-se como um dos aspectos desse infeliz avanço o grande número de vítimas de balas perdidas [01], que perdem suas vidas ou têm sua integridade física comprometida em decorrência de constantes confrontos, especialmente entre traficantes das favelas e policiais.

Apesar da grande divulgação nos meios de comunicação sobre o crescente número de vítimas de balas perdidas, pouco se discute acerca da responsabilidade civil do Estado em tais casos. Avolumam-se os pedidos de indenização no Judiciário, quedando parte das vítimas, entretanto, sem qualquer reparação.

Isso ocorre porque ainda existem muitas divergências envolvendo a responsabilidade civil do Estado. Não há, até o momento, uma uniformidade na doutrina acerca do alcance da norma expressa no artigo 37, § 6°, da Constituição Federal [02], em especial quando se trata de conduta omissiva do Estado.

A aludida indefinição em torno do tema responsabilidade civil do Estado acaba por gerar grandes controvérsias na jurisprudência. Por vezes, casos muito semelhantes são decididos de formas diametralmente opostas, tudo em razão da adoção de diferentes teorias pelos julgadores, o que causa incertezas jurídicas e grandes injustiças.

Veja-se, por exemplo, o que ocorre no Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Em casos envolvendo confrontos entre bandidos e policiais, algumas das câmaras cíveis entendem que a vítima, para ter direito à indenização, deve, necessariamente, comprovar que a bala que a atingiu saiu da arma de um dos policiais; outras câmaras, entretanto, em conformidade com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, entendem que seria desnecessário exigir da vítima tal prova, bastando que esta demonstre a ocorrência do confronto.

A fim de discutir essas e outras divergências em torno do tema, a pesquisa em tela busca, à luz da Constituição, compreender a teoria mais adequada à solução dos casos apresentados, esclarecendo-se, também, as divergências jurisprudenciais. Por derradeiro, apresenta o Projeto de Lei 416/2007 e busca expor brevemente o novo rumo da responsabilidade civil: a socialização dos riscos.

2. CONTEXTUALIZAÇÃO

A todo instante, os meios de comunicação transmitem notícias acerca de vítimas de balas perdidas, especialmente nas grandes cidades, como Rio de Janeiro e São Paulo.

Têm se tornado recorrentes os casos de pessoas que, caminhando nas ruas em direção ao trabalho ou à escola, ou mesmo dentro de suas casas, são atingidas por disparos de armas de fogo, advindos, na maior parte dos casos, de confrontos entre grupos rivais de traficantes ou entre traficantes e policiais. Por vezes, inocentes são atingidos em tiroteios ocorridos em perseguições da polícia a ladrões, que acontecem em ruas movimentadas das grandes cidades.

O número de vítimas de balas perdidas é alarmante. Em recente relatório temático realizado pelo Instituto de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro [03], pode-se ter uma noção do quão presente a realidade das balas perdidas está no cotidiano dos moradores das cidades, principalmente nas grandes metrópoles, onde a criminalidade e a violência por ela gerada produzem efeitos mais visíveis. E repita-se, trata-se apenas de uma noção, já que o levantamento dos dados foi feito através da análise de Boletins de Ocorrências, cuja narração dos fatos depende da subjetividade daquele que os relatou.

Dessa forma, percebe-se que em apenas alguns casos de ocorrência dos crimes de homicídio e de lesão corporal foi possível identificar se se tratava de vítima de bala perdida, o que demonstra que os dados constantes do relatório não retratam fielmente a realidade, a qual conta com muito mais casos, impossíveis de serem contabilizados, já que do Código Penal pátrio não consta o tipo penal "bala perdida".

Não obstante a ressalva quanto às estatísticas, é importante tomar conhecimento dos números obtidos com o aludido relatório temático, a fim de possibilitar a visualização do quão assustadores os números se apresentam.

Os Registros de Ocorrência mencionaram 224 (duzentos e vinte e quatro) vítimas por "bala perdida" no ano de 2006. Sendo 19 (dezenove) fatais e 205 (duzentos e cinco) não fatais. Das vítimas fatais, 13 (treze) eram do sexo masculino, entre as quais, a maioria -16 (dezesseis) - constituída por jovens e adultos acima dos 18 anos (inclusive). Verificou-se uma maior incidência de "balas perdidas" nos três primeiros meses do ano de 2006.

Os dados indicaram a Capital como a região do estado onde mais ocorreu o fenômeno. Foram 17 (dezessete) vítimas fatais e 169 (cento e sessenta e nove) vítimas não fatais ocorridas naquela região. A Baixada Fluminense veio logo a seguir com 02 (duas) vítimas fatais e 19 (dezenove) não fatais.

No mês de janeiro de 2007, houve 31 (trinta e uma) vítimas por "bala perdida". Sendo 03 (três) delas fatais e 28 (vinte e oito) não fatais. Todas as vítimas fatais mencionadas eram do sexo masculino (uma criança, um adolescente e um adulto), mortos em via pública. Das vítimas não fatais, 24 (vinte e quatro), ou 85,7%, eram homens e 25 (vinte e cinco), ou 89,3%, foram lesionadas em via pública. Com relação ao mesmo período do ano anterior, houve um acréscimo de 01 (uma) vítima fatal e de 08 (oito) vítimas não fatais. [04]

Com relação ao local de ocorrência dos fatos, apurou-se que 78,9% dos casos de vítimas fatais, em 2006, deram-se em via pública, enquanto 15,8% ocorreram no interior de residência. No concernente aos casos de balas perdidas com vítimas não fatais, 89,3% ocorreram em via pública, sendo 3,6% no interior de residência e 7,1% em local indeterminado/não mencionado. [05]

Diante dos dados supracitados, pode-se perceber, portanto, que a maioria das vítimas foi atingida por uma bala perdida em via pública, o que demonstra a periculosidade da vida moderna em sociedade, em que sequer se pode andar tranquilamente em direção ao trabalho, ou à escola, ou mesmo usufruir as horas de lazer com segurança.

Atento a essa realidade, já no ano de 1997, o cantor e compositor Gabriel O Pensador lançou seu disco Quebra-Cabeça, no qual ele incluiu a canção intitulada Bala Perdida, que bem retrata a angústia do cidadão frente à insegurança da vida na sociedade moderna, de sair de casa sem a certeza de que vai retornar pela noite, após mais um exaustivo dia de trabalho, conforme fica claro da leitura do seguinte trecho da canção:

Bom dia, mulher

Me beija, me abraça, me passa o café

E me deseja "Boa sorte"

Que seja o que Deus quiser

Porque eu tô indo pro trabalho com medo da morte

Nessas horas eu queria ter um carro-forte

Pra poder sair de casa de cabeça erguida

E não ser encontrado por uma bala perdida

[...]

Não se esqueça de botar as crianças debaixo da cama na

hora de dormir

Fica longe da janela e não abre essa porta, não

importa o motivo

Por favor, meu amor, eu não quero encontrar você morta

se eu voltar pra casa vivo

Mas se eu não voltar não precisa chorar

Porque levar uma bala perdida hoje em dia é normal

Bem mais comum do que morte natural

Nem dá mais capa de jornal

[...]

Todo dia morrem dois ou três

Eu só quero saber quando vai ser a minha vez

Onde será?

No circo, na praia, no supermercado, na mesa do bar?

Ou na fila do banco?

No trem da central?

No ponto de ônibus?

Parado no sinal?

Ou assistindo TV, na segurança do lar?

Onde será que uma bala perdida vai me achar?

[...] [06]

Da aludida canção, pode-se extrair uma constante na vida daqueles que vivem em grandes metrópoles, especialmente nas favelas controladas pelo tráfico: o medo de bala perdida.

Essa é a realidade. Inocentes têm suas vidas ceifadas em decorrência da ineficiência do Estado em controlar o tráfico de armas e de drogas, que andam juntos, em treinar os seus policiais de forma a que estes atuem com maior eficiência, garantindo a segurança da população ao realizarem operações de risco.

Acrescente-se, ainda, a timidez dos Tribunais de Justiça para condenar o Estado a pagar indenizações às vítimas, o que foge aos conceitos basilares da responsabilidade civil, já que, muitas vezes, os julgadores dão à Constituição Federal uma interpretação retrógrada e pró-Estado, quedando as vítimas sem qualquer amparo, ainda que o direito delas seja tão aclamado por aqueles que bradam com eloqüência a importância dos direitos assegurados constitucionalmente.

Não são raras as vezes em que, a despeito da regra constitucional acerca da responsabilidade civil objetiva do Estado, a jurisprudência exige da vítima a comprovação de que, em um confronto entre bandidos e policiais, a bala que a atingiu partiu da arma de um policial. Isso, é evidente, não condiz com o princípio da razoabilidade. Será razoável exigir que uma vítima, ferida por uma bala perdida advinda de um tiroteio entre bandidos e policiais, faça a prova de que a bala que a atingiu partiu da arma de um dos policiais? Será razoável deixar a vítima que não demonstre tal fato sem reparação por inexistência de nexo de causalidade? Ou será que é mais razoável que o Estado repare o dano advindo da atuação de seus agentes, que, com sua atividade geraram risco e dano para a população?

As respostas para estes questionamentos parecem lógicas e simples, mas, infelizmente, apesar do crescente número de ações judiciais pleiteando a indenização assegurada pela Constituição Federal, muitas vítimas ou as famílias das vítimas falecidas não logram êxito, tendo de suportar a perda sem qualquer reparação, motivo pelo qual se mostra imperiosa uma análise mais detalhada dos princípios, deveres e direitos constitucionais que devem ser invocados para a promoção da justiça.


3. DIREITO À VIDA

Consoante preconiza José Afonso da Silva,

Vida, no texto constitucional (art. 5°, caput), não será considerada apenas no seu sentido biológico de incessante auto-atividade funcional, peculiar à matéria orgânica, mas na sua acepção biográfica mais compreensiva. Sua riqueza significativa é de difícil apreensão porque é algo dinâmico, que se transforma incessantemente sem perder sua própria identidade. É mais um processo (processo vital), que se instaura com a concepção (ou germinação vegetal), transforma-se, progride, mantendo sua identidade, até que muda de qualidade, deixando, então, de ser vida para ser morte. Tudo que interfere em prejuízo deste fluir espontâneo e incessante contraria a vida. [07]

Dessa maneira, considerando-se a vida como o existir de um ser, no caso em tela, o ser humano, pode-se afirmar que esse direito fundamental assegurado a todos pela Constituição Federal é um direito basilar, do qual defluem todos os outros. Não haveria razão para tutelar outros bens jurídicos se a vida não estivesse protegida. E é justamente pela importância do direito à vida que o Código Penal o protege com tanta veemência, através de diversos tipos penais, considerando crime práticas como o homicídio, o aborto, o induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio, etc.

Proteger a vida, destarte, consiste não só em garantir a existência do indivíduo, mas também em resguardar a sua integridade física e moral, assegurando-lhe uma vida digna.

Garantida a vida, qualquer conduta que ponha fim a esse direito ou ao menos o restrinja, está violando a Constituição Federal, desde que não autorizada expressamente na lei. É neste contexto que se enquadra a bala perdida: mal capaz de violar a vida de forma brutal, que faz cessar a existência de centenas de inocentes todos os anos, que transforma o dia a dia de diversas famílias, seja porque perderam entes queridos, seja porque os viram ficar gravemente lesionados, ou com deficiências incorrigíveis.


4. DEVER DE PROMOVER A SEGURANÇA PÚBLICA

A Constituição Federal, em seu artigo 144 [08], impõe a segurança pública como dever do Estado e direito de todos, a fim de que se assegure a ordem pública, a incolumidade física das pessoas, bem como o patrimônio.

Mas, o que vem a ser segurança pública? No conceito de José Afonso da Silva,

Na teoria jurídica a palavra "segurança" assume o sentido geral de garantia, proteção, estabilidade de situação ou pessoa em vários campos, dependendo do adjetivo que a qualifica. [...] "Segurança pública" é manutenção da ordem pública interna. [09] (grifo do autor)

Assim, entendida a segurança pública como a manutenção da ordem pública, pode-se perceber que o Estado tem o dever constitucional de promover uma pacífica convivência social, livre de violência e, consequentemente, de crimes. Acerca do tema, prossegue José Afonso da Silva afirmando que

A segurança pública consiste numa situação de preservação ou restabelecimento dessa convivência social que permite que todos gozem de seus direitos e exerçam suas atividades sem perturbação de outrem, salvo nos limites de gozo e reivindicações de seus próprios direitos e defesa de seus legítimos interesses. Na sua dinâmica, é uma atividade de vigilância, prevenção e repressão de condutas delituosas. [10]

Consoante preceitua o já aludido artigo 144 da Constituição Federal, a manutenção da ordem pública será feita, salvo o corpo de bombeiros militares, pela polícia, seja ela federal, rodoviária ou ferroviária federal, civil ou militar. Essa polícia a que se refere o artigo 144 é

[...] a atividade da administração pública dirigida a concretizar, na esfera administrativa, independente da sanção penal, as limitações que são impostas pela lei à liberdade dos particulares no interesse da conservação da ordem, da segurança geral, da paz social e de qualquer outro bem tutelado pelos dispositivos penais [...]. [11]

O Estado, então, diante deste dever-poder de promover a segurança pública, prepara as corporações para o desempenho das funções inerentes à polícia. Sendo assim, "[...] toda forma de violência à integridade física ou mental dos cidadãos faz gerar para o Estado a responsabilidade civil indenizatória pelos danos causados" [12]. Isso ocorre porque,

Ainda que investido da função de preservar a segurança e manter a ordem social, o policial, portando arma de fogo, natural instrumento perigoso, [...] não está autorizado ao manuseio disparatado ou imprudente da mesma; de sua má utilização, resultando danos para os particulares, resulta para o ente público a obrigação de indenizar. [13]

Dessa forma, relativamente ao tema em estudo, se, em decorrência da atividade policial de combate à criminalidade, uma pessoa for atingida por um projétil de arma de fogo, o Estado será responsável pela indenização, independentemente de a vítima ou seus dependentes fazerem prova de que a bala tenha efetivamente saído da arma de um dos policiais. Basta a prova do confronto, só se eximindo o Estado do dever de indenizar se provar caso fortuito, culpa exclusiva da vítima ou fato de terceiro, desde que esse tenha sido imprevisível e inevitável, como bem ilustra o seguinte acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo,

A autora sofreu lesões no membro superior direito. Foi atingida por um projétil durante um tiroteio havido entre policiais militares e assaltantes. A menor passava pelo local. A Fazenda do Estado não nega que o evento ocorreu durante o mencionado tiroteio. Mas nega a responsabilidade, porque não se comprovou de "onde partiu a bala" que atingiu a menor (se dos revólveres dos policiais ou dos bandidos) e porque seria impossível controlar-se o armamento circulante. [...] A autora teve violado o seu direito à segurança, sendo que o Estado tem o dever de assegurar a paz, a tranqüilidade e a boa ordem aos membros da comunidade. O Estado, no caso, só se eximiria da responsabilidade se lograsse provar a culpa da vítima ou a ocorrência de caso fortuito. Em nome da culpa da vítima, cuja prova inexiste, ou admitir o infortúnio, sofrido pela autora, terceira em relação ao tiroteio, como caso fortuito, para o fim de não empenhar a responsabilidade do Estado, é inconcebível. A segurança da autora deveria igualar-se à segurança buscada pelos agentes do Estado no exercício da coercitividade, na perseguição encetada contra os mencionados bandidos. E, se o tiro proveio da arma de um dos mencionados marginais, a negligência do Estado, que deve garantir a segurança, é evidente em permitir que qualquer um porte arma de fogo e muitos dela façam uso em lugar público. [14] (grifo nosso)

Da análise do acórdão supracitado, observa-se que a polícia não tem, apenas, o dever de combater a criminalidade, mas também o de fazer com eficiência. Além disso, tendo o Estado o controle do porte de armas pelos cidadãos comuns, tem ele também o dever de evitar que as armas sejam adquiridas por aqueles que não cumprem a lei.


5. PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA

A Emenda Constitucional nº 19 de 1998 inseriu no caput do artigo 37 da Constituição Federal o princípio da eficiência para que, em conjunto com os princípios da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da legalidade, seja o núcleo central de todo serviço público prestado pela Administração.

Entende-se por princípio da eficiência a boa administração, a realização das atividades com presteza e perfeição, de forma a alcançar, através dos meios mais adequados, o fim mais vantajoso ao interesse público.

Referido princípio, consoante preceitua José dos Santos Carvalho Filho, dá aos indivíduos maiores oportunidades de cobrar do Estado a correção de tantas falhas e omissões. "Trata-se, na verdade, de dever constitucional da Administração, que não poderá desrespeitá-lo, sob pena de serem responsabilizados os agentes que deram causa à violação." [15]

Trazida a análise do princípio da eficiência para a atuação policial, deve-se entender que, em uma operação, não basta que a polícia atue dentro dos limites legais, o que não garante a ausência de danos a terceiros, ela deve, também, agir de forma eficiente, com razoabilidade, buscando atuar na prevenção e na repressão do crime sem causar danos a vítimas inocentes.


6. CONTROLE DE ARMAS

Consoante dispõe a Lei 10.826/03, no Brasil, é o Estado que tem o controle sobre registro, posse e comercialização de armas e munições.

Para se adquirir uma arma de fogo, deve-se, além de demonstrar a efetiva necessidade, cumprir os requisitos exigidos nos incisos do art. 4° da Lei 10.826/03, quais sejam:

Art. 4º [...]

I – comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral e de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal;

II – apresentação de documento comprobatório de ocupação lícita e de residência certa;

III – comprovação de capacidade técnica e de aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, atestadas na forma disposta no regulamento desta Lei.

O Estado controla, também, através do Sistema Nacional de Armas (Sinarm) a entrada de armamento do país, bem como sua fabricação e comercialização.

Disso decorre que é o Estado o responsável por controlar todo o armamento que circula no país. Todavia, não é isso que acontece.

Ao lado do tráfico de drogas, caminha o tráfico de armas. Os bandidos têm acesso a pesados armamentos, o que lhes permite travar verdadeiras guerras contra os policiais, colocando em risco a vida da população, pois são pessoas despreparadas técnica e psicologicamente para atirar.

Como bem esclarece Patrícia S. Rivero, em estudo realizado para compor o Relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Armas, realizada pela Câmara dos Deputados em 2006,

[...] armas de fogo são utilizadas pelas diferentes facções do narcotráfico, no mais das vezes nas periferias abandonadas pelo Estado, como forma de garantir e afirmar o seu poder territorial e permitir o livre comércio de drogas, enfrentando, tanto a polícia, como as facções rivais, o que estabelece nessas áreas, especialmente nas favelas do Rio de Janeiro um estado permanente de conflito armado. Como resultado, o Estado do Rio de Janeiro é a unidade da federação que apresenta as taxas mais altas de mortes por arma de fogo, e as favelas do município do Rio de Janeiro têm taxas de mortes por arma de fogo só comparáveis aos países em guerra. [16]

A utilização de armas pelos criminosos, sem qualquer controle por parte do Poder Público, portanto, apenas aumenta a responsabilidade em relação às balas perdidas, tendo em vista que o serviço defeituoso quanto ao controle das armas, permitindo que uma grade quantidade delas chegue livremente às mãos dos bandidos, demonstra a ineficiência do Estado.

Dessa forma, quando alguém é vitimado por uma bala perdida em virtude de um confronto entre policiais e bandidos, deverá o Estado ser sempre responsabilizado, tendo em vista que atuou com ineficiência na contenção do tráfico de armas, bem como na segurança da população do local, cuja vida não pode ser ceifada sob o pretexto de que é necessário combater o crime.

A necessidade de combater o crime é fato. No entanto, isso não pode ser elevado a um patamar mais alto do que a vida e a integridade física de terceiros inocentes. Isso quer dizer que a polícia precisa agir, sim, mas dentro de um padrão de segurança, que não coloque em risco tantas vidas.


7. FOCO DA ANÁLISE

Dentro do sobredito panorama, o foco da análise no presente estudo será baseado em situações hipotéticas que representam a realidade dos casos de balas perdidas. Assim, para fins didáticos, serão tomados por base as seguintes situações: a) bala perdida oriunda da arma de um policial em confronto com criminosos; b) bala perdida oriunda da arma de um criminoso em confronto com policiais; c) bala perdida oriunda de confronto entre facções criminosas rivais, sem a presença da polícia; d) bala perdida advinda de arma e local incertos.

Referidas situações serão discutidas com base nos pressupostos da responsabilidade civil apresentados, bem como nos ditames constitucionais, a fim de que se conclua pela solução mais justa em cada caso.

Além disso, considerando-se que a maior quantidade de casos envolvendo balas perdidas ocorre no Estado do Rio de Janeiro, conseqüentemente, é no Tribunal de Justiça do referido Estado que está o maior número de julgados a respeito do tema. Em razão disso, analisar-se-á a posição do aludido tribunal no concernente aos casos propostos [17].

Por fim, analisar-se-á a posição do Supremo Tribunal Federal, que, como Corte Maior do país, tem grande influência sobre o entendimento do tema nos tribunais dos Estados.


8. SOLUÇÃO DOS CASOS APRESENTADOS

8.1. Bala perdida oriunda da arma de um policial em confronto com criminosos

Imagine-se que policiais, em perseguição à bandidos que se evadiram após um assalto a banco em uma movimentada avenida do Rio de Janeiro, efetuam disparos de arma de fogo em direção aos fugitivos, a fim de detê-los, mas acabam por atingir uma criança que passava pelo local com a mãe.

Diante da adoção da teoria do risco administrativo, responde o Estado, neste caso, pelo dano que seu agente causou a terceiro inocente, com base no artigo 37, § 6° da Constituição Federal, cabendo ao Estado direito de regresso contra o policial que efetuou o disparo, se este agiu com dolo ou culpa.

No caso em tela, não há que se falar em irresponsabilidade do Estado em razão de este estar prestando, licitamente, seu dever de combate ao crime, pois a atividade do Estado, ainda que lícita, gera risco à sociedade e, portanto, ocorrendo um dano, deve a Administração Pública repará-lo.

Acrescente-se que o dever do Estado de combater a criminalidade não pode se sobrepor ao direito à vida das pessoas. Atirar na direção de bandidos em uma avenida movimentada é uma atitude descuidada, que demonstra o despreparo dos policiais e, consequentemente, a ineficiência da Administração Pública. Os fins não podem justificar os meios, nem tampouco as falhas na execução do serviço de segurança pública podem ser legitimadas sob a alegação de que, em determinada situação, era "necessário" atirar para "pegar" os bandidos.

No Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro parece não haver dúvida quanto ao dever do Estado de reparar o dano quando a bala, comprovadamente, proveio de arma disparada por agente público (conduta comissiva do agente público), consoante se infere do seguinte acórdão:

Ação indenizatória. Morte de menor que se encontrava em um bar comprando doces, vitimado por disparos de arma de fogo de agentes públicos, durante uma operação policial (blitz), próxima a favela do Jacarezinho, nesta cidade. [...] Estado-réu que invoca a licitude da conduta de seus agentes, baseando-se, principalmente, no dever de combate à criminalidade, o que o desobriga a qualquer indenização. Se a conduta comissiva do agente do Estado engendrou de forma direta ou concorrente o resultado danoso injusto a terceiro inocente, como no fato - espécie de bala perdida, a conduta ativa de agente policial na troca de tiros com bandidos evidencia no próprio fato o nexo de causalidade necessário à imposição da responsabilidade civil objetiva do Estado (art. 37,§ 6º da CR/88). Ora, o que o Estado pretende é que a força se sobreponha ao direito, que os fins justifiquem os meios e que as falhas nas tarefas que lhe são próprias sejam legitimadas, sob alegações de combate à criminalidade e estado de necessidade. [...]. [18] (grifo nosso).

Dessa forma, quando o agente público age em conduta comissiva, mesmo que o ato seja lícito, praticado em exercício regular de direito ou estrito cumprimento do dever legal, se causou de forma direta ou concorrente o resultado danoso injusto a um inocente, está configurado o nexo de causalidade, impondo-se, portanto, a responsabilidade objetiva do Estado para indenizar os danos (materiais e morais) sofridos pela vítima que não deu causa ao fato.

8.2. Bala perdida oriunda da arma de um criminoso em confronto com policiais

Infelizmente, tem se tornado lugar comum nas favelas do Rio de Janeiro as operações armadas da polícia, a fim de combater, principalmente, o tráfico de drogas. Nessas operações, ocorrem confrontos armados entre policiais e traficantes que mais parecem guerras, tamanho o arsenal de armas e munições a que tem acesso os bandidos. Nesses confrontos, muito moradores das favelas, que não têm qualquer envolvimento com o crime, inclusive crianças, são atingidas por balas perdidas.

Se, neste contexto, a bala que atingiu a vítima tiver advindo da arma de um dos policiais envolvidos no conflito, não resta dúvida acerca da responsabilidade civil da Administração Pública, conforme já explanado no item anterior. Contudo, dificuldades surgem quando a bala proveio da arma de um dos bandidos ou quando a vítima não consegue provar de qual arma partiu a bala que a atingiu.

Considerando-se que a bala seja oriunda de um disparo efetuado por um dos delinquentes, não há que se alegar fato de terceiro. Isso porque só seria possível ao Estado alegar em sua defesa o fato de terceiro, quando este tenha sido imprevisível e inevitável, o que não ocorre no caso proposto, tendo em vista que é previsível aos policiais que de um confronto armado com bandidos resulte vítimas inocentes. Neste caso, portanto, os policiais têm o dever de evitar danos a terceiros estranhos ao conflito. E, se mesmo com todos os cuidados dispensados o dano ocorrer, será a Administração Pública responsabilizada, já que o art. 37, § 6° da Constituição Federal não exige a demonstração de dolo ou culpa do agente estatal.

Não há que se cogitar, aqui, que o fato de um terceiro (bandido), durante confronto armado com policiais, ter atingido vítima inocente, rompe o nexo causal entre a conduta do agente estatal e o dano. Deve-se entender, ao contrário, que o nexo causal corresponde ao confronto em si, o qual conta com a participação de agentes do Estado, os quais não agiram com o devido cuidado, controlando a ação dos delinqüentes de forma a não atingir vítimas inocentes.

Esse entendimento, em nenhum momento confronta com a teoria do dano direito e imediato. Basta que se interprete a teoria de forma a valorizar a vítima e não o Estado. Assim, provado que o dano decorreu de um confronto entre policiais e bandidos, aí estaria o nexo causal e não, necessariamente, na prova de que a bala adveio da arma de um dos policiais.

Ressalte-se que não se está, aqui, defendendo a tese de responsabilidade sem nexo causal. Pelo contrário. O nexo estaria, sim, presente, representado pelo confronto, no qual o Estado não atuou com a eficiência necessária para impedir danos a terceiros inocentes.

O mesmo raciocínio pode ser utilizado no caso de não se provar de qual arma adveio a bala perdida, se da arma do policial ou da arma do criminoso. Estando a polícia a realizar uma operação armada, se esta não é bem sucedida e causa danos, deve a Administração Pública indenizar terceiros inocentes que tenham sofrido dano. Para tanto, cabe às vítimas, apenas, o ônus de provar a ocorrência do confronto, que corresponde ao nexo causal entre a conduta e o dano.

Exigir da vítima, para que ela tenha direito à reparação do dano, que prove que a bala partiu da arma de um dos policiais, inviabilizaria o exercício do direito constitucional à reparação do dano.

No que diz respeito à responsabilidade civil do Estado quando a bala proveio da arma de um dos bandidos envolvidos no confronto ou quando a vítima não logrou êxito em provar que a bala disparada originou-se da arma de um dos policiais, há grandes divergências no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.

Para a nona câmara cível, constando dos autos prova de que o disparo tenha sido efetuado em confronto entre policiais e bandidos, tem o Estado dever de indenizar, independente da prova de que a bala seja proveniente da arma de um dos policiais, bastando a demonstração do confronto. Outras câmaras cíveis compartilham desse entendimento, a exemplo da décima sexta e da décima oitava, conforme se infere dos seguintes acórdãos:

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ART. 37, §6º DA CRFB/88. ATO LÍCITO DA ADMINISTRAÇÃO. TROCA DE DISPAROS DE ARMA DE FOGO EM VIA PÚBLICA - BALA PERDIDA. DEVER DE INDENIZAR. […] A troca de disparos de arma de fogo efetuada entre policiais e bandidos conforme prova dos autos impõe à Administração Pública o dever de indenizar, sendo irrelevante a proveniência da bala. A conduta comissiva perpetrada, qual seja, a participação no evento danoso causando dano injusto à vítima inocente conduz à sua responsabilização, mesmo com um atuar lícito, estabelecendo-se, assim, o nexo causal necessário. [19] DESPROVIMENTO DO RECURSO. (grifo nosso)

EMBARGOS INFRINGENTES EM APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL O ESTADO ARTIGO 37, § 6º DA CF. TIROTEIO. VÍTIMA ATINGIDA POR BALA PERDIDA. CONFRONTO ENTRE POLICIAIS MILITARES E TRAFICANTES, RESULTANDO NA AMPUTAÇÃO DA PERNA DIREITA DA AUTORA. AO CONTRÁRIO DO SUSTENTADO PELO EMBARGANTE REVELA-SE DEMASIADO EXIGIR DA PARTE AUTORA A PROVA MATERIAL INDICATIVA DA ARMA DE FOGO DE ONDE TERIA PARTIDO O PROJÉTIL, SENDO SUFICIENTE A DEMONSTRAÇÃO DO CONFRONTO. […]. [20] (grifo nosso)

Direito Administrativo. Responsabilidade civil objetiva do estado. Teoria do risco administrativo. Troca de tiros entre policiais militares e traficantes. Bala perdida. Autora atingida por projétil de arma de fogo, vindo a sofrer a amputação da mão direita. Dinâmica dos fatos reveladora da inexistência de plano de segurança para a atuação dos agentes públicos. Ineficiência da conduta perpetrada pelos policiais. Patente omissão do Poder Público. Dever genérico de segurança que na hipótese mostrou-se específico. Responsabilidade objetiva do Estado. Danos materiais, morais e estéticos configurados. A taxa de juros moratórios é de 12% ao ano a partir do Novo Código Civil. Interpretação construtiva da Constituição Federal, que prima pelo indivíduo frente ao Estado. Manutenção da sentença. Desprovimento do recurso. [21] (grifo nosso)

O contrário entendem a primeira, a sexta, a sétima e a décima quarta câmaras cíveis. Defendem estas câmaras que, para responsabilizar o Estado por um dano decorrente de bala perdida originada de um confronto entre policiais e bandidos, é necessário que o autor da ação prove nos autos que a bala proveio da arma de um policial, entendimento este evidenciado nos acórdão supracitados.

EMBARGOS INFRINGENTES. RESPONABILIDADE CIVIL. AÇÃO POLICIAL. BALA PERDIDA. NEXO CAUSAL INCOMPROVADO. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. PROVIMENTO DO RECURSO. A responsabilidade do Estado, ainda que objetiva em razão do disposto no art. 37, § 6º da Constituição Federal, exige a comprovação do nexo de causalidade entre a ação ou a omissão atribuída a seus agentes e o dano. Não havendo nos autos prova de que o ferimento causado a vítima tenha sido provocado por disparo de uma das armas utilizada pelos Policiais Militares envolvidos no tiroteio, por improcedente se mostra o pedido indenizatório […]. [22] (grifo nosso).

APELAÇÃO CÍVEL. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. FERIMENTOS PROVOCADOS POR BALA PERDIDA DURANTE CONFRONTO ENTRE POLICIAIS E TRAFICANTES. AUSÊNCIA DE NEXO CAUSAL. RECURSO IMPROVIDO.[...] 2.Na hipótese vertente, durante toda a fase probatória, não ficou esclarecida a procedência do projétil que acabou por ferir os autores no interior de sua residência. 3.Assim, por mais dramática que seja a situação vivida pelos autores, como não é possível afirmar que o tiro partiu da arma de um agente público, não tem o Estado que indenizar os danos por estes sofridos.[...]. [23] (grifo nosso).

RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. BALA PERDIDA. OMISSÃO ESPECÍFICA DO ESTADO. AUSÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE. [...] inexistindo nos autos comprovação de que o projétil de arma de fogo causador do ferimento sofrido pela Apelante tenha partido de uma das armas utilizadas pelos Policiais Militares que participaram do confronto narrado na exordial, não há como se imputar ao Estado a responsabilidade pelo dano a ela causado. [...]. [24] (grifo nosso).

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INDENIZAÇÃO. BALA PERDIDA. TIROTEIO ENTRE POLICIAIS E BANDIDOS. [...] INEXISTINDO NOS AUTOS A COMPROVAÇÃO DE QUE O PROJÉTIL DE ARMA DE FOGO QUE CAUSOU O FALECIMENTO DO PAI E COMPANHEIRO DOS AUTORES TENHA PARTIDO DE ARMAS UTILIZADAS PELOS POLICIAIS MILITARES, NÃO HÁ COMO SE IMPUTAR AO APELANTE A RESPONSABILIDADE PELO DANO CAUSADO. [...]. [25] (grifo nosso).

Ao contrário do que se observa no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, não parece haver dúvidas no Supremo Tribunal Federal quanto à desnecessidade de que a vítima ou seus descendentes demonstrem que a bala partiu da arma de um policial, bastando provar a existência do confronto, o que está em consonância com os ditames constitucionais, e em especial, com a idéia de justiça, conforme se infere das seguintes decisões:

DECISÃO: RE, a, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, assim ementado - f. 215: "RESPONSABILIDADE CIVIL. ESTADO. TIROTEIO. CONFRONTO ENTRE POLICIAIS E MELIANTES. NEXO CAUSAL. INDENIZAÇÃO. DANOS MATERIAIS E MORAIS. Inteligência dos artigos 5º e 37, § 6º, da CRFB/88. A configuração do nexo de causalidade em caso de tiroteio entre policiais e meliantes atingindo vítima inocente, não se exige prova direta de projétil de arma do agente público, sendo suficiente a demonstração do embate entre eles, causa necessária dos danos injustos perpetrados a terceiro, sem o qual o fato não teria ocorrido. PROVIMENTO DO RECURSO. [...] Na linha dos precedentes, nego seguimento ao recurso extraordinário (art. 557, caput, do C.Pr.Civil). Brasília, 17 de março de 2006. Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE – Relator. [26] (grifo nosso)

DECISÃO BALA PERDIDA - TIROTEIO ENTRE POLICIAIS E MARGINAIS - RESPONSABILIDADE DO ESTADO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. [...] Ação ordinária. Danos materiais e morais. Responsabilidade civil do Estado. Responde o Estado, por culpa aquiliana, se o cidadão é atingindo no interior de seu lar, por bala perdida, em confronto entre policiais e criminosos, travado em via pública. Desnecessário o registro da ocorrência, noticiada por inúmeros órgãos da imprensa. Provimento parcial do recurso, por maioria (folha 277). A segurança pública é dever do Estado, que responde pelos danos causados aos cidadãos. A população do Estado do Rio de Janeiro, ante a deficiência da estrutura em tal campo, vive em sobressalto. A decisão impugnada se afina com a própria razão de ser do Estado, no que deve colar à vida gregária o indispensável conforto. Na espécie, por maior que possa ser a interpretação restritiva, impertinente na espécie, não há como concluir pela violação do § 6º do artigo 37 da Constituição Federal, no que proclama e assegura o direito do prejudicado, por ato de serviço do Estado, à devida indenização. O nexo de causalidade salta aos olhos, não cabendo, a esta altura, perquirir-se sobre a origem do disparo, se decorrente de arma de policial ou da bandidagem. O que surge com eficácia maior é a deficiência na prestação de um serviço essencialmente público como é o ligado à segurança. 3. Nego seguimento a este extraordinário. 4. Publique-se. Brasília, 20 de abril de 2004. Ministro MARCO AURÉLIO Relator. [27] (grifo nosso).

Da análise das citadas decisões do Supremo Tribunal Federal, portanto, infere-se que, conforme o defendido neste estudo, o nexo de causalidade estará caracterizado com a prova do confronto entre policiais e bandidos, não sendo necessário que a vítima demonstre que a munição tenha partido da arma de um dos policiais.

8.3. Bala perdida oriunda de confronto entre facções criminosas rivais, sem a presença da polícia

Visualize-se a ocorrência de tiroteio entre facções criminosas rivais, que disputam o controle do tráfico de drogas e de armas em determinada favela, sendo um trabalhador, que retornava à sua residência, atingido por uma bala perdida oriunda do fogo cruzado. Neste caso, será possível responsabilizar o Estado?

O Estado, no caso acima narrado, não poderá ser responsabilizado, porque o dano sofrido pelo trabalhador adveio de fato de terceiro, sem que tenha havido qualquer participação estatal. No entanto, tal raciocínio só será coerente com o que foi anteriormente explanado se o Estado não tenha sequer tomado conhecimento do evento ou da probabilidade de sua ocorrência (omissão genérica).

Diferentemente, se o Estado, chamado a intervir no confronto, simplesmente se omitiu, deverá ser, sim, responsabilizado, pois, aqui, se trata de omissão específica.

Ampliando a hipótese, imagine-se que a ocorrência do aludido confronto era rotineiro e, portanto, era de conhecimento dos policiais o risco que a população local corria. Neste caso, a Administração Pública tem o dever de promover operações para conter os confrontos, garantindo a segurança da população. Se não o faz com eficiência, e os confrontos continuam, deve o Estado ser responsabilizado, já que a omissão que antes se apresentava genericamente, transformou-se em omissão específica.

Outra questão de grande relevo no Rio de Janeiro são os famigerados bailes "funk". Consoante nos relata Arthur Correa Cabral, delegado de polícia do Estado do Rio de Janeiro,

Os bailes funk já funcionavam há alguns anos, mas foi em 1999 que chegaram ao auge. Não só porque começaram a aparecer muitas denúncias sobre este verdadeiro Mortal Kombat, com parentes das vítimas da violência desses bailes procurando os jornais, mas também porque a mídia, principalmente a televisão, passou a mostrá-los.

Esses bailes eram então uma novidade que começava a conquistar os jovens. Estes, cheios de energia, gostaram quando os DJs e MCs começaram a introduzir o grito de guerra nos interior dos clubes.

Surgiram daí os corredores da morte. De um lado, uma galera, do outro, a galera rival, como animais lutando por território e, no meio, uma faixa livre, terra de ninguém.

Seguranças com cassetetes se postavam, batendo nos jovens que entravam no corredor. Vez por outra, um jovem era arrebatado por uma corrente, uma onda da galera rival, e era moído de pancadas. As moças, arrastadas à força até os banheiros controlados pela galera, eram ali estupradas. [28] (grifo do autor).

Outra características dos tais bailes "funk" é o livre trânsito de traficantes, que se utilizam dos bailes para vender drogas aos jovens. Além disso, também é comum que os freqüentadores andem armados, todos prontos para atirar a qualquer sinal de "necessidade" de se defender.

E é dessa mistura de músicas que fazem apologia ao crime, drogas e armas que acabam ocorrendo diversas confusões, as quais, por vezes, atingem pessoas inocentes, que sequer participavam das festas. Moradores das redondezas dos bailes vivem assustados, com medo das balas perdidas oriundas dos confrontos entre as "galeras rivais".

E será que se pode considerar como caso fortuito o fato de uma bala perdida atingir um morador, que sequer havia saído de sua casa, mas que acabou sofrendo as conseqüências de morar próximo a um dos tantos locais onde os "funkeiros" se reúnem? É claro que não.

Para a polícia, é perfeitamente possível prever e evitar os constantes tiroteios que ocorrem nos bailes "funk", pois não foge do conhecimento geral de que os locais são palcos de vários conflitos armados entre grupos rivais, configurando-se, portanto, a omissão estatal, o que gera para a Administração Pública a responsabilidade civil.

Mais uma vez aqui, não se pode cogitar de ocorrência de omissão genérica, pois esta se refere ao dever de segurança dos cidadãos em geral. O fato de os bailes "funk" serem publicamente conhecidos como locais de reunião de todo tipo de gangue, gera para o cidadão o direito de exigir a proteção do Estado, a fim de garantir o direito à vida e à segurança pública.

Se o Estado já perdeu o controle da preservação da ordem pública, deixa clara a sua omissão (específica).

Acrescente-se, inclusive, que muitos policiais ficam até receosos de atuar no combate às gangues que freqüentam os bailes, tamanho o arsenal bélico possuído pelos marginais.

O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, ao decidir caso de bala perdida decorrente de brigas em bailes "funk", que acabou por atingir pessoa inocente, que estava dentro de casa, assim decidiu:

Responsabilidade Civil. Dever do Estado de dar segurança aos cidadãos ordeiros e que pagam impostos, cujos recursos são utilizados para outros fins. Bala perdida decorrente de briga em bailes FUNK, cujas gangues, que, neles, se reúnem, após a sua realização, passam a agredir-se, mutuamente, visando a obtenção da liderança. Resultados, altamente, danosos para a sociedade ante a omissão da autoridade competente. Vítima que ficou paraplégica. Pretensão de receber do Estado o ressarcimento de danos materiais e moral. Improcedência do pedido. Inconformismo da autora. Provimento do recurso. Não obstante tratar-se de responsabilidade objetiva do Estado, na forma do § 6º, do artigo 37, da Constituição Federal, tem-se que, na espécie, restou, amplamente, comprovada a sua OMISSÃO, no que tange à segurança pública dos cidadãos, que constitui seu primordial dever preservar, considerando que, como é público e notório, nos bailes FUNK, há, via de regra, brigas violentas de gangues, cujos integrantes andam sempre armados, sem que a autoridade policial se faça presente para coibir o respectivo porte e o conseqüente uso ilegal, quase sempre trágico às pessoas, que nada têm a ver com essas badernas e sobre as quais recaem os atos de vandalismo incontido. Não constitui, como é de obviedade gritante, caso fortuito aquele que é previsível e pode ser evitado, desde que o ESTADO não se omita e exerça, nos locais, sabidamente, perigosos, a sua autoridade, como agente responsável e garantidor da segurança pública. Se já perdeu tal autoridade, deve responder por todos os danos causados aos cidadãos, que forem vítimas de sua inércia. [29] (grifo nosso).

Diante disso, chama a atenção a necessidade de se reverter a discussão no que concerne à violência urbana, tirando o foco dos bandidos, tão protegidos pelos famigerados direitos humanos, e passando a se preocupar com as vítimas e suas famílias, que sofrem com a ineficiência do Estado, não importando, portanto, quem acionou o gatilho, mas quem sofreu as conseqüências do disparo.

8.4.Bala perdida advinda de arma e local desconhecidos

Para a compreensão do caso proposto, imagine-se uma pessoa que assiste tranquilamente a seu programa favorito na televisão, sentada no sofá de sua casa, quando, inesperadamente, é atingida por uma bala perdida, sem que tenha sido possível identificar a procedência do disparo.

Na aludida situação, com base na teoria do risco administrativo, não seria possível responsabilizar objetivamente o Estado, pois o fato poderia ser enquadrado como caso fortuito, o que funcionaria como uma excludente de responsabilidade, já que não há como provar o nexo causal entre a atuação ou a omissão estatal e o dano.

Responsabilizar o Estado neste caso seria alegar que este cometeu uma omissão genérica, não promovendo adequadamente a segurança pública dos cidadãos, o que não é aceito pela doutrina e pela jurisprudência pátrias.

Já decidiu o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de janeiro que, tratando-se de responsabilidade por danos decorrentes de balas perdidas de origem totalmente ignorada, falta nexo de causalidade entre a ação ou omissão estatal e o evento danoso. E, sob pena de tornar o Estado segurador universal, não cabe a ele a responsabilidade civil pela reparação do dano. É o que se infere do seguinte acórdão:

Apelação Cível. Responsabilidade civil do Estado. Bala perdida. Apelante que foi atingido na porta de seu bar, sem saber de onde veio o tiro. Sentença que julgou o pedido improcedente, adotando entendimento de ser a responsabilidade subjetiva, no caso de omissão do Estado. O par. 6. do art. 37 da CF/88 estabelece a responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas de direito público, sem distinção entre a conduta comissiva ou omissiva de seus agentes, mas não adota a teoria do risco integral, não sendo o Estado garantidor universal. No caso, não há provas de que houvesse troca de tiros entre policiais e marginais, ou de onde teria sido efetuado o disparo, afastando a conduta de algum agente estatal. Analisada a omissão quanto à segurança pública, não pode o Estado estar onipresente, pelo que não havendo prova de que foi chamado a agir e se omitiu, não é de se reconhecer a responsabilidade pela omissão genérica, por ausência de culpa e de nexo causal. [...] Recurso não provido. [30] (grifo nosso).

Entretanto, se, no futuro, o ordenamento jurídico adotar a teoria do risco social, melhor explanada no item 9 do presente estudo, será possível à vítima receber uma indenização em tais casos, pois a não atuação do Estado, mesmo que genericamente considerada, foi a responsável pela quebra da harmonia social, devendo-se, por conseguinte, dividir o ônus entre toda a coletividade, não sendo justo que a vítima arque sozinha com os custos da violência.

É possível que se sustente, também, a responsabilização civil do Estado pelos danos causados por balas perdidas de origem desconhecida, quando, pelas circunstâncias de tempo, lugar e forma de execução sempre repetidas, elas se tornem previsíveis e evitáveis, não se inserindo no conceito de caso fortuito ou força maior. [31] Neste caso, a omissão estatal passará a ser específica, pois o Estado deveria ter agido para evitar o resultado desastroso, mas se omitiu, motivo pelo qual deverá ser responsabilizado.


9. PROPOSTA DE MUDANÇA LEGISLATIVA

Diante do crescente número de casos de vítimas de balas perdidas noticiados, foi proposto o PL 416/2007 [32], de autoria do Deputado Federal Flávio Dino.

Referido Projeto de Lei tem por objetivo garantir às vítimas de balas perdidas decorrentes de conflitos entre policias e terceiros a reparação do dano sofrido. Da justificação do PL 416/2007 consta que

Nas últimas semanas, agravou-se um persistente problema derivado da atuação das forças de segurança pública: pessoas inocentes sendo vítimas de disparos de armas de fogo efetuados em conflitos com bandos armados. São as vítimas das chamadas "balas perdidas". É certo que os agentes policias têm o direito-dever de combater os bandos armados e de se defender quando atacados. Contudo, tais ações têm de ser efetuadas com razoabilidade, a fim de que direitos fundamentais de terceiros não sejam sacrificados.

O presente projeto visa compelir à reorientação das ações das forças de segurança, por força da imposição célere de ônus econômicos, com evidentes repercussões políticas.

De outra face, a proposição objetiva abreviar a reparação dos danos sofridos pelas vítimas, hoje dependentes de uma longa solução pela via judicial (embora com 100% de certeza de êxito), agravando a situação já lesiva aos seus direitos.

A proposta ampara-se nos artigos 5°, V e LXXVIII, e 37, § 6°, da Constituição Federal, bem como no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil.

Assim, aprovado este projeto, as vítimas de balas perdidas terão direito a receber indenização, a qual deverá ser paga pela União, pelos Estados ou pelo Distrito Federal sempre que o dano decorrer de confrontos entre terceiros e forças policiais, dispensando-se a demonstração da culpa, consoante preconiza expressamente o artigo 1° do PL 416/2007, assim redigido:

Art. 1°. A obrigação de reparar os danos sofridos por vítimas de disparos de armas de fogo, decorrentes de conflitos envolvendo terceiros e forças policias, caberá à União, ao Estado ou ao Distrito Federal, independente da demonstração de culpa.

Aludido direito à reparação seria recebido administrativamente, não sendo necessário, portanto, recorrer ao Poder Judiciário, tão conhecido por sua morosidade, o que é regulado pelo artigo 2° do projeto de lei, segundo o qual "A reparação será feita mediante processo administrativo e abrangerá danos materiais e morais".

Ressalte-se que, mesmo cabendo à Administração Pública a obrigação de reparar o dano, teria esta o direito de regresso contra o culpado em caso de sua identificação (artigo 4° do PL 416/2007 [33]).

O PL 416/2007, destarte, está em consonância com a disposição constitucional do artigo 37, § 6°, tão comentado no decorrer deste estudo, inovando, apenas, no concernente ao pagamento da indenização, o qual seria feito administrativamente, garantindo-se, assim, a celeridade dos pagamentos.


10. NOVO RUMO DA RESPONSABILIDADE CIVIL – SOCIALIZAÇÃO DOS RISCOS

O Direito evolui de acordo com os avanços da sociedade. Mudanças no cenário político, econômico e social ensejam alterações normativas capazes de acompanhar as novas pretensões coletivas. Na responsabilidade civil, o aumento do risco social também encaminha as teorias e as normas para uma nova dimensão: a socialização dos riscos.

Na socialização dos riscos, também conhecida como teoria do risco social, o enfoque da responsabilidade civil sai do autor do ilícito e passa para a vítima do dano. O dano, assim, seria não mais da vítima, mas de toda a coletividade, que teria o dever de suportá-lo, socializando-o.

Assim, o Estado teria o dever de manter o equilíbrio social, pois a quebra desse equilíbrio gera um dano, cuja reparação seria de sua responsabilidade, independente de ter havido uma conduta humana atribuível ao Estado.

Através dessa teoria, a vítima nunca ficaria sem indenização, ainda que não identificado o autor do dano, ou em caso de insolvência deste. Toda a sociedade, representada pelo Estado, arcaria com o prejuízo sofrido pela vítima.

No Brasil, a socialização dos riscos pode ser visualizada, por exemplo, no seguro obrigatório dos proprietários de veículos automotores, o DPVAT (Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via Terrestre) e no seguro contra acidente de trabalho.

Neste contexto, seria possível que as vítimas de balas perdidas recebessem uma indenização do Estado quando a bala tiver origem desconhecida ou mesmo quando advier de confrontos em que os policiais não tenham participado, mantido o direito estatal de regresso contra o real causador do dano, caso identificado.


11. CONCLUSÕES

A questão das balas perdidas, em decorrência do aumento da violência urbana, passou a fazer parte do cotidiano das pessoas, especialmente dos moradores das grandes cidades. Isso decorre da falta de respeito e proteção à vida, da omissão do Estado no controle de armas, da ineficiência das ações policiais em promover a segurança pública.

Tudo isso acaba por gerar uma situação que já está chegando a níveis alarmantes, conforme retratam diariamente as manchetes dos jornais, especialmente nas grandes metrópoles: adultos e crianças atingidos no caminho do trabalho ou da escola; moradores das regiões onde impera o tráfico de drogas atingidas dentro de seus lares; população assustada.

Quando as questões envolvendo balas perdidas chegam aos tribunais, especialmente no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ/RJ), Estado este com o maior número de casos, as vítimas e seus familiares ainda têm de enfrentar outra batalha: a resistência em se conceder às vítimas o direito de receber do Estado indenização pelos danos decorrentes das balas perdidas, direito este, aliás, constitucionalmente assegurado.

Em se tratando de bala perdida que, comprovadamente, partiu da arma de um policial, não existe grande problema no TJ/RJ em se reconhecer o direito à indenização, tendo em vista que a conduta comissiva do agente estatal não gera grandes controvérsias.

Diferentemente ocorre quando, em decorrência de um confronto entre criminosos e policiais, uma vítima inocente é atingida por uma bala disparada por um dos bandidos, ou quando não se logrou êxito em provar de que arma partiu a bala. Nestes casos, ainda há grande resistência em se reconhecer a responsabilidade civil objetiva do Estado. Os julgadores do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro se dividem. Algumas câmaras cíveis entendem que, para ter direito à indenização, as vítimas ou seus familiares devem comprovar que a bala teria, inequivocamente, partido da arma de um dos policiais envolvidos no tiroteio. Outras câmaras, ao contrário, entendem que basta a comprovação do confronto para a responsabilização do Estado, já que este teria sido ineficiente no exercício da uma de suas atividades que gera risco: a policial.

Apesar da aludida divergência, parecem estar com a razão aquelas câmaras cíveis que entendem bastar à vítima a prova do confronto, pois seria muito forçoso exigir que esta provasse de que arma efetivamente a bala saiu. Esse entendimento está em consonância não só com a norma constitucional do artigo 37, § 6° da Constituição Federal, como também com a noção de justiça, motivo pelo qual foi adotado pelo Supremo Tribunal Federal.

No concernente às balas perdidas decorrentes de confrontos entre facções criminosas rivais, deve-se entender pela responsabilização do Estado quando este se omitiu no combate aos criminosos, cujos confrontos eram constantes e sabidos, não se enquadrando, por conseguinte, no conceito de caso fortuito.

Finalmente, no que se refere às balas perdidas decorrentes de local e arma desconhecidos, na etapa evolutiva em que se encontra a legislação pátria, esta situação ainda se configura como caso fortuito, pois, neste caso, responsabilizar o Estado seria considerá-lo segurador universal. No entanto, o futuro da responsabilidade civil aponta para a possibilidade de se adotar a teoria do risco social, a qual preconiza que a vítima nunca ficaria sem indenização, ainda que não identificado o autor do dano, ou em caso de insolvência deste, já que toda a sociedade, representada pelo Estado, arcaria com o prejuízo sofrido pela vítima (socialização dos riscos). Assim, a vítima de bala perdida não ficaria desamparada.

Ciente do aumento do número de casos de vítimas de balas perdidas que chegam ao Judiciário, o Deputado Federal Flávio Dino propôs o PL 416/2007, o qual tem por escopo facilitar o recebimento de indenização pelas vítimas, as quais, ainda quando não há controvérsias acerca do direito ao recebimento de indenização, sofrem com a morosidade do Poder Judiciário. Para tanto, o recebimento das indenizações seria feito administrativamente.

Diante de todo o exposto, fica clara a necessidade de se ampliar os estudos jurídicos a respeito da responsabilidade civil do Estado em relação às vítimas de balas perdidas, tendo em vista que, apesar da importância da matéria na atualidade, ainda há pouca discussão doutrinária acerca do tema, além de grandes controvérsias na jurisprudência, o que acaba por gerar flagrantes injustiças.


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VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. Responsabilidade Civil. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003.


Notas

[...]

§ 6°. As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

I – polícia federal;

II – polícia rodoviária federal;

III – polícia ferroviária federal;

IV – polícias civis;

V – polícias militares e corpos de bombeiros militares.

  1. Importante esclarecer que o conceito de bala perdida utilizado nesta pesquisa é o mesmo empregado pelo Relatório Temático produzido pelo Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro, qual seja, aquele produzido pelo sendo comum, não havendo conceito jurídico ou sociológico que possa ser empregado. Ver: MIRANDA, Ana Paula Mendes de; LAGE, Lana; OLIVEIRA, João Batista Porto de & SILVA, Robson Rodrigues da. Bala Perdida. Disponível em:<http://www.isp.rj.gov.br> Rio de Janeiro: ISP,2007.cjf.gov.br/revista/numero25/artigo01.pdf>. Acesso em: 20 maio 2007, p. 04.
  2. Art. 37.[...]
  3. MIRANDA, 2007.
  4. MIRANDA, 2007, p. 05.
  5. Ibid., p. 07 e 13.
  6. O PENSADOR, Gabriel. Bala perdida. In: Gabriel O Pensador. Quebra-Cabeça. SONYBMG, 1997. Faixa 10. Disponível em: <http://www.gabrielopensador.com.br/index1.htm>. Acesso em 10 set. 2007.
  7. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 23. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 196.
  8. Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
  9. SILVA, 2004, p.757.
  10. Ibid., p. 758.
  11. ZANOBINI, 1950, p. 17 apud MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 15 ed. São Paulo: Atlas, 2004, p 676.
  12. CAHALI, 2007, p. 411-412.
  13. Ibid., p. 414-415.
  14. TJSP, 1ª Câmara, AC 127.771-1, 11.09.1990, AASP 1.671/2 apud CAHALI, 2007, p. 415.
  15. CARVALHO FILHO, 2005, p. 21.
  16. CPI. Tráfico de Armas. Relator: deputado Paulo Pimenta, 2006. Disponível em: <http://www2.camara.gov.br/comissoes/temporarias/cpi/encerradas.html/cpiarmas/Relatorio%20Final%20Aprovado.pdf>. Acesso em: 19 fev. 2008, p. 144.
  17. Para a análise jurisprudencial, adotou-se o lapso temporal que abrange os anos de 1998 a 2008 (últimos 10 anos).
  18. BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Apelação Cível n°. 2007.001.59401. Apelante: Estado do Rio de Janeiro e outro. Apelado: os mesmos. Relator: Desa. Helda Lima Meireles. 15ª Câmara Cível. Rio de Janeiro, 18 dez. 2007. Disponível em: < http://www.tj.rj.gov.br/>. Acesso em: 21 jan. 2008.
  19. BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Apelação Cível n°. 2007.001.32436. Apelante: Estado do Rio de Janeiro. Apelado: Oseas Dias Lopes. Relator: Des. Roberto de Abreu e Silva. 9ª Câmara Cível. Rio de Janeiro, 04 set. 2007. Disponível em: < http://www.tj.rj.gov.br/>. Acesso em: 21 jan. 2008.
  20. BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Embargos Infringentes n°. 2005.005.00486. Embargante: Estado do Rio de Janeiro. Embargado: Sebastiana Célia Pereira da Silva Relator: Des. Siro Darlan de Oliveira. 16ª Câmara Cível. Rio de Janeiro, 21 fev. 2006. Disponível em: < http://www.tj.rj.gov.br/>. Acesso em: 21 jan. 2008.
  21. BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Apelação Cível n°. 2007.001.35622. Apelante: Estado do Rio de Janeiro. Apelado: Jucicleide Gomes de Sousa. Relator: Des. Rogério de Oliveira Souza. 18ª Câmara Cível. Rio de Janeiro, 25 set. 2007. Disponível em: < http://www.tj.rj.gov.br/>. Acesso em: 21 jan. 2008.
  22. BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Embargos Infringentes n°. 2006.005.00292. Embargante: Estado do Rio de Janeiro. Embargado: Matuzalém Alves. Relator: Des. Ernani Klausner. 1ª Câmara Cível. Rio de Janeiro, 30 jan. 2007. Disponível em: <http://www.tj.rj.gov.br/>. Acesso em: 21 jan. 2008.
  23. BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Apelação Cível n°. 2007.001.56863. Apelante: Gabriel Rodrigues Lopes rep/p/s/pai e outro. Apelado: Estado do Rio de Janeiro. Relator: Des. Benedicto Abicair. 6ª Câmara Cível. Rio de Janeiro, 23 jan. 2008. Disponível em: <http://www.tj.rj.gov.br/>. Acesso em: 21 fev. 2008.
  24. BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Apelação Cível n°. 2004.001.04270. Apelante: Camila Barbosa do Nascimento rep/p/s/mãe. Apelado: Estado do Rio de Janeiro. Relator: Des. Ricardo Rodrigues Cardozo. 7ª Câmara Cível. Rio de Janeiro, 17 ago. 2004. Disponível em: <http://www.tj.rj.gov.br/>. Acesso em: 21 jan. 2008.
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  26. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n°. 467681/RJ. Recorrente: Estado do Rio de Janeiro Recorrido: Ernandes Mucciolo. Relator: Min. Sepúlveda Pertence. Brasília, 17 mar. 2006. Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 21 fev. 2008.
  27. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n°. 383074/RJ. Recorrente: Estado do Rio de Janeiro Recorrido: Paula Virgínia Teixeira Oliveira. Relator: Min. Marco Aurélio. Brasília, 20 abr. 2004. Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 21 fev. 2008.
  28. CABRAL, Arthur Correa. Bala perdida: nos bastidores dos bailes funks e suas conseqüências. São Paulo: Editora Resulltado, 2007, p. 15-16.
  29. BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Apelação Cível n°. 2001.001.07398. Apelante: Maria das Mercês Silva. Apelado: Estado do Rio de Janeiro. Relator: Des. Nilton Mondego. 15ª Câmara Cível. Rio de Janeiro, 26 set. 2001. Disponível em: <http://www.tj.rj.gov.br/>. Acesso em: 21 jan. 2008.
  30. BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Apelação Cível n°. 2005.001.50847. Apelante: George Ferreira da Silva. Apelado: Estado do Rio de Janeiro. Relator: Desa. Nancy Mahfuz.12ª Câmara Cível. Rio de Janeiro, 19 set. 2006. Disponível em: < http://www.tj.rj.gov.br/>. Acesso em: 21 jan. 2008.
  31. RODRIGUES, Asclepíades. A violência urbana e a Responsabilidade Civil do Estado. Revista de Direito do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. n. 63, abr/jun. Rio de Janeiro: Espaço Jurídico, 2005, p. 390.
  32. BRASIL. PL 416/2007. Câmara dos Deputados. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/Prop_Detalhe.asp?id=344661>. Acesso em: 05 maio 2007.
  33. Art. 4°. Identificado o responsável pelo disparo de arma de fogo, a União, os Estados ou o Distrito Federal exercerão o direito de regresso.

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WIRTI, Joana. Responsabilidade civil do Estado em relação às vítimas de balas perdidas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2585, 30 jul. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17074. Acesso em: 11 maio 2024.